O 4–4–2 losango da atualidade

Caio Gondo
5 min readJan 26, 2016

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Desde uns anos atrás, é possível notar uma mutação de um esquema muito usado nos anos 90 em solos brasileiros: o 4–4–2 losango. Essa distribuição em campo a qual ficou muito conhecida pelos times que Vanderlei Luxemburgo comandava tem sofrido mutações, e é possível notar os mesmos posicionamentos iniciais do 4–4–2 losango da década de 90 em equipes atuais, como era o Chile de Jorge Sampaoli e como está sendo o Internacional de Argel Fucks em 2016. Você não acredita que são os mesmos esquemas? Então veja esta publicação até o fim dela.

Vanderlei Luxemburgo propagou de vez o 4–4–2 losango durante os anos 90. Um dos exemplos das equipes a qual ele usou esse esquema foi a Seleção Brasileira Olímpica de 2000.

Antes de mostrar como o 4–4–2 losango está se modificando, irei mostrar algumas premissas importantes para entendê-lo. O 4–4–2 losango é também chamado de 4–3–1–2, já que a tendência atual é separar as linhas de jogadores de um time para facilitar a compreensão. Nota, pela imagem acima, de que realmente há três meio-campistas bem próximos (no caso, Fabiano, Marcos Paulo e Athirson) e um bem longe e desalinhado desses, que no frame é Alex. Caracterizando, assim, o 4–3–1–2.

Além disso, o 4–4–2 losango também apresenta um posicionamento inicial que normalmente não aparece nos esquemas táticos: o do interior. Interior é o posicionamento inicial de meio-campo entre o jogador de meio-campo mais próximo da linha defensiva (mais conhecido como volante) e o jogador de meio-campo mais próximo dos atacantes (vulgarmente conhecido como meia central). Viu como esse posicionamento não é tão recuado quanto do volante e nem tão adiantado como o do meia? Para facilitar a compreensão, atualmente, esse posicionamento é chamado de interior (ou também de interno).

Sim, há o volante, o meia e o interior que fica entre eles. Fica bem mais fácil de entender assim.

Ah, mas esse posicionamento inicial não é o segundo volante e o 3° homem de meio-de-campo? Então, esses termos podem ser uma das funções do interior. Para entender melhor sobre a diferença entre posição x posicionamento inicial, veja este texto e este sobre posicionamento inicial x função. 2° volante e interior são situações diferentes, mas que podem acabar em um mesmo jogador.

Agora voltando à intenção do texto. Na década de 90, o 4–4–2 losango apresentava a seguinte dinâmica defensiva: os dois atacantes pouco participavam das ações defensivas da equipe, o meia central às vezes voltava e os dois interiores e o volante eram quem cobriam toda zona à frente da linha defensiva. Era o famoso “deixa os melhores sem marcar, pois eles decidem”.

Pelo 4–4–2 losango de Vanderlei Luxemburgo no Real Madrid, perceba que Ronaldo, Owen e Raúl sequer se movem para o lado da bola, enquanto que Beckham, Gravesen e Zidane estão começando essa movimentação defensiva.

Viu na prática como o 4–4–2 losango se defendia? Era necessária a movimentação para o lado da bola dos interiores e do volante para cobrir toda a zona frente à linha defensiva. Como eram três jogadores que faziam esse movimento (dois interiores e um volante), a faixa vertical frente ao lateral oposto não era ocupada por ninguém. Difícil essa explicação? Veja neste exemplo.

Na final do Mundial de Clubes de 2006, o Internacional venceu o Barcelona no 4–4–2 losango. Como o sistema ofensivo catalão, na época, era “contado” (somente um lateral subia e os dois interiores se juntavam a Ronaldinho Gaúcho, Gudjohnsen e Giuly formando o “número” dos jogadores que atacava), bastavam ter a linha defensiva e os três meio-campistas (os dois interiores e o volante) para bloquear todos esses jogadores do Barcelona. No entanto, em raros momentos, os espanhóis subiam com os dois laterais e veja o que acontecia:

Com os dois subindo, o sistema defensivo colorado sofria, pois a faixa vertical à frente do lateral oposto (no caso o do direito) ficava sem ninguém. Repare como Gio, o lateral-esquerdo, está livre!

