Sua busca por propósito no trabalho pode te levar aos negócios de impacto social
Pelo menos foi assim com Luisa Haddad, sócia do Pé de Feijão, que conta como fazer essa transição profissional.
Trabalhar em um empresa que vai contra sua visão de mundo tem se tornado um peso bastante considerável e muitas vezes determinante na hora de decidir o caminho profissional. A busca pelo propósito no trabalho é pauta frequente entre trabalhadores em diversas fases da vida e a vontade de fazer algo para melhorar a sociedade acaba sendo uma resposta também comum.
Luisa Haddad trabalhava numa consultoria de sustentabilidade, o que era sua prioridade. Aos 26 anos descobriu que deixar a saúde em segundo plano a deixou num quadro frágil: colesterol muito alto, triglicérides e alguns indicadores de inflamação no fígado, provavelmente causados por uma alimentação completamente desregrada. Depois de passar por algumas consultas insatisfatórias, pelo fato de que nenhum profissional respeitava seu estágio de vida ou de fato a ajudava a mudar, ela encontrou uma nutricionista que enfim atendeu suas expectativas. A Dra. Marina Nogueira foi tão eficiente que se tornou parceira no Pé de Feijão, negócio social de Luisa Haddad, Cyrille Bellier e Patrícia Byington.
Por dois anos, Dra. Marina ajudou Luisa a repensar sua relação com a comida e substituir seus hábitos sem radicalismo e sem julgamentos, com uma nutrição bem real e, principalmente, com acolhimento, o que mudou sua vida, e seu quadro clínico, radicalmente. Essa é a missão do Pé de Feijão, projeto de educação alimentar que utiliza a horta como palco e ferramenta pedagógica.
De funcionária na consultoria à sócia do Pé de Feijão, Luisa percorreu um caminho lento e bastante racional. Na entrevista a seguir, ela dá algumas dicas para quem está em busca de trabalhar com impacto social e fala sobre inovação no terceiro setor, termo que está um pouco empoeirado no imaginário das pessoas, mas que tem tudo a ver com a vida moderna.
A maior dúvida sobre negócios de impacto social costuma ser: é possível viver disso, ou seja, ganhar dinheiro dessa forma? Qual tem sido sua resposta para esse questionamento?
Sim, é muito possível. Mas eu dou uma resposta um pouco diferente do que venho ouvindo em alguns eventos que eu vou. É comum você ver e ouvir matérias e palestras dizendo: largue tudo e siga seu sonho, largue tudo e trabalhe com o que você ama! E o conselho que eu dou é um pouco mais pé no chão porque dependendo de como você mergulha nos negócios de impacto, se não estiver bem preparado, pode não ter fôlego financeiro para esperar o negócio realmente dar certo e acabar frustado. Isso quer dizer que até trabalhar por propósito e pagar as contas, pode ser que você precise ainda se manter com o seu trabalho atual.
- Se você quer empreender, minha resposta seria: pega a sua ideia e sai contando ela para todo mundo, pegue as percepções das pessoas, dos seus futuros clientes e tudo isso enquanto você ainda tem segurança financeira (por exemplo, continuando no emprego atual). Por que digo isso? Porque a chance do seu negócio mudar muito nesse começo é enorme e o que direciona essas mudanças são essas conversas. Está convencido que a ideia é boa, que tem demanda, que soluciona um problema real? Parte para um piloto pequeno. E ainda aqui continuaria no emprego atual. Uma vez que você testou, achou o formato ideal que dê uma receita recorrente para o seu negócio, algo que entre dinheiro todo mês, aí você pode mergulhar de vez com mais tranquilidade, pois nesse tempo fazendo duas ou mais coisas, você consegue já deixar uma reserva para poder se dedicar 100% sem necessariamente tirar um salário no começo ou um salário desejado, pelo menos.
- Se você não é empreendedor, você sempre pode buscar emprego em um negócio de impacto, onde você vai ter seu salário garantido, como em qualquer emprego e não precisa correr tanto risco como o empreendedor correu. O desafio de todo empreendedor é achar esses braços direitos, essas segundas pessoas que vão tocar o negócio com você quando ele começa a crescer. E essas, normalmente já entram com uma estabilidade bem legal. Viu um negócio que te interessa? Sentiu o chamado do propósito? Escreve para a empresa, conta a sua história e se oferece para se juntar ao time!
Vivemos um momento de busca de propósito no trabalho. Com isso, você acha que as pessoas estão se abrindo mais para o terceiro setor?
Com certeza. Vejo esse movimento muito forte! Muita gente buscando o terceiro setor, mas também um crescimento gigante de pessoas querendo empreender ou trabalhar com negócios de impacto, que é considerado um setor 2.5. E sabe que também tenho visto colaboradores pressionando as empresas “convencionais” para que também evoluam suas atuações para uma atuação mais focada em impacto.
Como a inovação tem atuado nesse setor? Os formatos de negócios de impacto social estão mudando?
A inovação normalmente é a base de todo negócio de impacto, seja uma inovação tecnológica como APPs e outras soluções digitais ou uma inovação na forma de fazer as coisas, como é o caso do Pé de Feijão, por exemplo! Nós apenas falamos de alimentação de uma forma diferente, envolvente, e isso é a inovação. Não é a tecnologia utilizada, mas metodologia.
Os formatos estão mudando muito. Hoje, negócios de impacto podem ser empresas tradicionais, com acionistas e distribuição de dividendos, podem ser negócios sociais onde todo o lucro é reinvestido no negócio ou para subsidiar projetos que não podem pagar pelo produto, podem ser associações, fundações, cooperativas…
Enfim, as formas de fazer então crescendo todos os dias porque no final das contas, independente do formato, o foco é sempre no impacto positivo que aquela ação irá gerar, qual o desafio social que ela quer ajudar a resolver.
Seu foco profissional é o socioambiental. Acha que estamos encontrando o equilíbrio entre o avanço tecnológico e a preservação ambiental?
Acho que o caminho ainda é longo, mas vejo com otimismo os exemplos muito bons de tecnologias a serviço da preservação e recuperação ambiental, por exemplo o portal do e-cycle que te mostra os pontos de coleta mais próximos da sua casa para qualquer tipo de resíduo, seja ele eletrônico, radiografia, etc. É uma garantia de uma destinação responsável. Também gosto muito do Tem Açúcar, um app de empréstimos de objetos entre pessoas que moram próximas que faz com que você não precise comprar itens que talvez vá usar só uma vez por ano, como uma furadeira, uma mala grande de viagem, até um vestido de festa!
A possibilidade que a tecnologia nos deu de mobilizar pessoas, criar grupos de interesse comuns para troca de informação e mudança de comportamento é enorme. Estou muito confiante de que esses pequenos negócios vão revolucionar o comportamento das pessoas!