"Bohemian Rhapsody" é um poema épico declamado por Freddie Mercury

Caio Simão
Água de Salsicha
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6 min readOct 30, 2018

Filme é experiência sensorial para celebrar o Queen e a personalidade de seu eterno vocalista.

Bohemian Rhapsody(2018)

Rapsódia: entre os gregos antigos, trecho de poema épico recitado pelo rapsodo. É assim que o diretor Bryan Singer("Os Suspeitos" — 1995)interpretou a história de um dos maiores frontmans de todos os tempos da história da música. Ou seria o próprio Freddie a interpretar sua vida assim? Insira uma pitada trágica, explosiva, boêmia, corajosa, original e inovadora e assim podemos começar a entender a histórica trajetória do vocalista do Queen.

O filme é estrelado por Rami Malek("Mr Robot") na alma de Freddie, Ben Hardy como o baterista Roger Taylor, Joseph Mazello como o baixista John Deacon e Gwilym Lee como o astrofísico guitarrista Brian May. Destaque também para Lucy Boynton que vive Mary Austin, a inspiração da clássica "Love of My Life".

"Bohemian Rhapsody" estreia dia 01/11 nos cinemas.

Sinopse

Enquanto Farrokh Bulsara se transforma em Freddie Mercury(Rami Malek), o Queen transforma para sempre a história da música. Desde a formação até a inesquecível performance no Live Aid em 1985, a banda tem que enfrentar o desafio de conciliar a fama e o sucesso com suas vidas pessoais que tomavam diferentes rumos.

Os integrantes da banda e suas atuações

Rami Malek tem uma performance marcante como Freddie por conseguir retratar mecanicamente os trejeitos do lendário cantor e pianista. O ator não se parece muito com o vocalista, mas por vezes achamos que estamos assistindo a filmagens originais da banda, tamanha semelhança de postura e essência. Destaque para as cenas dos shows, nas quais Rami consegue chegar próximo ao domínio do público e energia que o vocalista do Queen entregava sempre. Faltou um pouco de emoção e sentir mais a presença de Freddie. Foi uma performance mais técnica e eficiente do que visceral, mas ainda sim positiva.

Os atores que fazem os outros integrantes da banda(Taylor, Deacon e May) se parecem mais com eles do que os próprios. Aqui entretanto, os personagens não são bem desenvolvidos e não tem profundidade alguma. São atuações que contribuem para uma parte mais cômica do roteiro, além da eficiência ao retratá-los nos shows. Esse é um filme focado na figura de Freddie Mercury, apesar de deixar claro que ele não existiria sem o Queen, que era sua família.

O filme não esconde a suma importância dos outros integrantes, mas peca em não desenvolvê-los. Tudo bem que queremos saber muito mais sobre Freddie em um filme feito para ele , mas um desenvolvimento maior de todos poderia dizer ainda mais sobre o principal da banda.

Mais "família" do que deveria

O grande questionamento em relação a "Bohemian Rhapsody" era o nível de ousadia que os produtores e diretores almejavam ter ao contar a história de uma banda de rock que teve como alma um iconoclasta, destruidor de estereótipos e símbolo da diversidade. O filme não esconde a sexualidade de Freddie, mas também não traz muito debate ou reflexões sobre o tema. Muita coisa foi mostrada de forma mais lúdica e romantizada, quase que uma censura para atingir mais público, haja vista sua classificação indicativa internacional(PG-13). O objetivo do filme foi celebrar a música e não convidar a refletir ou escancarar fatos novos que não sabíamos sobre o Queen ou sobre Mercury. Faltou ousadia para mostrar a história bruta, mas isso não apaga a áurea positiva do filme.

Ainda, os mais atentos perceberão alguns fatos com a ordem cronológica "adaptada" para um roteiro mais emocionante, o que é compreensível para contribuir com o entretenimento e cativar melhor o espectador.

Trilha sonora

O Queen é uma banda de muitos sucessos, que foram bem contextualizados no desenrolar do enredo. A banda não se adapta a demandas. Ela cria demandas novas e impressiona com sua originalidade. Não se prende a gêneros fixos, experimenta e arrisca. Sobretudo busca se conectar verdadeiramente com seu público. Se a música vier com verdade, não tem porque quem ouve não acreditar naquilo tudo.

Interessante ver também como a versatilidade do Queen era grande. Os quatro integrantes compunham e se completavam. Eles sentiam a música porque ela traduzia sentimentos reais de suas trajetórias, principalmente para as composições de Freddie. O filme explica as composições com sua história de vida e conseguimos sonhar com a emoção que deve ser ver uma música sua ultrapassar gerações e virar trilha sonora de outras pessoas, de qualquer lugar do mundo. É o que é bem representado na cena da grande apresentação da banda no Rock in Rio de 1985. Uma homenagem a uma paixão de Freddie, cantada em uníssono por milhares e milhares de pessoas de maneira orgânica e verdadeira que nem tem aquela língua como mãe. A linguagem da música é universal.

Recriação do Live Aid

O ponto alto do filme é certamente seu arco final, que curiosamente foi a primeira parte a ser filmada no set. Rami Malek chegou para o primeiro dia de filmagem e já teve que reproduzir a lendária apresentação de Freddie no concerto de Rock Live Aid em 1985, no qual os maiores nomes da música à época se juntaram para arrecadar fundos para combater a fome na Etiópia e não receberam cachê pelos shows. É impressionante a recriação do ambiente no Wembley, a performance de Rami e a conexão da cena com a apresentação original. É como se tivéssemos a oportunidade de conhecer o contexto e toda a importância daquele show para a banda intimamente e ao mesmo tempo, entrar junto com ela no palco. São aproximadamente 22 minutos que por si só já valem o ingresso.

Saldo

"Bohemian Rhapsody" é uma celebração muito mais sensorial e romântica do que racional e informativa. Sua falta de ousadia em abordar assuntos mais delicados e um roteiro não muito forte prejudicam um pouco mas não conseguem estragar a magia que o Queen tinha e ainda tem. É um filme divertido e que prende bem. Escolheu e contextualizou a trilha sonora com qualidade e trouxe atuações positivas no geral apesar de não buscar aprofundar outros personagens que não o central.

O grande destaque vai mesmo para as performances recriadas. Assistimos de dentro aos shows do Queen. A qualidade dessas cenas vai emocionar o fã da banda, que vai sair do cinema com a certeza de amar uma das maiores bandas de todos os tempos.

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Caio Simão
Água de Salsicha

Crítico de Cinema e apaixonado também por diversos tipos de esportes. É vascaíno fanático e ama o Marvin, seu cachorro. Nas horas vagas, é Engenheiro Químico.