Um jogo onde o estado sempre vence

Boletim DefeZap
3 min readJul 12, 2018

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Por Fernanda Garcia em 03 | 02 | 2017

(Texto publicado originalmente no antigo blog Boletim DefeZap em 03/02/2017 e republicado aqui, quando esta conta foi criada)

Uma mãe que perdeu seu filho. Um jovem que foi espancado enquanto voltava do trabalho. Uma menina que foi estuprada no caminho para casa. Um pai que viu seu filho ser assassinado na esquina de casa. Uma esposa que acabou com seu policial em confronto. O filho que viu seu pai se suicidar.

Todos os dias são violências, cometem-se e acabam após a tiro ou o tapa levado, o dor é levado ao longo da vida, o mais grave ainda maior e o letais.

Dona Joselita era mãe de Betinho, assassinado pela polícia militar em Costa Barros enquanto voltava de uma comemoração do seu primeiro salário. Betinho e seus amigos tiveram o carro fuzilado por 111 tiros. Betinho morreu naquela noite, já dona Joselita morreu poucos meses depois. Causa: depressão.

A tristeza de dona Joselita não se resumia na perda de um filho — como se isso não fosse motivo suficiente. Seu estado psicossocial agravou-se após o descaso do Estado em relação a morte de seu filho, permitindo que os policiais envolvidos nessa chacina fossem absolvidos.

Dona Joselita buscou ajuda, foi três vezes ao Centro da cidade conversar com um psicólogo da Secretaria estadual de Assistência Social, porém desempregada e sem recursos para manter o tratamento, dona Joselita não pode dar continuidade.

Infelizmente dona Joselita foi mais uma vítima do Estado que tirou seu filho, não puniu os assassinos de seu filho, e não lhe deu recursos para se manter viva.

Recentemente o soldado Douglas de Jesus Vieira cometeu suicídio e transmitiu seu desespero ao vivo através das redes sociais, mesma rede que Douglas já havia usado para expressar sua indignação com o descaso do Estado para com a Polícia Militar, resultando no atraso de seu salários, péssimas condições de trabalho e enorme vulnerabilidade. Causa do suicídio: depressão.

Parece assustador trazer essas duas comparações, a mãe que morreu após perder seu filho assassinado pela polícia militar, e o soldado que perdeu a vida após se encontrar negligenciado pelo Estado.

Mas, para encerrar a análise, obter uma palavra contra a fila entre os dois casos, o policial que dispara uma arma contra o filho de uma donzela, Joselita poderia ser o mesmo policial que tem uma arma do Estado com a sua própria cabeça.

Sermani então todos vítimas de um Estado genocida? Apenas peças no tabuleiro de um sistema que nos distanciam e nos colocam sem os outros fazer com que nos matemos?

* Fernanda Garcia é militante feminista e favelada suburbana.

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