La La Land chega para te catequizar

Rafael Barreto
Água de Salsicha
Published in
5 min readJan 18, 2017

“Eu juro, seis anos atrás quando começamos a trabalhar nesse filme, a ideia de fazer um musical original de Los Angeles era pura fantasia. Então estar aqui diante de vocês hoje é mais surreal do que eu poderia descrever”, disse um dos produtores da Summit Entertainment quando La La Land ganhou seu sétimo globo de ouro no início do ano, batendo recorde na história da premiação. Ao seu lado, estava o orgulhoso Damien Chazelle, premiado nos prêmios de Melhor Diretor e Melhor Roteiro Originial, o grande vencedor da noite, assistindo a um sonho antigo realizado tendo seu merecido reconhecimento.

E essa jornada não foi fácil. A ideia de fazer um musical no estilo dos mágicos anos 50 com elementos atuais surgiu em 2010, quando Chazelle era apenas um estudante universitário. Para convencer um estúdio a investir em um musical — de jazz ainda por cima — tinha que ter muita moral e Chazelle não tinha o menor espaço em Hollywood para isso.

O primeiro estúdio que cogitou apostar nesse projeto disse que o jazz era um estilo decadente e para que eles embarcassem nessa, algumas alterações teriam que ser feitas. O jazz teria que virar rock e o final — a parte mais importante do filme — seria descartado. Pensando em números, o musical teria que se adaptar ao mercado e Chazelle teria que abrir mão de sua visão romântica e nostálgica de La La Land.

O diretor apostou na sorte, recusou as exigências e acabou que deu certo, pois em 2014 tudo ia mudar. Suspendeu La La Land e trabalhou em um novo projeto que também teria o jazz como protagonista e provou que esse estilo está mais popular do que nunca, bastando apenas o olhar certo. Whiplash foi sucesso de crítica e bilheteria ao redor do mundo, concorrendo a 5 oscars (vencendo 3), inclusive melhor filme, e finalmente chamando a atenção dos grandes estúdios que compraram a ideia de sua obra-prima.

Como obra do destino, La La Land finalmente estava pronto para ser rodado.

O filme conta a história de Mia, uma aspirante a atriz em L.A , e Sebastian, um pianista inconformado com a banalização do jazz, que se apaixonam enquanto batalham para realizar seus ambiciosos sonhos.

Uma das referências que La La Land faz aos clássicos musicais da década de 50

Assim como outros diretores apaixonados pela sétima arte que reciclam antigos estilos de fazer cinema, como Scorsese e Tarantino, Chazelle nos presenteia com esse musical maravilhoso que reúne os melhores aspectos dos filmes de Gene Kelly, Fred Astaire e Ginger Rogers. Os números de sapateado, as longas tomadas de dança (a cena do por do sol durou 2 dias para ser gravada), os devaneios musicais fantasiosos e o cenário mágico da ensolarada Los Angeles, que na década de 50 era o centro do mundo, são algumas das belas homenagens que o filme presta a este estilo que dominou o Cinema por anos.

Para que as coisas saíssem do jeito que ele imaginou, Chazelle fez um trabalho minuciosíssimo em todos os aspectos do filme. Da fotografia à mixagem de som. A trilha sonora não vai sair da sua cabeça tão cedo e as músicas possuem uma forte pegada de jazz mas com linguagem cinematográfica. O dever de casa foi feito com perfeição e arrancariam lágrimas de orgulho de Gene Kelly se o rei dos musicais ainda fosse vivo.

Vale deixar o diretor de lado e abrir um parágrafo especial aqui para o elenco. As primeiras opções eram Emma Watson e Miles Teller, mas a agenda dos dois embarreirou suas participações no projeto, dando chance para a confirmação daquilo que todo mundo desconfiava. Ryan Gosling e Emma Stone voltam a trabalhar juntos, pela terceira vez, mostrando de uma vez por todas que eles tem a melhor química do cinema atual.

Emma Stone brilha em um papel que parece ter sido escrito para ela, como uma atriz que luta incansavelmente por um espaço no cinema. Em seu discurso de agradecimento do Globo de Ouro, a atriz dedicou seu prêmio a todos aqueles que estão tentando virar atores em Los Angeles e disse para não desistirem. Ryan Gosling, também premiado, não é muito de cantar, o que deu um tom mais realista ao filme. Por outro lado, aprendeu a tocar piano e mandou demais no filme, tocando tudo aquilo que vimos na tela. A polvorosa química entre os dois não ficou apenas nas atuações, mas nos números de dança ela simplesmente explode. Cheirinho de oscar pros dois hein…

Os vencedores do Globo de Ouro deste ano, Ryan Gosling, Emma Stone e Damien Chazelle

De uma certa maneira, La La Land carrega um tom autobiográfico de Chazelle. A luta para conseguir uma oportunidade em Hollywood de Mia e a missão de salvar o jazz de Sebastian são aspectos marcantes na carreira de Chazelle. Contra tudo e contra todos, o diretor bancou seu projeto e entregou o que já promete ser um dos melhores filmes de 2017. Fortíssimo candidato a rapelar o Oscar deste ano, La La Land é a prova de que filmes como esse ainda podem ser bem-sucedidos e que vale a pena desafiar o mercado para reviver gêneros que eram venerados nos tempos passados. Quem não gosta de musicais, vai sair do cinema com uma opinião diferente.

E acima de tudo, La La Land é um filme sobre perseguir sonhos, sem desistir na primeira tentativa e nem deixar se corromper pela maneira mais fácil e lucrativa. Mostra que a estrada é longa e dura, que você será derrubado diversas vezes antes de conseguir e que sacrifícios terão que ser feitos para que você chegue lá. Damien Chazelle é a prova viva disso e, com La La Land, ele finalmente está vivendo o seu sonho.

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