Pesticidas e GMOs: menos histeria e mais ciência

Paulo Buchsbaum
5 min readJan 16, 2020
Escolha seus pesticidas favoritos…

Fala-se muito mal de pesticidas e transgênicos, mas se ignora a ciência. A culpa termina sendo das corporações malvadas, dentro de uma gigantesca teoria de conspiração.

Esse tema termina sendo a Terra Plana da esquerda.

Outro dia, vi uma palestra de uma pessoa que alega que os pesticidas estão matando as pessoas por envenenamento lento e o que alimentos transgênicos são uma grande ameaça ao nosso futuro. Após a palestra, eu a confrontei discretamente, e ela ficou desconcertada.

A realidade é que agrotóxicos (nome pejorativo de pesticida) e transgênicos não são esses vilões como parte da mídia pinta. Infelizmente, muitas pessoas desinformadas internalizaram esses preconceitos dignos da era das trevas.

Afinal, como muitos debates, essa, na verdade, não é uma questão política, mas meramente científica, para ser vista sem histeria.

Para começar, na prática, o cenário de resíduos de pesticidas em alimentos no Brasil termina não sendo pior que os outros países, desconsiderando a Europa.

Essa pesquisa é anterior ao governo Bolsonaro. No entanto, a grande maioria das substâncias liberadas em 2019 usam princípios ativos já usados no Brasil.

A alegação principal (há outras, mas vou focar nisso) é que muitos pesticidas são cancerígenos.

De fato, a Europa é muito mais exigente que o resto do mundo em pesticidas. Estamos mais na linha dos EUA nesse campo.

Os pesquisadores dão doses cavalares para ratos e aí eles pegam câncer. Não dá necessariamente para estender esses resultados para seres humanos.

Para colocarmos isso a prova precisamos olhar estatísticas de incidência de câncer corrigidas pela questão da idade. Isso permite uma justa comparação entre diferentes países. Por exemplo, seria errado comparar o Brasil, onde as pessoas morrem cedo por diversos motivos, com a Europa em números absolutos.

Quando se examina um ranking que compara a incidência de câncer por 100.000 habitantes entre os países, de forma padronizada por idade, percebemos que, de fato, os EUA estão na frente da maioria dos países da Europa.

Só que é claro, para quem conhece minimamente o estilo de vida por lá, que isso se deve mais à obesidade, sedentarismo e hábitos alimentares medíocres. Os resíduos de pesticidas nos alimentos definitivamente não são o divisor de águas nessa questão.

O Brasil não está sequer entre os 50 países com maior incidência. A Itália, apontada pela excelência de sua dieta mediterrânea, está em 24º. lugar.

Em relação ao próprio glifosato, apontado como o grande vilão da Monsanto, essa ampla metapesquisa (pesquisa que compila muitas pesquisas) mostram que as evidências são algo contraditórias quando se refere ao câncer humano. O máximo que tem sido encontrado é um aumento discreto em alguns tipos raros de câncer.

Há muita desinformação do público leigo. Quando se diz que ingerir embutidos (presuntos, salames, etc) aumenta o risco de câncer do estômago em cerca de 18% não é uma mentira, mas é preciso lembrar que a incidência de câncer no estômago na população inteira é baixa (6.6 para 100.000). Assim 18% a mais eleva essa taxa para cerca de 7.8 para 100.000, ainda uma taxa bem baixa. As pessoas olham para o número (18%) e ficam assustadas. …

Lógico que resíduos de pesticidas nos alimentos não são “legais”, mas se fizessem tão mal assim estaríamos todos mortos, inclusive nos países desenvolvidos. No entanto, o que se vê é o oposto. A expectativa de vida aumentou muito no mundo todo, apesar disso.

O problema maior no Brasil não são os pesticidas nos alimentos, mas os pesticidas no campo devido ao manuseio inadequado, o que gera diversos envenenamentos.

As pessoas pensam que a alternativa viável seria a adoção da agricultura orgânica, quando, na prática, isso jamais será viável para alimentar os 7,5 bilhões de pessoas do mundo. Um artigo, publicado na Scientific American, desmistifica isso detalhadamente:

Oleandro: bonita e mortal…
  1. A agricultura orgânica usa pesticidas, só que dentre os ditos “naturais”. Só que esses não são necessariamente mais brandos que os sintéticos. Natural e artificial é uma distinção apenas semântica. A substância química não sabe como ela “nasceu”. Por exemplo, o veneno do oleandro (figura acima) é tão forte que é possível morrer apenas comendo o mel de uma abelha que utilizou seu néctar como fonte.
  2. A comida orgânica não é mais saudável que a convencional, como o senso comum acredita. Para agravar, em países como o Brasil, nem se sabe se aquilo que é vendido como orgânico é de fato orgânico. Um dia visitei um alambique de cachaça orgânica no interior do Rio. Meu Deus! O fato é que a fiscalização aqui é simplesmente inoperante.
  3. A agricultura orgânica não é realmente melhor para o meio ambiente. Apesar de algumas práticas melhores de cultivo, há fatores que depõem contra ela, como baixa produtividade, o que exige áreas mais extensas, transporte em menores distâncias, mas por meios ineficientes,. Tanto que a galera do Freakonomics (eles adoram quebrar dogmas) levantou que a agricultura local (orgânica ou não), em média, deixa uma pegada de carbono total maior que a agricultura convencional. Óbvio que sendo orgânica, o problema se agrava.
  4. A agricultura orgânica é e sempre será voltada para pessoas de maior poder aquisitivo, inviável como solução global. É mais caro produzir, tem menor produtividade e escala, além de ser precificado como um produto premium. É como se fosse um sal do Himalaia disseminado.

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A agricultura orgânica também bane os GMOs (transgênicos).

Há problemas aqui e ali, mas visto de maneira abrangente, a adoção da tecnologia GMO reduziu em média o uso de pesticidas químicos em 37%, aumentou o rendimento das culturas em 22% e aumentou os lucros dos agricultores em 68%. Os ganhos de rendimento e as reduções de pesticidas são maiores nas culturas resistentes a insetos do que nas culturas tolerantes a herbicidas.

Como toda tecnologia, o GMO pode resultar em cases de sucesso ou fracasso e é preciso um processo sério de homologação. Veja o exemplo do golden rice, a tecnologia a serviço de salvar vidas nos países subdesenvolvidos.

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Em suma, não vou engolir toneladas de salames, mas não vou aboli-lo da minha dieta por causa dos tais 18%. O mesmo vale para tomate e outras verduras, ainda que os tais resíduos possam, em alguns casos, até aumentar a incidência marginalmente de alguns tipos raros de câncer.

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Paulo Buchsbaum

Consultor de negócios, empreendedor e escritor, politicamente de centro.