Sacrifícios Para Criar Uma Cultura De Startup — A História Até Agora Nunca Antes Contada Da Climber RMS

Mario Mouraz
10 min readMay 13, 2020

--

English version here: https://medium.com/@MarioMouraz/sacrifices-it-takes-to-build-a-strong-startup-culture-c9d6c730af5f

A Climber RMS (www.climberrms.com) é uma ferramenta inteligente de Revenue Management que ajuda os hotéis a aumentar as receitas implementando preços dinâmicos. Com +100 clientes, desde pequenos alojamentos locais, a hotéis independentes e a grandes redes de hotéis com presença em diferentes países, a Climber ajuda os hotéis a atrair mais e melhores clientes, a diversificar os canais de venda e a implementar uma cultura de revenue management nas suas equipas. Fundada há 5 anos em Portugal (Janeiro de 2015) pelo Mário Mouraz (Founder & CEO) e pelo João Pedro Feliciano “JP” (Founder & CTO), tem presença à data de hoje (Abril 2020) em Portugal, Espanha, Moçambique e Brasil.

O Início — Ideia, Founders e Advisors

Era Janeiro de 2015 e eu acabava de sair da startup que eu próprio tinha criado há um ano antes, TripDashboard, uma empresa que vendia insights da procura turística aos hotéis, por incompatibilidade com o meu sócio da altura resultante de perspectivas diferentes de como a startup deveria ser gerida. Foi um momento difícil pois não só não tinha muitas poupanças como me sentia muito culpado por ter voltado a “falhar”. Era a minha segunda startup e apesar de ter tentado duas vezes e não ter funcionado eu sabia que o que mais queria era voltar a tentar e, desta vez, ter sucesso. Desta vez estava mais bem preparado e com várias lições aprendidas. Tinha algum dinheiro com a saída da startup anterior e sabia da necessidade que os hotéis tinham de uma solução que automatizasse o cálculo dos preços dos quartos.

Conheci o JP, meu co-fundador atual, num jantar combinado e no final do serão combinámos testar durante 3 meses trabalhar juntos, para ver se nos íamos dar bem. Ao fim de um mês o JP despediu-se da Nokia, contraiu um empréstimo e entrou a full-time comigo na Climber.

Éramos pessoas completamente diferentes, o JP todo da meditação, yoga, surf, raciocínio lógico, ponderado, enquanto eu era o hustler, o go-getter, o que agia por impulso, o estratega.

Tivémos um outro sócio na empresa que acabou por desistir logo nos primeiros três meses.

A primeira coisa que fizemos foi arranjar um advisor que já tinha passado pelo que queríamos passar e que nos fez hand holding nos primeiros 6 meses, com quem falávamos semanalmente.

Primeiros 2 anos — Escritório, Crowdfunding

Nos primeiros dois anos o nosso escritório foi uma mesa na cave da Fábrica de Startups em Lisboa, sem luz natural, rede telemóvel e partilhado com outras startups.

Nem eu nem o JP recebemos salário no primeiro ano e meio, e nos dois anos seguintes pagámo-nos 800€/mês.

Eu tinha estado a viver e a trabalhar por um ano em Burkina Faso abaixo do limiar da pobreza de $1.5/dia, logo os meus standards eram muito baixos. Para o JP foi um downgrade completo.

Por teimosia e para poupar dinheiro, só em Novembro de 2019 (quase 5 anos) é que permiti que a Climber me comprasse o meu primeiro laptop.

Investimos 30 mil euros de capitais próprios que susteve a empresa e o salário de dois colaboradores até ao nosso primeiro levantamento de capital oficial de 100.000€ em Julho de 2016 através de crowdfunding.

