O sensível e necessário Com Amor, Simon

Caio Simão
Água de Salsicha
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7 min readMar 21, 2018

O drama adolescente adaptado do livro homônimo mostra a importância da empatia em nossas vidas.

Com Amor, Simon(2018)

Os livros adolescentes estão cada vez mais sendo levados para as telonas, o que dá uma sobrevida ao Cinema de modo geral, que sofre atualmente lutando uma queda de braço forte com a TV.

Dessa vez, temos uma história que representa um tema extremamente importante e independente de idade apesar do filme ter um claro público-alvo.

Com Amor, Simon(2018) foi adaptado do livro homônimo de Becky Albertalli, uma psicóloga, o que faz bastante sentido e naturalmente, foi um sucesso comercial e pode ser encontrado em qualquer livraria ou loja online por aí por um preço reduzido.

O filme é distribuído aqui no Brasil através da Fox Films e foi dirigido por Greg Berlanti, produtor de séries teen como Arrow e Flash.

Você fica com o trailer do filme:

A sinopse relâmpaga

Simon Spier(Nick Robinson) esconde um grande segredo de seus amigos e família: ele é gay. Quando esse segredo é ameaçado de vir à tona, Simon precisa enfrentar toda a reação de uma sociedade preconceituosa e sem empatia. Ainda mais complexo, ele precisa entender sua verdadeira identidade.

O ritmo de uma geração

O longa capta bem a necessidade de conversar com seu público principal, pessoas de 16, 17 anos e até um pouco menos/mais. O ritmo do filme é todo pensado para a cabeça de uma geração obcecada com tecnologia e velocidade. Tudo a distância de um mero clique. Esse é um tema ainda muito colocado no filme, essa relação dos adolescentes com a tecnologia cada vez mais crescente e ás vezes nociva. Por vezes, esse ritmo acelerado atrapalha na tentativa de aprofundar os personagens e o drama que certas situações exigem, mas é absolutamente compreensível já que atinge o objetivo de deixar o filme atrativo.

Simon e seus amigos

O público-alvo

Com quem o filme quer conversar, afinal? Com adolescentes de modo geral em seu formato e execução. Entretanto, sua mensagem não carece de restrição por idade. É uma mensagem presente e em voga, o da convivência com a diversidade e a apreciação da mesma.

Infelizmente, por conta do seu público principal, a mensagem não atinge grande complexidade assim como alguns personagens do filme não são muito bem desenvolvidos. Os melhores são Martin e Simon, pelo tempo que tem.

De resto, os amigos são um pouco padronizados e sem muita personalidade. É um preço que se paga pelo entretenimento, e nisso o filme atinge com maestria. O filme entretém, tem um humor interessante e ronda em torno da identidade de Blue, que será discutido mais a frente.

A identidade "indie"

Outro pequeno problema do filme foi a de conceituar algumas coisas. Por ser um filme de um grande estúdio, as coisas não são naturalmente indies do jeito que deveriam ser. A garota mais descolada definitivamente não deveria receber essa atribuição, como foi o caso com Leah(Katherine Langford).

Simon e Leah

Os personagens eram maniqueístas demais, muito corretos, a exceção de Martin(Logan Miller), o que provavelmente justifica seu destaque merecido no longa.

Ora, a adolescência é um período confuso onde as pessoas ainda estão formando uma identidade, procurando interesses. É um período turbulento cheio de erros e aprendizado. O filme peca um pouco em não captar esse momento dessa maneira. Era tudo muito teatral e bonito.

A trilha e o mistério

Sempre fundamental para o desenvolvimento do longa, a trilha de Com Amor, Simon(2018) foi escolhida seguindo um padrão, o que já é um ponto positivo. Temos Bleachers, Jackson 5, Whitney Houston, ou seja, músicas de ritmo acelerado, com notas animadas e de uma época já passada. O filme segue o som de acordo com os gostos de seu protagonista. As músicas rolam de maneira contextualizada, um clichê de filmes do tipo, mas que funciona bem.

O filme ronda em torno de um grande mistério. Quem é Blue, afinal? Simon descobre que existe um menino no colégio de identidade anônima que revela a todos por meio de um blog de fofocas que é gay. Se identificando com o drama, o menino começa a trocar emails frequentes com Blue, sempre de uma maneira ansiosa e muito curiosa. Os dois começam a se entender e se conectam em diversos planos.

SPOILERS — A partir daqui, é por sua conta e risco!

