DI1 e COPOM — Uma proposta para gestão do risco de taxa de juros no curto prazo

milton-rocha
13 min readMay 17, 2022

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Em renda fixa o papel do COPOM (Comitê de Política Monetária) é de suma importância na determinação das taxas de juros. No curto prazo o peso que cada uma das reuniões possui se torna mais relevante, pois o carrego de cada um dos futuros depende, em essência, somente das expectativas para com as reuniões do COPOM. Tais expectativas são mais precisas e determinadas no curto e no curtíssimo prazo, devido ao prazo mais curto até a decisão, com menos fatores incertos que podem ser considerados na reunião.

DI1, uma breve, breeeeve, revisão

DI1 (Futuro de Taxa Média de Depósitos Interfinanceiros de Um Dia) nada mais é do que um caso específico de um Swap de taxa de juros que negocia uma taxa prefixada (taxa do contrato) contra uma taxa pós-fixada (Taxa DI de 1 dia — Overnight).

Portanto, quando falamos tanto da mecânica de ajustes do contrato, quanto da tomada de risco via este derivativo, estamos considerando que o investidor está tomando um posicionamento relativo ao resultado final deste caso específico de Swap, ou seja, ao COMPRAR a taxa de juros do contrato a 12% a.a, por exemplo, o investidor está apostando que a média geométrica das taxas de juros DI Over de hoje até o vencimento do derivativo será superior aos 12% a.a contratados no DI1, fazendo com que este investidor fique TOMADO neste juro futuro de vencimento específico.

Mas o que isto de fato significa? Significa que existem apenas 3 cenários possíveis de P&L (Profit & Loss) para a média geométrica (e, consequentemente, para o investidor) do DI1 (μ):

  • μ < 12% a.a → P&L < 0
  • μ = 12% a.a → P&L = 0
  • μ > 12% a.a → P&L > 0

*É importante lembrar que uma posição feita na taxa de juros do contrato (padrão de negociação) é invertida na B3, visto que o padrão de ajuste é por preço. Sempre bom lembrar da relação P-Y (Price — Yield) que existe, onde variações de alta na taxa de juros do contrato geram variações de queda do preço

  • Como precificar um DI1?

— Ótica da taxa prefixada

Sabe-se que o seu valor de FACE é R$ 100.000,00, que existe um tempo (du_(t, T)/252), em anos úteis da data de operação (t) até o seu vencimento (T) e que o produto negocia uma taxa de juros prefixada (r_(t,T)) que vale da data de início de operação até o seu vencimento, desta forma, o preço unitário (PU) de um contrato negociado em t com vencimento em T, é dado por:

(1) Fórmula de precificação do DI1 (ótica da taxa prefixada)

— Ótica do DI Over

Visto que este produto é, basicamente, um Swap, podemos olhar pela ótica da outra ponta da operação, da taxa de juros DI Over, que é considerada diariamente entre t e T para se calcular o preço ajustado da operação todos os dias.

Como se sabe, a taxa DI Over é definida diariamente e, portanto, não é estática — por mais que venha negociando flat diariamente durante a maior parte dos últimos anos. Desta forma, o preço será determinado pelo desconto do seu valor de FACE pelo fator de carrego de juros registrado desde t até T:

(2) Fórmula de precificação do DI1 (ótica do DI Over)

O que esta fórmula significa? O preço de um contrato de DI1 na data t, com vencimento em T, é dado pelo desconto do seu valor de FACE pelo carrego de juros, acumulado diariamente, considerando as expectativas sobre a taxa DI Over entre t e T.

— Extraindo a taxa implícita do contrato

Para extrair a taxa implícita de um contrato de DI1 apenas torna-se necessário apresentar o conceito de fator de desconto (df — discount factor) para extrair, do fator de desconto, qual a taxa de juros que foi aplicada para se chegar nele.

O fator de desconto nada mais é do que o quanto 1 unidade monetária vale, em valor presente, considerando-se uma taxa de juros r_(t,T) durante o período du_(t,T).

(3) Fator de desconto e (4) Taxa de juros embutida no fator de desconto

O inverso do fator de desconto (1/df) nada mais é do que o fator de acúmulo de capital, ou seja, o quanto cada 1 unidade monetária aplicada irá render em juros e principal até o seu vencimento.

(5) Fator de acúmulo de capital (accumulation factor)

E que comece a análise…

Partindo de (2) pode ser feita uma análise sobre quais são os principais elementos da expectativa sobre a taxa de juros DI Over diariamente. Sabe-se que esta taxa é definida como a média das taxas de juros praticadas nos depósitos interfinanceiros (empréstimos) de um dia entre instituições do mercado, portanto, este é um dos componentes principais da taxa DI Over.

