A experimentação em Batman Ninja.

João Pedro Mendes Pereira
9quadros
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6 min readMay 17, 2018

Batman é o tipo de personagem que as pessoas gostam de imaginar em outros cenários e épocas, particularmente nunca vi outro personagem que seja tão explorado nesse quesito. Batman já foi pirata, esteve na idade da pedra e em 1889 esteve em Vienna e atuou como herói por lá. A maioria dessas histórias são chamadas de ‘esleworlds’, elas consistem em tirar seus personagens da cronologia habitual e colocar eles em um mundo próprio sem interferência de eventos passados, como é o exemplo da história ‘Entre a Foice e o Martelo’ que mostra as consequências do Superman caindo na União Soviética e não nos Estados Unidos.

Em 2017 foi anunciado na New York Comic Con uma nova animação da DC chamada ‘Batman Ninja’ e automaticamente eu achei que seria ruim. Não é a primeira vez que o batman já esteve no japão e já tinha lido um mangá chamado ‘A Máscara da Morte’ e foi bem decepcionante. O roteiro e arte do Yoshinori Natsum não trazem nada de novo e parece que essa história foi só um pretexto para lançarem um mangá do batman. Esse mangá já foi publicado aqui no Brasil pela Editora Panini e deve ser bem fácil de encontrar ele pra comprar, mas não espere nada da história.

Depois do anúncio eu fui procurar quem estava por trás do desenvolvimento da animação e minha opinião começou a mudar. O que mais me chamou atenção foi a presença do Takashi Okazaki como responsável pelo design de personagem na animação. Takashi Okazaki foi o criador do mangá Afro Samurai e logo depois essa história foi adaptada para uma animação em 5 episódios e teve uma grande notoriedade no Ocidente por conta da dublagem do Samuel L. Jackson que interpretou o personagem principal e seu parceiro.
Fora o Okazaki temos também a direção de Jumpei Mizusaki que já trabalhou com JoJo’s Bizarre Adventures e roteiros do Kazuki Nakashima que trabalhou em Kill la Kill e Gurren Lagann. Ambos eu não conheço muito o trabalho, mas de qualquer forma a animação parecia ter tomado uma proporção única devido a junção dessas três pessoas, cada um colocou um pouco de si nesse projeto e isso é bem perceptível no decorrer da animação.

A história começa com a bat-família tentando impedir o plano do Gorila Grodd que no decorrer da história ele vai tomando uma proporção maior, mas isso não importa tanto. Nesse plano ele constrói uma maquina do tempo e teletransporta toda bat-família para o Japão Feudal e ao chegar lá o Batman é recebido por um exército samurai com máscaras do coringa, aparentemente não foram só eles que foram parar lá. Descobrimos então que os vilões são Daimiôs (termo usado para se referir a uma pessoa poderosa e dona de terras no Japão pré-moderno) e todos eles querem o total controle do Japão Feudal.
O que eu mais gosto nessa história é que eles não querem te dar um roteiro muito complexo e cheio de sub-camadas para fazer você pensar, eles querem somente fazer uma história completamente fora da caixa, uma história com estilo e da forma como eles querem. Cada vez mais que a história vai avançando mais insana fica e quanto mais insana melhor fica. Você pode me perguntar, como assim insana?
Aqui nós presenciamos um mecha (robô gigante) do coringa lutando com um batman da era de ouro gigantesco feito de macacos e morcegos, que coisa linda não?

A animação é feita em uma técnica chamada Cel Shading que é bastante utilizada nos video-games e em outras animações como Blame!. Essa técnica consiste em pegar um modelo 3D e trabalhar ele para transformar ele em 2D criando assim um resultado em 2.5D. Esse tipo de animação me incomoda um pouco por conta de parecer muito artificial e eu não me sinto à vontade assistindo, acho que funciona melhor em video-games do que em animações com uma duração de 1 hora e alguns minutos. Aqui funciona muito bem nas cenas de luta e realmente o resultado é muito bom e cria alguns momentos de tirar o fôlego, só que fica bastante estranho quando tem uma cena estática por conta da falta de movimento parece que os personagens estão congelados e só mexem a boca, até em animações com pouco orçamento tem um movimento melhor em cenas que exige um tom mais calmo e contemplativo.
A animação não é 100% cel shading ela experimenta outros tipos de animação e aqui eles criam algo realmente único. Eles misturam rabiscos analógicos com uma animação aquarelada e o resultado é lindo e imaginativo. Alguns momentos eles fazem só com rabiscos pretos e a movimentação da animação fica muito boa, essas duas partes são os pontos altos da animação.
Esteticamente a animação é linda e toda concepção de cenários é muito boa e tudo isso somado com a concepção de personagens gera um resultado único.

A trilha sonora sonora poderia ter ousado mais e muitos momentos que precisavam te uma trilha para dar mais peso a cena simplesmente não teve. Tem momentos que a trilha é até inexistente, se tratando da cultura japonesa eles poderiam ter feito algo bem legal em torno disso, uma pena que não foi tão trabalhado.
A parte mais fantástica de toda a animação é a concepção de personagem, sem ela esta animação não seria única. Desde Afro Samurai Takashi Okazaki já provou que ele é uma pessoa mais do que competente nesse quesito. Todos os personagens são reinventados para a cultura japonesa e cada um deles tem seu traço característico. As roupas são lindas e cada uma homenageia uma parte específica do Japão e todas tem seu simbolismo próprio. Para melhorar ainda mais o design de personagem, cada personagem possui seu mecha e todos eles são bem trabalhados e com suas características específicas que dão uma personalidade a mais para a obra. Temos um castelo que se transforma em robô, temos um Buda gigante e por mais viajado que seja tem uma certa coerência com todo conjunto da obra, parece estranho, mas é mais aceitável do que parece.

Batman Ninja é um grande acerto para a DC e tudo isso foi graças à liberdade criativa que deram para os desenvolvedores. A animação é corajosa e não parece ser considerada ‘elseworld’, parece ser mais uma aventura do Batman e ver a DC dar liberdade criativa é realmente algo fora do comum nos dias de hoje, chega até a espantar. Mesmo tendo alguns deslizes na animação e o roteiro não fazer questão de explicar algumas coisas, essa animação vale muito a pena ser assistida por conta do esmero que os produtores tiveram em entregar uma obra que envolve o Japão e ela não soar deslocada, me parece uma bela homenagem a toda cultura japonesa em simbolismo, momentos históricos, super sentais, tokusatsus, vestimentas entre outras coisas. Assistam a esta animação e embarquem nessa viajem chamada Batman Ninja. Ponto para DC!

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João Pedro Mendes Pereira
9quadros

Leitor compulsivo de quadrinhos, amante de filmes, louco por música e ainda escrevo esses textos aí.