BELA BADERNA
ESTUDO DE CASO: Pimp my carroça
Com a contribuição de Caio Tendolini, Daniela Teixeira e Mundano
Quando: 03 e 23 de Junho de 2012
Onde: Vale do Anhangabaú — São Paulo/SP e Praça Tiradentes — Rio de Janeiro/RJ.
O que:
Mundano, ativista e grafiteiro, ficou famoso por suas inusitadas intervenções de protesto pintadas nas carroças dos catadores de materiais recicláveis da cidade de São Paulo. Na convivência com esses trabalhadores nas ruas, responsáveis pela coleta de 90% dos materiais reciclados hoje no país, Mundano percebeu o descaso, mau-trato e falta de reconhecimento que sofrem diariamente.
Como forma de intervir na realidade e denunciar as contradições da sociedade de consumo, teve uma ideia, inspirada no programa americano Pimp my Ride, para realizar uma série de ações com os catadores. Essas ações visavam o reconhecimento da relevância do seu trabalho, o combate aos preconceitos, e a visibilidade ao problema da geração massiva de resíduos nas grandes cidades.
Como paródia, o “Pimp my Carroça” trouxe humor e criatividade para romper com a distância entre catadores e as outras pessoas, o que possibilitou uma grande repercussão nas mídias sociais e tradicionais. Foi nessa pegada que, por meio de uma plataforma de financiamento colaborativo, foram levantados recursos com o apoio de mais de 1.200 pessoas, o que possibilitou:
a) atendimento aos catadores (alimentação, atendimento médico, corte de cabelo, distribuição de luvas, capas de chuvas, camisetas com fita refletiva e a estampa “Catador com muito orgulho”);
b) upgrade das carroças (serviços de marcenaria, funilaria, borracharia, inserção de itens de segurança — fitas refletivas, buzinas e espelhos retrovisores, além da pintura autoral de um grafiteiro) e;
c) vivência do público em geral (debates sobre políticas públicas de resíduos sólidos e atividades artísticas sobre o universos dos catadores).
O Pimp em São Paulo teve seu encerramento com uma “Carroceata”. Os catadores marcharam até a frente da sede da Prefeitura com suas carroças pimpadas, onde leram o “Manifesto Pimp my Carroça”. O documento reivindicava condições mais justas para os catadores e denunciava os dados ínfimos de reciclagem de resíduos sólidos na capital paulista. A versão carioca aconteceu durante a Conferência da ONU de Desenvolvimento Sustentável, Rio+20. Nessas duas edições, em São Paulo e no Rio de Janeiro, foram beneficiados cerca de 70 catadores. A ação mobilizou quase 300 voluntários, e 90 grafiteiros. Mais de 50% das necessidades para as ações do Pimp my Carroça foram atendidas por apoiadores de maneira solidária.
Hoje reconhecido como um movimento que busca fomentar oportunidades para valorizar a ação dos catadores de materiais recicláveis, tirando-os da invisibilidade, o Pimp my Carroça se tornou uma fonte de inspiração a outras iniciativas e ações dentro do cenário artivista brasileiro.
Por que funcionou:
O uso do grafite e do humor como linguagem para apresentar a ação, enquanto forma de engajamento da sociedade, foram estratégias acertadas que “pimparam” o até então chato tema da reciclagem e da inclusão social dos catadores. O próprio conceito de “pimpar” se “tropicalizou” e se popularizou para além de qualquer estigma que poderia herdar da sua língua matriz. O Pimp my Carroça criou uma nova fórmula de intervenção Artivista: o de elevar o invisível à visibilidade através do uso da arte. Colocou os catadores de materiais recicláveis e seu relevante — porém desvalorizado — papel, em evidência para a sociedade brasileira.
TÁTICA usada:
Intervenção visionária: Ao ocupar um espaço público com um mutirão de atendimento aos catadores e às carroças, Mundano e as demais pessoas envolvidas criaram o espaço de um outro mundo possível dentro da própria realidade de uma grande cidade. Durante todo aquele dia, o descaso e os maus-tratos sofridos diariamente e sistematicamente pelos catadores foram trocados pela generosidade, reconhecimento, cuidado e pela prática do fazer, do participar, do valorizar, provando que agir é a forma mais efetiva de transformação.
Outras táticas usadas:
Ação direta
PRINCÍPIOS em ação:
Torne o invisível visível: A própria mensagem da ação é “Tirando os catadores da invisibilidade”. A iniciativa é para que a sociedade não apenas os veja, mas perceba as dificuldades de ser um ator invisível socialmente e também a importância do seu trabalho na vida cotidiana da cidade para, assim, apoiar ações de reconhecimento e defesa dos direitos dos catadores.
Atenha-se à mensagem: O Pimp my Carroça sempre possuiu uma narrativa muito clara e de fácil compreensão. A apresentação da ação para financiamento colaborativo se deu com um vídeo animado, didático e de roteiro linear. A divulgação da ação via meios de comunicação de massa e alternativos aconteceu através de releases e materiais de apoio, além das entrevistas de Mundano, que não perderam o foco da pauta principal.
Fale com o público que não está lá: Desde o início houve uma preocupação com o registro qualificado da ação e com o discurso que seria ecoado. Como parte desse trabalho, os registros foram transformados no mini-doc “Pimp my Carroça — São Paulo e Rio de Janeiro”, que possui legendas em espanhol e inglês e já conta com mais de 23 mil espectadores no Brasil e no mundo.
Outros princípios:
Mostre, não conte
Escolha táticas que apoiem sua estratégia
Faça o trabalho de mídia por eles
Aceite a liderança dos mais impactados
Pense narrativamente
TEORIAS relacionadas:
Espetáculo ético
Ações expressivas e instrumentais
PRATICANTES:
Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis — MNCR
792 apoiadores do 1o financiamento coletivo
500 apoiadores do 2o financiamento coletivo
Giral Viveiro de Projetos
Lost Art
Escola de Ativismo
Outras leituras e links relacionados:
Site Oficial: http://www.pimpmycarroca.com/
Cobertura Fotográfica: http://www.lost.art.br/pimpmycarroca.htm