O que o meu estômago achou da Conferência do Grupo de Planejamento

Eu normalmente tenho o estômago sensível. E a Conferência foi certeira em me pegar justamente aí.

Nathalia Andrijic
5 min readNov 21, 2017

A Conferência do Grupo de Planejamento é o evento mais tradicional da nossa área. Acontece em novembro ou dezembro e é um grande momento pra nos unirmos e refletirmos, além, é claro, de ser ótima pra reencontrar amigos e amigas e conhecer gente nova.

Esse ano, foi um evento nada técnico. Falamos pouco sobre ppts, pesquisa, apresentação, brief. Falamos de Valor e Valores nas mais diversas abordagens, umas discussões mais críticas e reflexivas.

E o que o meu estômago tem a ver com isso?

Eu normalmente tenho o estômago sensível. E a Conferência do Grupo de Planejamento foi certeira em me pegar justamente aí.

Primeiro porque eu ia palestrar pela primeira vez no evento e não tinha como não sentir um baita frio na barriga; segundo porque muitos temas foram bem o que a gente chama de soco no estômago. Ambos têm tudo a ver com estar fora da zona de conforto, e o meu estômago é o primeiro a sentir os efeitos.

O frio na barriga e o valor de dar espaço para novas vozes

Pela primeira vez o GP abriu espaço pra que 7 pessoas não tão conhecidas palestrassem e falassem sobre o que é importante pra elas dentro do tema Valor e Valores. 1h pra cada? Não, calma lá. Tudo começa de algum lugar. Eram 6 minutos e 40 segundos por palestra, o tempo clássico no formato Pecha Kucha, 20 segundos por slide, 20 slides passando um atrás do outro automaticamente. Um exercício e tanto!

Resolvi tentar entrar, e o frio na barriga começou já nas etapas de seleção.

Passei \o/ e estava lá dividindo palco com outras 6 novas vozes, como as musas inspiradoras Gabriela Rodrigues e Taís Santos, e outras que tive o prazer de conhecer lá (Camila Ugulino, Diego Selistre, Márcio Rodrigues e Pedro Schneider).

Nos nossos 6'40", falamos sobre temas como vieses inconscientes, processos seletivos inclusivos, vícios da publicidade, masculinidade e como ter Diversidade que vai além do brief de campanha e entra de fato nas agências.

E foi incrível! As apresentações foram muito boas, críticas e os temas se complementaram lindamente.

Foi bonito ver que tava todo mundo torcendo um pelo outro. Baita espaço legal que o GP abriu pra nós. Espero que tenhamos aberto portas pra que nos próximos eventos a gente ouça mais novas vozes e outras pessoas possam sentir o mesmo frio na barriga.

O soco no estômago #1 e o valor de acabar com invisibilidades

Invisibilidade e Inclusão foram temas que permearam diversas falas. E não teve como não se incomodar com a realidade do nosso mercado.

O Anderson França — Escritor e Fundador da Universidade da Correria — chegou quebrando protocolos e fez questão de deixar bem claro que gente não pode achar que tá tudo bem, tudo em estado de equilíbrio. O nosso pensamento tem que parar de girar em torno do nosso lugarzinho de conforto. A gente tem que dar um passinho pro lado e dar espaço pra quem historicamente nunca teve. E é claro que isso demanda esforço. Bem mais fácil não se mexer, né? Mas ninguém disse que seria fácil. Se a gente começa a ganhar influência, então, isso é justamente algo que pode ser usado pra abrir portas para outros.

“Inclusão é cardinal.” — Anderson França

A Maria Guimarães — Instituto 65/10 — exemplificou isso muito bem: Se não estão chegando mulheres negras nos nossos processos seletivos, por exemplo, talvez a gente esteja olhando nos lugares errados, ou pelo menos nos mesmos lugares de sempre. E aí novas portas não se abrem, é claro.

A gente precisa procurar por Diversidade primeiro, aí vem o talento. Se fizermos o caminho inverso, há grande chance de acharmos o talento muito rápido dentro da nossa bolha mesmo e desistirmos da Diversidade.

“Tem que ser obrigação levar Diversidade pra dentro da agência, só assim vai funcionar.” — Ana Cortat — Hybrid Colab

Pra ampliar o assunto, 2 referências bem recentes sobre Diversidade no Brasil: Think with Google Dossiê BrandLab — A busca por diversidade no Brasil e Diversidade no contexto das empresas brasileiras

O soco no estômago #2 e o valor de escancarar a verdade

O GP fez uma pesquisa sobre Assédio nas agências. Essa parte me derrubou, devo confessar.

O tema em si já é indigesto, mas os resultados chocantes, os depoimentos e a forma como foram apresentados, atacam o estômago até dos mais fortes.

Me impressionou o quanto Assédio moral e sexual são tão comuns e a gente fala tão pouco disso. O silêncio é a pior reação, mas infelizmente é a mais comum.

Esse gráfico é matador:

496 respondentes mulheres já sofreram Assédio sexual, 18 denunciaram formalmente, 3 viram alguma providência. Tem coisa importante demais se perdendo aí no caminho.

O vídeo com os depoimentos, então, é contraindicado pra quem tem gastrite.
Fica aqui o link do resumo enquanto não sai a pesquisa completa.

E agora?

A última coisa que podemos deixar que aconteça é que pare por aí. Discutirmos é só o começo. Precisamos de mais novas vozes nos eventos, mais inclusão no mercado, mais informações circulando sobre assédio e mais ação partindo de nós.

Meu Gastro não vai ficar muito feliz com os efeitos dessa Conferência, mas vou garantir pra ele que valeu muito a pena.
Por mais frio na barriga.
Por mais socos no estômago.

Se eles acontecem, é sinal de que não estamos na zona de conforto.
E apesar do desconforto, essa sensação é boa demais.

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Nathalia Andrijic

Estrategista Sênior no Waze/Google e Coordenadora de Estratégia na Miami Ad School