Mas como que toda essa explicação da movimentação defensiva dos jogadores atrás do meia está relacionada com a mutação do 4–3–1–2 tem sofrido atualmente? Muito. Desde os constantes duelos entre Mourinho e Guardiola na Espanha, entre os anos de 2010 a 2012, a velocidade do jogo e o intuito de ocupar os espaços defensivos foram bruscamente desenvolvidos. A partir de então, para usar o 4–4–2 losango não dava mais para ceder essa faixa vertical à frente do lateral oposto tão facilmente. A solução? Modificar alguns movimentos defensivos desse esquema.

A partir de 2012, o 4–3–1–2 sofreu as seguintes adequações: os dois atacantes contribuem defensivamente pelos lados do campo até cerca da intermediária defensiva, enquanto que o meia fica entre eles nessa transição defensiva. Com essa colaboração, basta para que os três meio-campistas (os dois interiores e o volante) tenham tempo de realizar o movimento defensivo para o lado, pois o ataque adversário já foi atrasado. Mas e o lado oposto?

Ele passou a ser protegido pelas seguintes situações: com um atacante, o interior mais o lateral cobrindo a faixa mais próxima da lateral e tendo o meia central, o volante e um zagueiro aos seus lados respectivamente, dificilmente o time adversário tem tempo e espaço para virar o jogo (seja por passe longo ou curto) –imagem 1-; e, também, quando o atacante recua tanto e acaba se alinhando a esses três meio-campistas (os dois interiores e o volante), acaba-se formando uma linha de quatro à frente da linha defensiva e, assim, cobrindo a faixa vertical à frente do lateral oposto –imagem 2. Complicado, não? Nem tanto quando se vê em imagens:

Imagem 1: aqui é o Chile jogando no 4–3–1–2 e realizando a movimentação defensiva atual: veja como Vargas (atacante), Valdivia (meia central) e Sanchez (atacante) estão alinhados e onde eles estão, na intermediária defensiva!
Imagem 2: aqui é o Internacional no começo da passagem de Argel Fucks no clube: veja onde está Valdivia (atacante) em relação aos meio-campistas (jogadores com traços laranjas) e Eduardo Sasha. Sasha está na faixa vertical à frente do lateral oposto!

Essas duas situações mostradas em imagens são as mutações que o 4–4–2 losango está sofrendo. O que antes se deixava dois atacantes sem ação alguma defensiva e o meia central tendo a opção de recuar, atualmente, devido a velocidade e a intensidade que o jogo recebeu não dá mais para deixar três jogadores (os dois atacantes e o meia central) sem ser muito ativo defensivamente e deixar o lado oposto tão facilmente de ser usufruído pelo adversário. O 4–3–1–2 está se modernizando.

Obs 1: ah, você não acredita que o Internacional de Argel Fucks está voltando a jogar no 4–4–2 losango no Internacional? Veja esse frame do primeiro jogo da pré-temporada do time em 2016:

Sim, é a mesma distribuição em campo do que o 4–3–1–2 de antigamente.

Obs 2: os exemplos atuais usados (Chile de Jorge Sampaoli e Internacional de Argel Fucks) foram usados porque eles apresentam o mesmo esquema tático. Entretanto, a proposta de jogo e diversos mecanismos na equipe são diferentes. Já que uma coisa é o esquema e outra coisa é todo o resto, já que o esquema tático se refere somente à distribuição em campo.

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Caio Gondo

Analista de desempenho do Goiás E.C., criador da página “Traduzindo o Tatiquês” e estou no Twitter como @CaioGondo