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Estamos em 1996 quando Maria João Nogueira, ou Jonas, como carinhosamente é reconhecida no mundo do digital, tem o seu primeiro contacto com a Internet. Recorda-nos, a própria, que a primeira vez que utilizou um computador foi no Instituto Superior Técnico, numa altura em que o ecrã, do antigo IBM, ainda era a preto e verde. Conta-nos que esta nova realidade em Portugal era vista, entre o meio das pessoas que estavam a par, como uma altura de descobertas e entreajudas inigualáveis. Foi desta forma que se apercebeu, sem qualquer dúvida, que o seu futuro passaria por ali. E assim foi, apesar dos diferentes caminhos profissionais que percorreu, o mundo da tecnologia acompanha-a até aos dias de hoje.
Entre vários projetos que a marcaram, recorda-nos dois que, nas suas palavras, “são especiais”.
A “paixão pela Internet” como nos diz, levou-a em 1997 até ao Terraàvista, na altura uma iniciativa pioneira do Ministério da Cultura, que se tornava naquele que seria o primeiro passo na massificação da Internet no nosso país. Através do alojamento de páginas pessoais, o Terraàvista é considerado, como nos diz Jonas, o “avô dos blogues”, uma vez que, disponibilizava espaços que as pessoas reservavam para publicar os seus conteúdos, de forma grátis. Esta iniciativa foi um grande avanço na conjuntura do estado da Internet naquele tempo, uma vez que a partir de agora, havia a possibilidade de os consumidores passarem também eles a serem criadores. Pode-se ainda dizer que o Terraàvista derivou de uma inspiração do americano GeoCities, também ele uma plataforma de hosting que permitia aos seus utilizadores criarem as suas páginas pessoais e navegar por tantas outras.
Para além deste projeto marcante na sua carreira profissional, Jonas integrou em 2000 e, durante 20 anos, a equipa do SAPO (Servidor de Apontadores Portugueses), no qual fazia o alojamento de páginas pessoais. No fundo, pôs em prática todo o conhecimento que havia adquirido na sua passagem pelo Terraàvista. Aqui, no SAPO, estava maioritariamente dedicada aos blogues, do qual surgiu a primeira equipa diretamente especializada na sua construção. Recorda-nos que, as melhores memórias que leva desses tempos foi, como a própria diz, a “equipa de luxo” com que trabalhou, que devido à sua heterogeneidade e diferença de valências fez com que esta passagem se tornasse memorável.
Atualmente, Jonas continua envolvida no mundo da tecnologia, mais especificamente em serviços de consultadoria digital. Criou a sua própria empresa — PWT Digital, sendo este o seu mais recente projeto. Integra, igualmente, o movimento Women in Tech Portugal, que luta pelo fim da discriminação das mulheres na área da tecnologia. Apesar do meio tecnológico ainda ser fortemente caracterizado pela presença masculina, este projeto torna-se importante de modo a empoderar, a dar a conhecer e a divulgar oportunidades às jovens que queiram, no futuro, ingressar nesta área.
Episódios Caricatos
Uma das histórias mais impactantes nesses primeiros tempos de Internet, foi uma história quase digna de prémio de cinema. Dado dia, um jovem americano contactou-a através de um newsgroup na esperança de encontrar o seu pai, que nunca conhecera, mas que sabia que era português e estivera a trabalhar em Lisboa por volta do ano de 1967. Rapidamente Jonas aprontou-se a ajudá-lo e recorda-nos, que os únicos dados que tinha para fazer alguma investigação, eram apenas o nome do senhor e o número de telefone de um local de trabalho onde o mesmo estava empregado. Após ter contactado este mesmo local, não obteve a resposta que desejara, uma vez que o senhor tinha saído desse mesmo sítio já há alguns anos. Disseram-lhe apenas que, do que se recordavam, ele estaria a trabalhar numa operadora de voos aéreos no aeroporto de Lisboa. Já com pouca esperança e uma história quase destinada a não ter um final feliz, ligou para os recursos humanos da operadora e explicou a situação. Após algumas transferências de chamadas, acabou por encontrar o pai do jovem americano. Num tempo em que ainda pouco se ouvia falar do termo Internet, tentou-lhe explicar todo o porquê te der chegado até ele e foi o suficiente para ter reunido pai e filho separados além-fronteiras.
Episódios relevantes
Movida pelo carácter humano e pela essência das pessoas, Jonas sempre deu uma atenção redobrada ao costumer care, e foi precisamente nesta área que nos relata um dos episódios profissionais mais relevantes, que leva como uma lição para a vida. Na altura em que estava no SAPO, fez uma publicação no blogue a dizer — “Colaborador precisa-se”, na qual procuravam uma pessoa para integrar a equipa. Em resposta a este anúncio, receberam um email de um jovem a responder “Colaborador oferece-se”. No dia das entrevistas, com uma sala repleta de pessoas que se tinham candidatado à posição, o jovem que tinha enviado o email foi chamado para responder a algumas perguntas, nas quais se saiu extraordinariamente bem. Foi precisamente neste momento, após o final da entrevista, quando já o jovem tinha abandonado a sala, que Jonas olha ao seu redor, para os seus colegas, e diz “ É este, não é?”. Foi assim, dando prevalência ao seu sentido de intuição, que acabou por escolher, sem saber, aquele que é hoje o responsável pelos blogues do SAPO. Ficou-lhe como lição para a vida a importância da sensibilidade e do carácter pessoal.
Lições do passado para o futuro
Dos primeiros tempos de Internet, Jonas recorda-nos que a sensação primordial era a de segurança. Apesar do principal desafio, nos primeiros tempos, ser o do desconhecido e a descoberta, que era feita praticamente às cegas, pensava-se nesta nova realidade como um lugar seguro, onda toda a gente iria trocar conhecimentos, sempre numa ótica de entreajuda e partilha. A Internet era considerada, nas palavras de Jonas, uma “utopia” na qual era praticada o bem, de modo a tornar o mundo futuro num lugar melhor. Em espelho com a realidade de hoje, apercebemo-nos facilmente que este oásis desejado não é aquilo que se encontra. A web atualmente é também ela fortemente caracterizada pelo carácter obscuro e menos simpático, que é, nada mais, que um reflexo da condição humana. Desde a manipulação de opinião, às fake news e ao cibercrime, são vários os impactos negativos que se enfrenta com a massificação do acesso à rede. Após esta reflexão sobre a conjuntura atual que caracteriza a Internet, Jonas indica que, independentemente de tudo, o saldo é positivo. A Internet, como ferramenta de aprendizagem, principalmente nos países ainda em desenvolvimento, foi e continua a ser crucial para a aproximação humana e partilha de conhecimentos.
Apesar dos vários desafios que o mundo do digital impõe diariamente, Jonas deixa algumas palavras de encorajamento e algumas recomendações para quem está prestes a entrar no mercado laboral. O essencial, e aquilo que é importante nunca esquecer é — mantermo-nos curiosos. O querer sempre aprender, aliado com a curiosidade, não só numa perspetiva profissional, como em todos os momentos da vida, faz com que se esteja sempre em constante evolução. É de notar que, a indústria da tecnologia é das que mais se caracteriza pela constante mudança, na qual a rapidez da inovação é de tal forma acentuada que exige, quase de forma direta, um estado de espírito que se predisponha a querer sempre saber mais e a abraçar a curiosidade.
