Um comparativo bem isento — só que não — sobre capitalismo e socialismo. (Fonte da imagem: UNAMA)

Os empresários não entenderam que a hostilidade a eles é uma questão ideológica

Minuto Produtivo
7 min readMar 22, 2015

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Depois de vários dias sem atualizar este espaço (na verdade, nem mesmo o blog pude atualizar desde terça-feira) por conta de uma série de compromissos acadêmicos e palestras que participei, resolvi hoje retornar a ativa e escrever sobre um tema que me veio à mente após uma mesa redonda sobre crise, oportunidades e empreendedorismo na FINDES (Federação das Indústrias do Espírito Santo) na última quarta-feira, cujos palestrantes eram um presidente de uma empresa de bebidas bastante conhecida em nível local e um dono de uma pequena empresa da área de tecnologia.

Durante a apresentação do primeiro, ele falou sobre o difícil cenário político-econômico que o país viveu — e ainda vive — depois das últimas eleições, bem como das nem um pouco novas dificuldades que o empresariado tem em atuar no Brasil: alta carga tributária, burocracia (2600 horas apenas para pagar impostos) e um ambiente regulatório quase imprevisível. Mas uma declaração me chamou a atenção: ele falou sobre uma hostilidade (ele chamou de xenofobia) que se tem no país à figura do empresário e do empreendedor em geral.

Depois da palestra dele e da vez do empresário do setor de tecnologia falar, chegou o momento das perguntas. Foi a hora em que dois amigos meus, um deles empresário da área de tecnologia e outro um coordenador do EPL (Estudantes pela Liberdade) do estado, resolveram perguntar sobre a questão dessa hostilidade ao empresário não ser resultante do ensino dado às pessoas desde o início da fase escolar. As respostas, da parte de ambos, foram bastante evasivas: ambos falaram da questão cultural (sem aprofundar em especificar o que seria isso exatamente) e do fato do Brasil ser um país majoritariamente católico, sendo que a Igreja Católica possuía — e possui — uma visão mais contida a respeito do lucro e do sistema capitalista de forma geral.

É claro que quanto ao último ponto do parágrafo anterior, é importante frisar que a Igreja Católica possui de fato uma visão mais comedida a respeito do capitalismo (tanto que foi nos países protestantes que este sistema tomou forma de forma mais rápida), mas vale lembrar que a Baviera é uma dos estados mais desenvolvidos da Alemanha (possuindo duas poderosas montadoras de automóveis, que são a Audi e a BMW) e os católicos são a maioria da população de lá. A Polônia, um país conservador e católico, é uma das economias mais desenvolvidas do Leste Europeu (inclusive passando quase ilesa pela crise de 2008), com várias multinacionais atuando por lá. É evidente que o fator religioso, apesar de importante, não é suficiente para explicar a simpatia ou antipatia das pessoas aos empresários e empreendedores. E é mais evidente ainda que isso não era o foco da pergunta feita pelos meus dois amigos.

Sim, caro leitor, a intenção de meus dois amigos no questionamento, que concordo e que será o tema deste post, é sobre o fato da doutrinação que crianças, adolescentes e jovens recebem nas escolas e universidades, levando à desconfiança e até mesmo hostilidade às figuras do empresário e/ou do empreendedor, situação essa observada em uma simples roda de discussão sobre economia e política. E este tema, embora tenha ganhado força nos últimos anos, não é uma novidade. Alguns jornalistas e colunistas já falam sobre isso há algum tempo, e inclusive existe uma ONG que lida com isso, chamada Escola Sem Partido. Eu mesmo já dei uma pincelada sobre isso em meu blog, ao comentar uma coluna de Gabriel Tebaldi no jornal A Gazeta.

Para que você entenda o quanto isso é importante no quadro final, farei uma ilustração: você matriculou seu filho em uma escola, seja pública (“de graça”, ou melhor, paga pelos seus impostos), seja privada (que você às vezes se sacrifica justamente para que o pimpolho não encare a ruindade da rede pública). Logo de cara, uma das “tias” do seu filho, na aula de Ciências Sociais, mostra uma foto de alguém em situação de rua e começa a falar das “injustiças” do capitalismo e do sistema econômico “neoliberal”. Se o moleque pergunta sobre o porquê dos EUA e países europeus serem países capitalistas e ricos, a “tia” já tem a resposta na ponta da língua: eles exploraram e colonizaram países latino-americanos, africanos e asiáticos e isso os levaram à riqueza. Ou ainda cita os países nórdicos como o modelo de “socialismo que deu certo”, mesmo que esses países sejam, na prática, países com liberdade econômica tão boa — ou até melhor — que os “neoliberais” da América Latina.