Dentro desta expectativa deve-se, também, considerar as decisões do COPOM, visto que a taxa destes empréstimos mencionados, bem provavelmente, seguirão a taxa básica de juros do país.

Essencialmente pode ser feita uma quebra, para simplificar a equação, de r_t, que é a taxa DI Over na data de início/avaliação da operação e a soma de todas as decisões tomadas entre o subperíodo s = 1 até o dia útil em questão i. Isso irá assegurar que, para cada dia útil i, a taxa considerada será a taxa de t acrescida das decisões tomadas entre t e i, ou seja, atualizará a taxa diariamente.

(6) Fórmula de precificação do DI1 (ótica do DI Over considerando COPOM)

Dadas as equações (3), (4), (5) e (6), pode-se notar que a taxa de juros embutida nos contratos de DI1 depende, intrinsicamente, das decisões do COPOM acumuladas entre a t e T, ou seja, pode-se criar uma função de definição da taxa de juros de um contrato de DI1 pela função (4) utilizando-se do conceito de fator de acúmulo de capital (5):

(7) Taxa de juros de um contrato DI1 como expectativa das decisões do COPOM

Consultando o histórico de decisões do COPOM é possível notar que não se tem uma reunião extraordinária desde 14/10/2002, ou seja, há quase 20 anos. Desta forma, é factível pensar que o fator de decisões (soma de C_s) só irá se alterar nos dias seguintes ao último dia de reunião programada para o COPOM, ou seja, existe n+1 fatores de acúmulo de capital, onde n=número de decisões entre t e T que definem um vértice de DI de forma que:

(8) Quebra de taxa implícita por reuniões

Onde C_i é o COPOM de ordem cronológica i dentro das limitações de início t e final T. De modo que se analisarmos t=16/05/2022, teremos data(C_1)=16/06/2022 (15/6 + 1 dia útil para que a decisão afete, de fato, a SELIC Meta).

Qual a proposta que desejo apresentar?

— DV01 e a gestão de grande parte dos gestores

A metodologia mais comum e aceita pelo mercado para a gestão de risco de taxa de juros é o DV01 (Dollar Value of a Basis Point). Que essencialmente é a duration do produto multiplicada por 0,01% (1 bp) e, depois, multiplicada pelo PU do ativo.

Para este artigo já pressuponho que o DV01 calculado pelo gestor já se trata do KRDV01, ou seja, no lugar de se utilizar a duration modificada de um bond utilizam-se suas Key Rate Durations (durations parciais por cada fluxo) para se avaliar o tamanho da exposição à taxa de juros para cada um dos fluxos.

Apesar de ser uma ferramenta de excelente noção para o tamanho do risco que se toma em cada um dos produtos da carteira, no curto prazo a metodologia conta com movimentos que não fazem tanto sentido, visto que os futuros pouco mexerão em termos de movimentos individuais por vértice, mexerão apenas se as expectativas das próximas reuniões do COPOM se tornarem mais hawk ou dove.

— Curto prazo e o COPOM

Visto que agora se sabe apresentar a taxa de juros de um DI1 em formato de expectativas para com as reuniões futuras do COPOM, pode-se derivar uma metodologia que auxilie na gestão de risco em termos de DV01 não das taxas curtas da curva de juros, mas sim mensurando o tamanho da exposição para choques de expectativas para com as reuniões mais próximas do COPOM.

Desta forma, pode-se chamar esta tentativa de mensuração deste risco específico de CDV01 (COPOM DV01).

COPOM DV01 (CDV01)

Se já temos a função, podemos determinar a sensibilidade dela para com cada uma das decisões de COPOM através das suas derivadas parciais para cada um dos COPOM (C_s) da equação.

Qual o formato geral da função para os mais diversos DI1 que estão disponíveis no mercado brasileiro?

Elaboração própria

Agora que já se sabe que a relação é, essencialmente, linear entre todas as decisões, com gráfico de inclinações a seguir:

Elaboração própria

Como chegar nas parciais?

  • (I) Derivando a função (9) parcialmente para cada COPOM
  • (II) Utilizando derivação numérica para aproximar a derivada com N pontos
  • (III) Fazendo algo semelhante ao que se faz em Effective Duration (diferença finita central por 2 pontos)
  • (IV) Repricing de todos os produtos de acordo com curva nova gerada pós-impacto

Para quem analisou a equação, notou que, existe um fator que é uma constante, pois no primeiro fator de acúmulo de capital não existe nenhuma decisão a ser analisada. Entretanto, mesmo com essa simplificação, caso (I) seja aplicado, para um caso de futuro de DI com 3 reuniões do COPOM entre t e T, terá que ser feita uma derivada de produto seguida de outra derivada de produto dentro da primeira.

