Apocalipse.
Desde que nos demos por gente, o tema do Apocalipse ou do pós-apocalipse sempre foi abordado de diversas formas, sejam por livros de ficção científica, em religiões, em filmes, em ensaios, e em todo tipo de aspecto que a cultura humana poderia retratá-lo, porém, boa parte sempre retrata o Apocalipse como algo com prazo. Algo previsto. Como uma promoção de supermercado que vai até semana que vem, como uma contagem regressiva para o filme que você quer tanto ver estrear no cinema, ou então a chegada da sexta-feira.
Uma percepção um tanto quanto ridícula, pois todas as tragédias cujas consequências são irreversíveis nunca são e serão previsíveis, muitos menos entrarão pela porta da frente com aviso prévio e tocando sua campainha.
O Apocalipse vai entrar pela porta dos fundos, em plena madrugada, rasgará o pescoço de todos os que você ama e você só de dará conta depois que o sol aparecer na alvorada do dia seguinte. Ele te trará o inferno te pegando de calças curtas. E você saberá que aquilo é o Apocalipse pois você só descobrirá a verdade tarde demais para fazer algo a respeito.
Porém, a coisa mais terrível para o cidadão comum, como eu e você, não é o apocalipse. É que, justamente, NÃO haja um Apocalipse.
Não terá o mundo desértico de Mad Max ou Fallout, onde a civilização como conhecemos morre em um inverno nuclear e renasce em seu estado pré histórico, primitivo e bárbaro.
Muito menos nas distopias de Blade Runner ou Juiz Dredd que traz uma sociedade cuja singularidade tecnológica transformou o futuro no passado, ou qualquer outra pós-hecatombe terrível.
Na verdade, seria um grande alívio e muito conveniente se fosse apenas isso.
Não quero ser prepotente e nem presunçoso, mas imagino que quase todo cidadão que tem consciência da agrura que é viver em uma cidade contemporânea se jubilaria sabendo que algum meteoro ou cataclisma irá destruir o dia de amanhã e o livrará de precisar acordar cedo no dia seguinte, de ser enlatado em transportes públicos cheios de corpos asquerosos e malcheirosos à sua volta.
De trabalhar em um emprego que detesta do fundo do âmago, mas que precisa ser mantido por não ter escolha a não ser correr a corrida dos ratos pela necessidade de pagar as contas e sobreviver na complexa sociedade em que a condição do homem pariu e vem alimentando até hoje. De se livrar de todas as responsabilidades e ver todas elas sendo destruías por um cogumelo atômico colossal visível do cosmos, uma seca terrível, uma inversão dos polos magnéticos ou o grande Irmão de 1984.
O medo REAL é, ironicamente, de algo muito mais provável e previsível de acontecer: o medo de que todas as grandes instituições conhecidas como família, economia, nação, simplesmente descentralize em um novo formato, onde todas as inseguranças do cidadão comum se tornem realidade.
A idéia de um futuro utópico é um milhão de vezes mais terrível que uma distopia, com, por exemplo, descobrir que seu nicho é pego em um completo estado de fluxo, como foi a Revolução Industrial.
Descobrir que o mundo não acabou, mas sim que você que é ultrapassado.
E que você, em cima de seu túmulo, terá outro, outro, e mais outro, para te soterrar até o fim dos dias.