O filme brinca bastante com a identidade de Blue e desvia bem a atenção para quem é de fato o menino. Como é natural pensar, o espectador acha que as opções iniciais são descartadas, mas essa é a boa ideia do filme. Garantir que pensemos que Bram(Keiynan Lonsdale) não pode mais ser apto a ser o misterioso Blue. O filme não tem ar de suspense mas consegue aguçar a criatividade do espectador trabalhando bem alguns aspectos técnicos.

Blue/Bram

Destaque para o pensamento de Simon quando lia os emails. A tela tomava um tom completamente azul, obviamente brincando com o nome do nosso admirador secreto Blue e a identidade das pessoas era revelada mas sem sabermos se de fato ela era Blue em questão. A trilha, entretanto, não tem a função de contribuir pro suspense. Mais uma vez compreensível já que esse não é um filme do gênero. É mais uma curiosidade a ser revelada, um mistério, algo que mantém o espectador ligado.

O relacionamento com os pais

Jennifer Garner e Josh Duhamel são Emily e Jack, os pais de Simon, dois atores de muito sucesso em Hollywood e que são importantes para o longa, pelo simples fato da família ter muito peso em cima do segredo de Simon.

Vamos primeiro comentar a relação com a mãe. Confesso que houve certa decepção quanto a esse assunto, já que a cena principal desse relacionamento careceu de um roteiro melhor. Talvez por ser mais fácil para Simon se abrir com Emily, já que sua mãe é extremamente liberal e progressista. Para ela, seria mais um motivo de orgulho saber sua opção sexual. Assim, a cena não teve um peso dramático tão grande e decepcionou, ainda mais vindo de uma boa atriz como é o caso de Garner.

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A relação com o pai sim, essa mais complexa e complicada rendeu ao filme sua melhor cena, capaz de emocionar a mais insensível das pessoas. Desde que Simon anunciou seu segredo ao mundo, seu pai reagiu de maneira esquisita. Portanto, uma tensão rodeava as cenas que os dois participavam. Enfim, quando se acertam, Jack cai nas lágrimas e mostra que sua maior tristeza foi ter vivido muito tempo com Simon tendo guardado este segredo, o que podia ter feito o homem evitar algumas gafes no mérito. De fato, para ele não mudava muito já que sabia que seu filho estava ali, sem nenhuma modificação de fato. Ele era a mesma pessoa, doce, sensível e cuidadosa, que o pai sentia prazer e falta de conviver. Cena tocante e bonita, que sirva de exemplo para muitas situações parecidas pelo mundo.

Comportamento e opção sexual

O filme brinca bastante com essa obrigação de que sua opção sexual deve moldar as roupas que você deve vestir, as músicas que deve ouvir, os filmes que deve gostar. Isso é uma falácia contemporânea, já que são coisas independentes. A cena de Simon se imaginando em Los Angeles brinca com isso. Ele jamais se veria fazendo aquilo tudo, mas se sentia um pouco pressionado a tal.

O final espetaculoso e o saldo

O final do filme incomoda um pouco. Não por ser um clichê de felizes para sempre, já que o filme pedia isso, era difícil imaginar algo diferente. Certas coisas tem que cumprir o que promete, te prepara.

O que incomodou foi a necessidade de tornar tudo aquilo um espetáculo midiático e visível. A necessidade de Simon ter que se encontrar em uma roda-gigante, metáfora deveras interessante colocada por Blue ao longo do filme. Talvez essa seja uma crítica ao livro e não a sua adaptação. Porém, o filme poderia ter colocado isso de maneira mais natural. Entendo a beleza de se mostrar de fato para todos, mas não ficou coerente com a personalidade de Simon e Bram.

O saldo de Com Amor, Simon(2018) é positivo já que a película conversa muito bem com seu público-alvo original, que não é restrito mas é claramente preterido. Traz uma mensagem sensível e grita pela falta de empatia de uma sociedade pautada em padrões e necessidades inventadas. Tomara que o filme faça sucesso e que expanda essa discussão. Empatia sempre, que toda essa situação possa ser natural para toda a pessoa que deve ter o direito de ser e se anunciar para o mundo do jeito que ela é.

Bram e Simon

Bram: Está despontado que sou eu?

Simon: [sorrindo] Não.

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Caio Simão
Água de Salsicha

Crítico de Cinema e apaixonado também por diversos tipos de esportes. É vascaíno fanático e ama o Marvin, seu cachorro. Nas horas vagas, é Engenheiro Químico.