Para qualquer vencimento que contenha N decisões até o seu vencimento, serão necessárias N-1 derivações do produto consecutivas dentro do termo de fator de acúmulo de capital para que a equação seja de fato derivada, o que torna o método (I), apesar de factível, muito trabalhoso.

Neste artigo dou preferência (opinião pessoal) aos métodos (II) e (IV). Utilizarei uma abordagem mista na qual faço o repricing da curva de juros gerando um choque nas decisões e, posteriormente, utilizo a formulação de derivada numérica por diferença finita utilizando 3 pontos, assim como descrito por Wagner Bonat, UFPR.

Cada taxa de juros simulada depende de um vetor coluna de decisões, em ordem cronológica, que irá compor o caminho de COPOM de t a T. Visto que alguns pontos serão necessários para executar a derivada numérica por diferença finita, define-se o conjunto A de decisões, incluindo com e sem choque como sendo:

(9) Conjunto de decisões possíveis com e sem shift de decisão

Descrevendo as parciais em formato de diferença finita progressiva e regressiva, considerando que o fator de erro tende a 0 e não seja relevante:

(10) Diferenciação numérica para a função da taxa

Para cada uma das reuniões do COPOM se redefine A e as equações de derivadas parciais de modo a gerar choques somente no COPOM desejado, não impactando outras decisões.

Mas faz sentido derivar a função numericamente, como é a precisão?

Como mostrado anteriormente, a função de taxa — que necessita do vetor de decisões do COPOM para ser definida — tem uma relação linear com a taxa de juros futura registrada, ou seja, por mais que se trate de uma aproximação finita, a derivada numérica trará, bem provavelmente, uma precisão interessante para o problema.

Elaboração própria

Por mais que seja nítido o erro que existe entre a estimativa por derivada numérica centrada ao redor de manutenção, ou seja, com linearização centrada em 0, o seu erro para um choque de -200bps contra o previsto (manutenção) é de apenas -0,35bp relativo ao repricing completo da curva de juros.

— Como gerenciar o risco, então, usando esta derivada?

Visto que agora existe uma relação linear entre posicionamento em um vértice e sua taxa, o DV01 parcial do vértice pode ser utilizado como um fator base de multiplicação para cada uma das parciais. O racional disso é simples, visto que (1) o KRDV01 representa a exposição de taxa de juros relativa à um movimento flat da taxa de juros no vértice em questão e (2) existe uma relação direta entre modificação de expectativa de cada uma das reuniões e seu impacto na taxa futura final, o impacto financeiro de um delta de expectativa na reunião é, essencialmente, o impacto da derivada, em bps, multiplicado pelo KRDV01 do vértice.

Mensurando o risco de uma carteira existente simulada. Dadas as seguintes condições para o mercado no dia 13/05/2022:

Elaboração própria, códigos adaptados para Python a partir do programa em R do Wilson Freitas

Ao centrar as derivadas ao redor dos pontos de decisões implícitas nos preços de mercado dos DI1, obtem-se a seguinte matriz:

Elaboração própria

Vamos supor agora que a carteira de investimentos existente possui as seguintes características:

Elaboração própria

Qual o posicionamento direcional em reuniões do COPOM gerado por estes futuros?

Elaboração própria | Matriz de sensibilidades parciais

Qual o impacto, em reais, que uma surpresa de 1bp nas decisões de cada um dos COPOM geraria no portfólio do investidor?

Elaboração própria

O que as tabelas 4 e 5 dizem?

  • Tabela 4

Ao comprar 1 quantidade de N22, o investidor estará comprando, implicitamente, uma sensibilidade de R$ 0,04 por bp de surpresa para cima na decisão do COPOM 1 (C_1 = 15/06/2022), ou seja, se o mercado reprecificasse, no dia 13/05/2022, a decisão implícita para o C1 em +25bps (61,31bps + 25bps = 86,31bps), o investidor que estivesse tomado nos juros do N22 teria um P&L de, aproximadamente, R$ 0,88/contrato.

  • Tabela 5

Caso, no dia 13/05/2022, houvesse uma reprecificação de -25bps na decisão da reunião C3 (21/09/2022), o investidor que tivesse o portfólio em questão registraria um P&L = 0, mesmo estando posicionado com um DV01 > 0 nos vértices.

Agora, caso houvesse uma reprecificação de C2 (03/08/2022) de -25bps, o investidor registraria um P&L de, aproximadamente, R$ 4918.