Passar pelo programa de aceleração do Founder Institute foi importante porque nos obrigou a validar a nossa ideia de negócio com 150 potenciais clientes numa semana. Acabámos por entrevistar 1000 hotéis em Portugal e no Brasil em apenas 3 semanas.

um dia deparei-me com 6€ na minha conta

Durante os primeiros dois anos frequentemente trabalhávamos das 7h às 23h e não raramente o JP teve de correr para não perder o último barco de volta a casa. Uma fase levámos uma tenda e passámos a dormir no escritório. Foi um período de sacrifícios. O JP queimou a conta poupança reforma, abdicámos de férias e de relações amorosas. Nos primeiros três anos nenhum de nós fez férias até um investidor, o Marcin da Innovation Nest, nos recomendar a fazer uma pausa por uns dias. Ambos passámos a alugar um quarto no Airbnb para ajudar a pagar contas. O dinheiro que tínhamos era todo investido na startup e um dia deparei-me com 6€ na minha conta.

Em 2016, candidatámo-nos a um fundo“Internacionalização” P2020 do IAPMEI de 382.000€, que nos foi aprovado mas nunca chegámos a receber o dinheiro. Foi uma situação muito desagradável que se arrastou durante 2 anos, e que quase matou a empresa pelos problemas financeiros que causou e pelo atrito que desencadeou na relação dos founders.

Os founders começaram a dar mais atenção à mente, corpo e espírito. A meditação passou a ser prática regular na nossa vida e no seu melhor pico o JP tinha 600 dias seguidos a meditar em média 50 minutos por dia, prática que até hoje mantemos. Juntamente com a prática regular de yoga e dieta praticamente vegetariana, acredito que tornámos melhores gestores.

Erros de casting, primeiros clientes, primeiro investidor de risco (VC)

A primeira ronda com VCs e business angels demorou 14 meses a fechar e foi uma tortura e ao mesmo tempo uma gigantesca aprendizagem. A certa altura e já sem dinheiro na conta o lead investor que já estava comprometido apresentou-nos termos miseráveis e saltámos fora do acordo. Sem lead investor iríamos perder os outros investidores. Em último recurso fomos à Polónia reunir com um VC, a reunião correu mal porque não estávamos preparados. Voltámos para Lisboa e depois de muito trabalho árduo para conseguir responder às perguntas conseguimos o investimento de 200K€. Na mesma altura, fomos reunir em Málaga com um investidor e acabei por por dormir numa rede na praia, porque não queríamos gastar dinheiro. Conseguimos obter mais 100K€ de investimento dessa ida. Mais tarde, praticamente todos os investidores nos disseram que tinham investido principalmente pelas pessoas e pela nossa resiliência.

Receber o dinheiro na conta foi outro filme. Num caso em particular, chegámos a demorar 10 meses a receber o dinheiro na conta e tivemos que recorrer a um empréstimo bancário de 30.000€. Uma possibilidade que surgiu de sermos adquiridos pela Trivago caiu logo nas primeiras negociações.

Mudámos o nome de Climber Hotel para Climber RMS em 2018 e mudámos também de escritório. Eu próprio me ajoelhei a limpar as sanitas e o chão do WC enquanto não tínhamos uma pessoa para fazer limpezas.

A Climber mantém até hoje a tradição de fazer todas as 2ªs, 4ªs e 6ªs um lanche de equipa que ficou a chamar-se o “pão do Mário”.

No final de 2018, início de 2018 viveram-se tempos difíceis. Dois membros importantes da equipa despediram-se no espaço de uma semana, os founders tiveram problemas de comunicação gerando-se muito atrito entre os founder, uma ronda de investimento por fechar e um roadshow no EUA, um motim na Climber desencadeado pela insatisfação dos colaboradores, levou a que uma uma dor no meu peito que já durava há um mês se intensificasse ao ponto de me levar para o hospital em Nova Iorque. Com receio de ter um ataque cardíaco aos 30 anos, decidi parar e tirar 2 semanas de férias, as primeiras de sempre desde que tínhamos criado a Climber. Ainda bem que o fiz!

