BELA BADERNA

TÁTICA: Teatro de guerrilha eleitoral

Escola de Ativismo
4 min readDec 21, 2016

Com a contribuição de L.M. Bogad

USOS MAIS COMUNS
Fazer uma pegadinha criativa e concorrer às eleições — não para ganhá-las, mas para chamar a atenção para uma crítica radical à política ou para sabotar a campanha de um determinado candidato abominável.

Um grupo de “gnomos” ecoanarquistas concorrendo à Câmara Municipal de Amsterdam; Reverendo Billy, um artista com performances anticonsumistas, se candidatando a Prefeito de Nova York; uma drag queen concorrendo ao Senado australiano como uma doppelgänger[1] queer da parlamentar racista e de extrema direita Pauline Hanson. Todos estes são exemplos do teatro de guerrilha eleitoral, em que ativistas criativos concorrem às eleições para inspirar críticas ao sistema eleitoral ou aos candidatos existentes.

O termo guerrilha eleitoral une dois conceitos aparentemente incompatíveis. Ativistas eleitorais trabalham dentro das vias mais aceitáveis e convencionais do Estado, em sua tentativa de reformar o sistema pacificamente. As guerrilhas, no sentido militar, existem nas margens mais afastadas do sistema social, em constante movimento, lançando ataques-surpresa contra o Estado antes de desaparecer novamente. Esta contradição é o que torna o teatro de guerrilha eleitoral uma carta na manga no repertório de resistência, tanto para o oponente quanto para o ativista. É uma combinação instável e problemática que pode pegar de surpresa todos os atores envolvidos.

Ganhar raramente é o objetivo. No entanto, ao pegar carona na enorme atenção midiática das eleições, uma campanha de guerrilha inteligente pode atrair muito mais atenção pública do que seria possível de outra forma. Crie uma personagem convincente e engraçada que se encaixe em sua crítica — por exemplo, um mauricinho capitalista que quer se dar bem na pilhagem de Wall Street. Crie sua personagem e comece a invadir eventos políticos tradicionais — ou faça uma cena quando for impedido de fazê-lo. Melhor ainda, ganhe mais atenção de forma escandalosa ao invadir a porta da frente das estruturas de poder de um jeito absurdo, conseguindo uma inserção em um debate com “igualdade de tempo”, tendo o nome da sua personagem pateta incluído na cédula de votação ou sendo entrevistada pela mídia tradicional.

Joan Jett Blakk fez um campanha militante e queer para Presidência em 1992. Foto de Marc Geller.

ALGUMAS COISAS PARA TER EM MENTE: Faça o que eles fazem, mas com uma diferença fundamental. Se você estiver fazendo certo, ao fazer imitações hilárias de clichês dos candidatos “mais apropriados”, você pode chamar a atenção para o fato de que eles também são socialmente construídos e tão falsos como seu pirata/ gnomo/ bruxa/ etc. Corte fitas. Beije bebês. Ressalte o simbolismo vazio desses rituais e insira sua própria crítica radical e significados alternativos, através de algumas piadinhas.

Combine elementos sérios e divertidos em sua plataforma eleitoral. Na verdade, você deve ter uma questão séria para defender e, no meio de todos os absurdos e piadas, quando conseguir a atenção das pessoas, faça a sua consideração. Jello Biafra fez um ótimo trabalho ilustrando esse princípio quando concorreu à prefeitura de São Francisco em 1979. Alguns dos “se eu for eleito” de sua campanha fizeram o povo rir horrores; algumas plataformas — como sugerir que os policiais das rondas fossem eleitos pela vizinhança que patrulhavam — fizeram alguns pensarem: “Hummm… Na verdade, não é uma má ideia”. Chame a atenção das pessoas com humor e prossiga com algumas ideias simples, radicais, no estilo O-Mundo-Que-Queremos-Ver veja TÁTICA: Intervenção visionária. Dessa forma, você não estará falando apenas sobre o que é contra, mas sobre o que você é a favor.

Quando bem feito, o teatro de guerrilha eleitoral pode ser uma peça e tanto.

PRINCÍPIO-CHAVE

FAÇA GRAÇA: Não se esqueça de que isso é uma brincadeira. A eleição é um ritual de poder sedutor. Se você estiver indo bem em sua guerrilha eleitoral, vai chamar bastante atenção por causa das suas críticas inteligentes e bem humoradas e incursões no campo do debate “legítimo”. Isso pode levar você ou os membros da sua equipe a pensar: “Ei, a gente pode ganhar; vamos baixar o tom e ser mais respeitáveis”. Se isso acontecer, sua campanha será apenas mais uma campanha chata, como todas as outras candidaturas — só que sem o dinheiro ou as conexões internas. Preguiça… Aí acabou. O poder da guerrilha eleitoral está, em grande parte, no fato de que você não está tentando ganhar o poder público, mas questionar suas premissas mais básicas.

POSSÍVEIS PROBLEMAS: Se houver um candidato que você apoia, tome cuidado para desenhar sua campanha de forma a ampliar a dele, ou ao menos não interferir negativamente. Não deixe que sua sátira roube atenção de seu aliado a ponto de atrapalhar sua campanha.

[1] Doppelgänger: Monstro ou ser fantástico que tem o dom de representar uma cópia idêntica de uma pessoa que ele escolhe ou que passa a acompanhar (dando a ideia de que cada pessoa tem o seu próprio). O termo é resultado da fusão das palavras alemãs doppel (significa duplo, réplica ou duplicata) e gänger (andante, ambulante ou aquele que vaga).

--

--

Escola de Ativismo

A Escola de Ativismo tem a missão de fortalecer o ativismo no Brasil por meio de processos de aprendizagem. Site: http://ativismo.org.br