BELA BADERNA

TÁTICA: Interrupção Criativa

Escola de Ativismo
4 min readDec 20, 2016

Com a contribuição de Nancy L. Mancias

USOS MAIS COMUNS
Expor e interromper os esforços de relações públicas de grupos “armados e perigosos”. Particularmente útil em discursos, audiências, reuniões, eventos de captação de recursos e afins.

Se um criminoso de guerra como Dick Cheney ou um empresário sem escrúpulos como o ex-CEO da BP, Tony Hayward, viesse à cidade, qual seria a melhor maneira de desmascará-los pelas desculpas por seus delitos? Geralmente, a escala dos delitos e o desequilíbrio de poder são tão grandes que ativistas renunciam ao diálogo e partem direto para interrupção, tentando encerrar ou atrapalhar seriamente o evento. A interrupção pode ser uma tática eficaz, tendo sido usada com sucesso por pequenos grupos, frequentemente com um aviso de curto prazo ou pouco planejamento prévio.

O problema, claro, é que o oponente não apenas controla o microfone, o palco e o local, mas, mais importante: como convidado ou palestrante oficial, tem a simpatia do público. Uma interrupção mal planejada, na base da gritaria, pode facilmente sair pela culatra. O oponente pode posar como vítima de assédio à liberdade de expressão, ganhando mais espaço e a simpatia do público. O desafio é interromper o evento sem dar essa oportunidade ao oponente.

Às vezes, uma intervenção indireta, que force o oponente a reposicionar seu discurso ou a responder à sua demanda, literalmente sem impedi-lo de falar, pode ser mais eficaz do que apenas silenciá-lo na base do grito. Quando a presidente da Câmara Municipal, Nancy Pelosi, fez uma reunião extraordinária em São Francisco, em 2006, no auge da guerra no Iraque e Afeganistão, ativistas do CODEPINK — furiosas porque Pelosi não estava fazendo nada para cortar o financiamento à guerra — esperaram até a sessão de ‘perguntas e respostas’ para cercar o palco com seus cartazes com a mensagem “Parem de financiar a guerra” e ficaram ali, em silêncio, até o fim da reunião.

O uso criativo de uma mensagem ou faixa pode ajudar a evitar a armadilha do “isto é um ataque à liberdade de expressão”. Na verdade, você está subindo o nível do debate; você está exercitando mais liberdade de expressão, não menos. Canções também podem ser usadas para este fim. Um leilão de execução hipotecária em 2011 no Brooklyn, por exemplo, foi interrompido de forma comovente por manifestantes ao começarem a cantar. Música cria simpatia.

O candidato republicano à presidência, Rick Santorum, sendo bombardeado com purpurina por ativistas pelos direitos LGBT durante fórum da Câmara Municipal no final de 2012. O impacto inicial da bomba de purpurina não apenas atrapalhou criativamente seu evento, como a presença contínua do brilho em sua roupa o colocou — e seus sentimentos homofóbicos e anti LGBT — em um dilema de decisão. Foto: REUTERS/ Sarah Conard

Uma interrupção criativa não precisa ser passiva. Quando Newt Gingrich veio para a conferência do Conselho da Família de Minnesota para autografar livros, um ativista gay esperou pacientemente na fila e, quando chegou sua vez, jogou uma bomba de purpurina arco-íris sobre Gingrich, gritando “Sinta o arco-íris, Newt! Chega de ódio, chega de políticas anti-gays” enquanto era retirado da sala. O vídeo documentando o evento viralizou veja PRINCÍPIOS: Faça o trabalho da mídia por eles e a ação ganhou atenção da imprensa internacional, provocando uma onda de ativismo LGBT. A tática da “bomba de purpurina” chegou até mesmo a um episódio da série de TV Glee.

O teatro é outra maneira de “interromper sem interromper”. Quando Jeane Kirkpatrick (embaixadora na ONU do governo Reagan) foi à Universidade da Califórnia em Berkeley, na década de 80, ativistas encenaram um falso sequestro realizado por um esquadrão da morte. “Soldados” (estudantes) em uniformes fictícios marcharam pelo corredor principal, dando ordens aos gritos em espanhol e arrastando alguns estudantes da audiência, que chutavam e gritavam. Outros, do parapeito do auditório, jogaram folhetos em direção a um público atônito, detalhando o apoio dos EUA e de Kirkpatrick ao governo ditador de El Salvador.

Como esses exemplos mostram, é fundamental adequar sua ação de interrupção ao oponente específico e à situação. Muitas vezes você pode ser mais eficaz se sair do “discurso raivoso” e usar modalidades alternativas, como materiais visuais, música, teatro e humor.

PRINCÍPIO-CHAVE

COLOQUE SEU OPONENTE EM UM DILEMA DE DECISÃO: Interrupções criativas bem planejadas devem deixar seu oponente sem opção. Se Nancy Pelosi tivesse reconhecido ou se envolvido com os manifestantes, ela teria apenas aumentado a credibilidade dos ativistas, e chamado ainda mais atenção para a mensagem deles. Se os seguranças retirassem os ativistas silenciosos, teria parecido grosseiro e desmedido. Se ela deixasse o evento, pareceria rendição. Sua opção menos pior, e a que escolheu fazer, foi continuar o evento — cujo significado foi então reformulado pelo protesto silencioso ao seu redor. Uma interrupção criativa bem planejada coloca você em uma situação de ganho e ganho — e seu oponente em uma situação de perda e perda.

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Escola de Ativismo

A Escola de Ativismo tem a missão de fortalecer o ativismo no Brasil por meio de processos de aprendizagem. Site: http://ativismo.org.br