Trabalhámos com um executive coach para dar a volta e aos poucos e poucos, e com muita paciência e trabalho interior, conseguimos resolver o problema e restaurar a confiança entre os founders e mais importante, da equipa. Uma coisa tão simples como a introdução de um check-in diário de 15 min entre os founders fez maravilhas, os founders passaram a estar alinhados e a equipa voltou a ficar unida. Delegar e dar internamente poder à equipa foi outro fator de sucesso. Criámos um mid-layer executivo de team-leaders que passaram a tomar decisões sem ter de passar pelos founders. Todos os colaboradores assumiram maiores responsabilidades, a estratégia da empresa passou a ser discutida com os TLs e comunicada periodicamente à equipa. Criou-se uma matriz de responsabilidades com primeiros e segundos responsáveis, fizémos mudanças estratégicas como sair do Reino Unido, fizemos mexidas internamente e começámos a gerir melhor as decisões suportadas em dados e em targets específicos.

Cuidar das pessoas que elas cuidam do teu negócio” passou a ser o nosso mantra. Hoje em dia temos uma equipa do caraças, bastante unida e super alinhada. E isso faz toda a diferença.

A nossa cultura

Ter planos alternativos B, C, D, E, F, caso o plano A falhe passou a ser “o normal” na Climber.

Celebramos novos contratos com clientes comprando plantas para o escritório e habituámo-nos a almoçar todos os dias juntos.

A nossa cultura é informal, divertida, jovem, mas madura. “Palavrões” são usados e algum dark humor também, exibimos um cuidado em melhorar constantemente a comunicação, celebramos vitórias, incentivamos ciclos de tentativas-falhanços-aprendizagens e também a colaboração. Desafiamos o status quo todos os dias, somos diretos e transparentes, fazemos o que dizemos, e somos alérgicos a “bullshitagem” e quando vemos uma oportunidade de melhoria fazemo-lo, somos proativos, dinâmicos e flexíveis.

Procuramos conselhos externos e adoramos um bom desafio. Utilizamos uma abordagem analítica, tanto quanto possível, para tomar decisões. Estamos conscientes de nossas limitações e gostamos de nos manter focados. Pensamos primeiro no cliente. Ajudamos os outros e, acima de tudo, somos uma família, uma equipa e ouvimos atentamente.

A nossa maior força são as pessoas.

Falência de um parceiro, pandemia e momento de reinventar a Climber

No final de 2019 a nosso maior parceiro encerrou portas e de um dia para o outro fomos obrigados a reinventar-nos. A teoria não foi suficiente e tivemos que aprender com a experiência que não se devem colocar todos os ovos na mesma cesta.

Este episódio, aliado ao atraso na recepção de fundos dos investidores, levou-nos a ficar novamente sem dinheiro o que por sua vez trouxe dúvidas existenciais do género “mas que raio é que estamos a fazer (…) Porquê que estamos a fazer isto?”. O JP recorreu a dinheiro da mãe e contraiu uma dívida com a irmã em vez de estar a pagar juros ao banco.

Em Fevereiro 2020, fechámos parte da nova ronda de investimento elevando o investimento total acumulado para 1 milhão de euros, aumentámos os salários da equipa e o plano PPR do JP esgotou-se por completo. E finalmente respirámos!

quem conseguir sobreviver a esta crise terá maiores chances de sucesso.

Fomos sempre transparentes com a equipa os momentos difíceis e isso deu-nos uma vantagem no momento em que tivemos que comunicar más notícias quando surgiu a pandemia de covid-19. Com todos os nossos hotéis clientes fechados não tivemos outra alternativa que anunciar lay-off parcial, reduções salariais nos meses de recuperação e anulação de bónus, e ainda assim a equipa manteve-se unida. A decisão era ou isso ou despedir pessoas. Não despedimos ninguém.

