Roma colhe os frutos de um raro bom mercado

Leonardo Lopes
3 volantes
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4 min readSep 21, 2021

Começo de temporada dos italianos é o melhor dos últimos tempos. Será que eles irão romar desta vez?

Pode parecer estranho afirmar isso dois dias depois da primeira derrota da equipe no atual Campeonato Italiano (3 a 2, para o Hellas Verona), mas a Roma vive seu início de temporada mais animador dos últimos anos.

Sob o comando de José Mourinho, são seis vitórias e uma derrota em sete partidas oficiais. Apesar da fama de retranqueiro, o português levou seus comandados ao caminho do gol 21 vezes e teve sua meta vazada em sete oportunidades. No caminho, jogos consistentes contra Fiorentina e Salernitana. Para quem acompanhou a janela de transferências do futebol europeu, o começo não surpreende.

Tammy Abraham, principal contratação da Roma na temporada.
O atacante Abraham foi o principal reforço do time para a temporada.

Romada: a palavra do fracasso

A Roma é um clube cercado pela desconfiança. A fama das “romadas” (termo usado pelos torcedores — e rivais — para se referir aos repetidos momentos nos quais ela parece pronta para triunfar, mas acaba decepcionando) se justifica, por exemplo, pelo 7 a 1 sofrido para o Bayern, na Champions League de 2013/14, e ainda mais pela repetição do placar diante da Fiorentina, em 2019, na Copa Itália (veja os gols do vexame abaixo). Nas temporadas recentes, derrotas em momentos decisivos e a incapacidade de se impor contra adversários mais frágeis foram marcas do time.

A tentativa de reverter a situação gerou medidas diversificadas e pouco efetivas. Pelo banco de reservas, passaram nomes como Luciano Spalletti (o mais bem-sucedido), Eusebio Di Francesco, Claudio Ranieri e Paulo Fonseca. Na direção esportiva, a missão foi assumida por Walter Sabatini, Monchi, Gianluca Petrachi e, até hoje, Tiago Pinto. A Roma trocou até mesmo de proprietário, no ano passado, indo parar nas mãos do Grupo Friedkin. Decepcionados com campanhas irregulares, os torcedores alimentavam esperanças de que o mercado de transferências oferecesse soluções para, ano após ano, contentarem-se com reforços do nível de Juan Jesus, Javier Pastore e Davide Santon.

A distância entre expectativa e realidade alcançou o ápice com a contratação de Monchi, em 2017, para a direção do clube. Sua passagem pelo Sevilla lhe rendeu o apelido de “Mago” e uma habilidade desejada pela equipe: fazer muito com pouco. Cinco conquistas de Liga Europa, duas Copas do Rei e boas campanhas no Campeonato Espanhol — sem elencos milionários — soavam como um sonho para a torcida romanista naquele momento. Na Itália, contudo, o espanhol foi absorvido pela maré local— e ajudou muito a piorá-la. Essa análise do blog Breaking The Lines conta a tragédia em detalhes, enquanto aqui podemos resumi-la com as contratações de Javier Pastore, Steven N’Zonzi, Grégoire Defrel e Robin Olsen por cerca de 75 milhões de euros no total (sem contar os salários). Qualquer um desses nomes desperta calafrios nos torcedores da Roma.

Aposta da Roma para subir de patamar, Monchi decepcionou.

O que faltou à Roma?

A tarefa de Monchi era a mesma dos outros diretores, treinadores e jogadores que passaram pelo lado vermelho da cidade eterna: devolver à Roma sua capacidade competitiva. O problema nunca foi não estar à altura de um Bayern na Champions League ou de uma Juventus na Serie A (a capacidade de investimento desses clubes é bem maior), mas que mesmo times com orçamentos muito mais enxutos, como a Atalanta, tenham subido de patamar, enquanto a Roma regredia. Nesta história, o clube perdeu imponência e poder de decisão em campo e a torcida viu esvaziar o respeito.

Coube ao mercado, enfim, oferecer uma resposta. Já sob a gestão de Dan Friedkin e a direção de Tiago Pinto, a equipe se reforçou para a temporada 2021/22 de forma sólida. As chegadas dos atacantes Tammy Abraham e Eldor Shomudorov, do lateral-esquerdo Matías Viña e do goleiro Rui Patrício, por mais que não saltem aos olhos, contribuem para a construção de um grupo forte, como já se viu em suas primeiras exibições. O que saltou aos olhos, porém, foi a capacidade do diretor português de liberar atletas que “sobravam” no elenco e, em alguns casos, recebiam altas quantias para isso: entre empréstimos e rescisões, Pau López, Ünder, Juan Jesus, Bruno Peres, Dzeko, Pedro, Mirante e Pastore foram os principais descartes da janela de transferências. Graças a isso, José Mourinho recebe um plantel enxuto em que poderá desenvolver suas ideias.

Campeão da Serie A no comando da Inter, Mourinho retorna à Itália.

Do inferno ao céu com José Mourinho?

Somado a isso, o próprio treinador demonstra uma empolgação que não se via há tempos. Em entrevistas, atitudes à beira do gramado (uma delas está no vídeo abaixo) e, especialmente, no trabalho em campo, Mourinho parece saber que esta pode ser sua última chance no alto escalão do futebol europeu. Sua energia é totalmente diferente daquela vista nos últimos meses de Manchester United e Tottenham.

As circunstâncias são ideais. Embora possa soar contraditório (especialmente quando consideramos o retorno financeiro da competição), não participar da Champions League neste ano é um bom negócio para a Roma. Para um time e um treinador que, juntos, buscam reaver o prestígio e a competitividade, as disputas (Conference League e Copa Itália, especialmente) da temporada oferecem condições para que ambos conquistem a única coisa que lhes devolverá isso: troféus. A lógica aponta o caminho, mas sabemos que o futebol muitas vezes a contraria. Como será desta vez?

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Leonardo Lopes
3 volantes

Jornalista graduado pela FAAP/SP, pós-graduando em Sociopsicologia pela FESP/SP.