tempo de absoluta depuração IV
(5 escritos sobre os anos de chumbo)
OS BICHOS
Vi dois bichos brigando
Um era dono de uma pedaço de carne
Não a queria
Mas a guardava
O outro
Um bicho faminto
Tomou a carne
E perdeu a vida
Os bichos, meu Deus, eram homens
Os homens, meu Deus, eram bichos
Os anos eram de chumbo
O tempo, de absoluta depuração.
SE
se no futuro for tudo colorido
se esse tela de televisão tiver cores
se os carros forem mais rápidos
se as máquinas forem mais eficientes
se trabalharmos um pouquinho mais
se os encontros forem às pressas
se os jantares forem nas salas
se toda a cultura for mais objetiva
se toda a arte for menos pensada
se tudo isso se cumprir
se o futuro puder permitir
que tudo isso se realize
aí sim, seríamos mais efetivos.
APOSTA
O poeta apostou as mãos pelo futuro
E agora já não pode mais escrever poemas.
SOLUÇÃO
Depois de séculos e séculos no cume da montanha
Após anos de leituras e meditações
Volta então o monge com sua solução:
“Vós que me ouves, tenho-vos a solução: e se vivermos nus na floresta?”
No meio da multidão, grita José:
“Não existe mais floresta, velho!”
E a algazarra acaba
Com todos voltando para casa
E o monge para montanha.
ANIMAIZINHOS
Pedem morte aos insetos
As tontas das baratas
Com o veneno na boca
Gritando feito matracas:
“Os grilos irão morrer!”
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