A fotógrafa Allaire Bartel em 2014 criou o projeto Boundaries, onde representou a opressão feminina de modos sutis, que deixamos passar todos os dias por já fazerem parte do nosso cotidiano. Ela diz que o conceito de male entitlement “é representado por mãos e braços masculinos realizando uma variedade de ações que são extremamente intrusivas no corpo e na vida da mulher”.
O male entitlement é a noção de que o homem é ‘merecedor’ da mulher, seu corpo e sua sexualidade. Podemos ver exemplos disso o tempo inteiro, e mesmo assim estamos tão acostumados e amortecidos, que consideramos machismo apenas os casos de agressão e assédio. Mas o que são estes casos se não apenas o que é perpetuado como normal, levados ao extremo?
A noção de friendzone é o resumo do male entitlement. Culpar uma mulher por não querer ter uma relação com um homem é reforçar que ele merecia aquilo, apenas por ser homem. Porque ele ‘se esforçou’, deu presentes, ‘investiu’ esperando receber em troca uma relação (que pode ser tanto amorosa como apenas sexual), ele deveria receber em troca um sim. A mulher não tem direito de dizer não. Aquilo é dele por direito.
O conceito do ‘cara legal’, que aparentemente age e trata uma mulher com respeito apenas para conseguir o que quer, e não porque é o mínimo que um ser humano decente deve fazer, também é fruto deste fenômeno. O assédio na rua, no ambiente do trabalho. O namorado que coage a companheira a fazer sexo. O slutshaming e pornô de vingança. Todos são produtos deste problema. Todos acontecem porque os homens aprendem diariamente que mulheres são objetos, prêmios que lhe são dados por cumprir seu ‘dever’ perante a sociedade.
Quantos Elliot Rodger e Wellington Menezes ainda terão que aparecer para que tratemos isso tudo como um problema grave?
Quantas mulheres ainda terão que ser mortas,estupradas e mutiladas todos os dias, pra que possamos abrir os olhos da sociedade para o machismo de cada dia que alimenta tudo isso?
O mais triste de tudo é que quando nos deparamos com notícias de feminicídios, ficamos tristes e com raiva, mas não surpresas.
Já estamos amortecidos à morte de mulheres. É apenas mais um machismo de cada dia.