Hedge perfeito da carteira utilizando o CDV01

A carteira anteriormente apresentada pode ser perfeitamente hedgeada em qualquer um dos seus pontos de exposição aos COPOM futuros. Por exemplo, imagine que o investidor deseja fazer o hedge somente das posições direcionais que a sua carteira apresenta em C1 e C2, ele poderia fazer o seguinte:

  • Vender 715 lotes do N22 (posição final: -215 lotes)
  • Vender 2820 lotes do U22 (posição final: +180 lotes)

Estes dois trades gerariam a seguinte exposição final:

Elaboração própria

Desta forma, o hedge foi feito somente para as exposições de C1 e C2, e não nas exposições dos produtos em si. Note que as posições finais não são 0, ou seja, o hedge feito é diferente do que deveria ser feito para net de KRDV01.

Negociando o CDV01

Dado que demonstrei a aplicabilidade do conceito na prática de gestão de uma carteira, vou desenvolver ao redor dele para que trades possam surgir desta metodologia.

Na Tabela 5 apresentei uma relação de sensibilidade financeira por bp de surpresa nas reuniões do COPOM no futuro. Esta tabela é quadrada e inversível, assim como o é a sua transposta.

Caso seja feita a sua transposição, a matriz de resposta trará uma relação de posição direcional em cada um dos futuros (colunas) com o COPOM em questão (linhas), ou seja, será possível chegar em uma solução desejada para cada input de exposição final de CDV01 desejada para cada um dos COPOM.

Esta relação de posição direcional contra exposição em cada COPOM, na verdade, é um sistema linear de equações que pode ser facilmente resolvido, como mostrado a seguir:

(11) Solução matricial de posicionamento direcional em COPOM via futuros

De forma que, caso um investidor deseje ficar comprado em 1k CDV01 C1 e comprado em 500 CDV01 C2, sem exposição em outros COPOM, ele poderá da seguinte forma:

Elaboração própria

Para o investidor que desejasse este posicionamento, o resultado previsto para shifts nas decisões do COPOM está acima. Note que coloquei movimentos relevantes nos COPOM C3, C4 e C5, mas mesmo assim nenhuma modificação do portfólio é registrada, pois somente N22 e U22 foram utilizados para a solução.

Problemas com a abordagem

Alguns problemas com a abordagem aparecem ao se tentar fazer posicionamentos muito direcionais em somente um COPOM intermediário, ou, em dois COPOM com posicionamentos distintos (comprado e vendido):

Elaboração própria | Posicionamento somente em COPOM intermediário
Elaboração própria | Posicionamento em 2 COPOM com estratégias distintas

O problema é o tamanho do trade relativo tanto à liquidez do mercado (chega a superar em quase 90 vezes a liquidez diária do N22 em 13/05/2022, quanto ao caixa necessário para ser depositado em margem para a manutenção de posições tão grandes nos futuros.

Qual a conclusão, então?

A metodologia apresentada funciona de forma excelente para a visualização e gestão de risco já existente. Entretanto, para o trading direcional é necessária parcimônia nas decisões sobre qual o tamanho de exposição e, ainda mais importante, a composição desejada para a exposição entre os COPOM em questão.

Uma simulação fair e parcimoniosa pode ser observada por um investidor que, ou já possui uma carteira que indiretamente tem posicionamentos como os apresentados ou, ainda, que ache que o BC irá surpreender com mais choques no curtíssimo prazo (C1 e C2) e, posteriormente, por já ter dado choques altistas, terá decisões com surpresas baixistas do C3 até o C5, fechando o ciclo.

Elaboração própria | Portfólio parcimonioso

Referências Bibliográficas

Diferenciação numérica, Autor: Wagner Bonat, UFPR

Effective Duration, Autor: Investopedia

Shinyapp Decisões Implícitas do COPOM, Autor: Wilson Freitas

[Neto et. al. (2019)] José Monteiro Varanda Neto, de Souza Santos, José Carlos, Mello, e Eduardo Morato. O mercado de renda fixa no Brasil: conceitos, precificação e risco. Saint Paul, 2019

[Santos e Silva (2017)] José Santos e Marcos Silva. Derivativos e renda fixa: Teoria e aplicações ao mercado brasileiro, volume 1. Atlas, São Paulo, 2017.

[Manual de Curvas B3] Manual de Curvas B3, acesso em: 13/05/2022

[Características do DI1] Páginal oficial do derivativo na B3, acesso em: 13/05/2022

[Preços de ajuste e volume do DI1] Página oficial B3, acesso em: 17/05/2022

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