A pandemia foi também o momento em que tivemos de nos reinventar. Ativámos o “modo emergência”, cancelámos o escritório por tempo indefinido, cortámos todos os custos ao mínimo indispensável, redefinimos processos e prioridades e passámos a ser ainda mais eficientes, focados e criativos. Criámos um espaço virtual muito próximo e fiel ao que era a nossa realidade física pré-covid e passámos a ter um espaço chamado “taberna” com canais de partilha de música onde cada colaborador podia ser DJ por um dia, eu passei a dar uma aula de yoga virtual aos sábados para a equipa e os founders passaram a fazer updates ainda mais regulares para manter todo o mundo a par dos acontecimentos. Retirei-me para uma casa de campo durante a maior parte do isolamento e descobri outra maneira de viver. A vida de cidade deixou de fazer tanto sentido.

Conclusão — 5 anos de existência e visão para o futuro

Sentimo-nos orgulhosos com o que já conquistámos, mas estamos nem perto das nossas ambições. O que nos move é o desafio. O desafio de fazer crescer um projeto a nível mundial, de criar um impacto positivo no mundo, de trabalhar com pessoas boas e inteligentes, num ambiente positivo e de aprendizagem que nos desafia todos os dias. Que outra razão levaria malta super inteligente e dedicada, PhD’s, a dedicar-se à Climber, trabalhar mais do que lhes é pedido num trabalho dito “normal”, se nós não pagamos salários de duas vezes a média do mercado?!

Ao longo do nosso percurso, foram mais as rejeições que os “Sim” que tivemos. 170 investidores disseram-nos que “não” nas três rondas de investimento realizadas, dezenas de candidaturas foram-nos rejeitadas e ainda assim a Climber continua a crescer e a ambição nunca diminuiu

O que mais me satisfaz é esta equipa. Podemos estar em situações difíceis mas conseguimos sempre descobrir uma maneira de dar a volta. Não desanimamos nos momentos mais difíceis e continuamos a “climbar”. Assim como ninguém escalaria o Everest sozinho, nós construímos uma equipa coesa que está disposta a aceitar sacrifícios para chegar ao cume da montanha. Demonstrámos ter uma atitude de persistência em tempos difíceis, executamos rápido, aprendemos rápido, delegamos grandes responsabilidades e olhamos para frente e para o que podemos fazer. Somos organizados, acompanhamos, somos orientados a detalhes e comunicativos, não somente entre nós mas também com os nossos clientes. Também somos muito generosos. No ínicio da pandemia rapidamente a equipa se juntou para colaborar com o Movimento #Tech4COVID19 a lançar soluções tecnológicas para parar a propagação do vírus em Portugal.

Somos diligentes e agimos com rigor, somos adaptáveis ​​e entendemos que a nova norma exige diferentes cursos de ação. Não temos medo de mudar de rumo quando necessário, fazemos iterações rápidas, somos muito pragmáticos e estamos cientes que desenvolver “as coisas certas” rapidamente é o importante, pois sabemos que os produtos mais fortes serão os que terão sucesso quando esta tempestade passar.

No fundo, sabemos que as nossas pessoas são o ativo mais importante da nossa empresa e, apesar do desafio atual, tenho plena confiança que iremos sair mais reforçados e conseguir fazer crescer o número de clientes. Entendemos que resiliência é o nome do jogo e é desta fibra que nós somos feitos.

Se és fundador de uma startup e estás a ler isto enquanto enfrentas esta pandemia e se te encontras a duvidar se realmente deverás continuar a desenvolver a tua startup ou não, lembra-te desta frase do Winston Churchill durante a 2ªGuerra Mundial que diz “se estiveres a passar pelo inferno, continua”, pois quem conseguir sobreviver a esta crise terá maiores chances de sucesso.

Mario

Persistence + hard work + motivation + great team + adaptability = That’s how we see success in the long term @ClimberRMS.

Para ler versão completa em Português clica aqui https://bit.ly/3ctkLhs

Connect with Climber on:

Linkedin: https://www.linkedin.com/company/climber-hotel/

Twitter: https://twitter.com/ClimberRMS

Website: www.climberrms.com

--

--