Lá por volta do sexto ou sétimo ano, quando se tem História, Geografia e, por vezes, Filosofia e Sociologia, o discurso de repulsa ao “sistema” continua. Seu filho, já devidamente formatado, começa a concordar com a ideia de que o capitalismo está levando o planeta a um colapso iminente (de preferência em alguma aula que fale de mudanças climáticas), de que o agronegócio é ruim para o país e por isso é urgente uma reforma agrária, de que os empresários só crescem às custas dos trabalhadores e que no socialismo nada disso aconteceria. Ah, lá pelo último ano, seu pivetinho acredita piamente que o nazifascismo é de direita, que a crise de 29 foi resultado do laissez-faire e que o New Deal de Franklin D. Roosevelt foi a salvação para o capitalismo, que a União Soviética não deu certo porque o “socialismo correto” não foi implementado e que Cuba é um paraíso apenas pelo fato de ter uma medicina acima da média (?!). Ah, e muitos discursos de ódio aos EUA e a Israel, este último visto quase como um Reich no Oriente Médio (mesmo sendo a única democracia que de fato funciona por aqueles cantos).

No ensino médio, tudo isso é repetido, em uma sequência mais rápida e em intensidade quase cavalar. O seu pimpolho, agora de smartphone e/ou tablet na mão e que passa o restante do dia batendo uma e jogando no Playstation ou Xbox, começa a escutar que possui uma dívida histórica com negros e índios, por isso as cotas raciais são vistas como um mal necessário (na hipótese mais rósea). Além disso, ele ouve na sala de aula que a mídia é conservadora e de direita (mesmo que abrigue Eliane Brum, Leonardo Sakamoto, Guilherme Boulos e outras sumidades da esquerda brasileira) e que é necessária uma “democratização” (um nome bem pomposo para censura, algo que remonta ao “direitista” regime militar, mesmo que este tenha sido estatizante até os ossos). Quando se questiona a ação de grupos que se valem do vandalismo contra prédios públicos, bancos e outras empresas ao protestar, o professor ou professora alega que isso se justifica pelo fato de que os políticos roubam mais e que os empresários exploram de forma quase escravizante os trabalhadores. Ah sim, abaixo o fascismo! Mesmo que logo depois se defenda leis trabalhistas baseadas em uma legislação cuja inspiração (uma delas) seja nada mais nada menos que a Carta del Lavoro de Benito Mussolini. É bem provável que os coleguinhas, em alguns casos filhinhos de empresários (caso seu filho estude em uma escola particular de ponta) tendam a concordar com o professor. E isso não mudaria se você, caso fosse pai desse garoto, fosse empresário.

Seu filho então termina o ensino médio e vai para a universidade. Se ele escolher algum curso de exatas ou biomédicas, é bem provável que ele esteja menos exposto às narrativas escutadas no ciclo básico (mas não as deixará de escutar totalmente). Mas se ele escolher trilhar as ciências humanas, tudo que ele escutou em doze anos, desde quando chamava a professora de “tia” até o último ano do ensino médio, será repetido em escala quase hipnótica. De quebra, ele terá contato com diversos movimentos sociais com uma sigla e nome mais bizarros que o outro, e assistirá a diversos “debates” para saber no que o Estado deve interferir. Ah, palavras como “privatização”, “PM” e até mesmo “família” podem ser vistas como algo ofensivo. Empresário? O único empresário que é tido como “bonzinho” e interessado no bem comum é o governo. Os demais são inescrupulosos que só pensam no lucro, portanto é bom que, caso eles tenham que existir, sejam regulados. Bem regulados. E taxados. Bem taxados.

Depois de tudo isso, pergunto: se você fosse pai, acharia surpreso que seu filho, após tudo isso, considerasse a hipótese de ser empresário como a última opção, preferindo um emprego no setor público? Ficaria espantado com ele achando até bom que os “burgueses” estão optando ficar em Miami após os últimos acontecimentos na política e na economia de nosso país? Se pasmaria caso ele defenda medidas intervencionistas na economia? Ou realmente se assustaria quando ele ache justificável que black blocs saiam por aí quebrando algumas empresas quando saem às ruas para protestar?

Resumindo: depois de doze a dezoito anos de um discurso obsoleto contra a figura do empresário, é realmente surpreendente que haja um clima de hostilidade por parte do Estado, da opinião pública e, até mesmo, da imprensa?

Sim, a hostilidade à figura do empresário no Brasil é, principalmente, uma questão ideológica. Sim, enquanto não tivermos aulas de empreendedorismo e educação financeira no ensino básico, não haverá nenhum contraponto a esse estado de coisas responsável por essa hostilidade. E sim, por mais que muitos empresários, sobretudo os grandes, tenham ficado calados diante dessa situação (talvez até porque tenham acreditado que as recentes políticas anticíclicas do governo fossem realmente dar certo), é necessário que eles ponham o dedo na ferida. Sem rodeios ou tergiversações.

Uma cultura empreendedora em longo prazo só será possível se, principalmente, tirarmos o ranço ideológico que cria essa inimizade entre a figura do empresário e a sociedade como um todo.

Por Marcos Jr.

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