Duas Notas Sobre o Aprendizado Literário

Pedro G. Segato
3 min readAug 11, 2017

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Conselho para quem quer aprender a escrever: Encontre modelos, escritores ou poetas que, ao ler algo escrito por eles — não precisa necessariamente ser um livro inteiro, pode ser apenas um trecho — , você pense: “eu gostaria de escrever assim”. Depois de encontrados os modelos, não contente-se com menos que aquilo, trabalhe tendo em vista os modelos escolhidos, eles servirão de ponto de aferição com o qual você poderá julgar seu próprio progresso na arte da escrita.

➡️ Os modelos escolhidos não tem de ser necessariamente os maiores e melhores poetas ou escritores, e sim, aqueles com os quais você tenha uma profunda empatia. Você pode — e deve — aprender muito com Camões, por exemplo, mas a obra dele pode não ter nada a ver com aquilo que você quer realizar literariamente.

Ontem, antes de dormir, fiquei pensando em dois pontos daquela notinha sobre como aprender a escrever que, acredito, mereçam um aprofundamento. O primeiro ponto é a questão dos modelos. Quando digo que é necessário encontrar os modelos de imitação e aferição, estou me referindo a MUITOS modelos diferentes. É preciso estar constantemente encontrando novos modelos, reavaliando os já escolhidos e fazendo os ajustes necessários — esse é um exercício que segue pela vida a fora — porque, pior que modelo nenhum, é a escassez de modelos, o que limita e empobrece formidavelmente as suas possibilidades de expressão artística. Aqui entra o segundo ponto que eu quero esclarecer. Quando digo no complemento da nota que os modelos não precisam ser exatamente os maiores e melhores de cada gênero literário, estou me referindo a escritores dentro da Tradição Literária, e não a imitação de qualquer um. Você não precisa necessariamente imitar Dante, Tasso, Homero ou Virgílio, mas também não vai imitar Crepúsculo, 50 Tons de Cinza e Percy Jackson. Não vai alienar-se da Tradição, vai apenas imitar aqueles com os quais você se identifica profundamente — é preciso encontrar aqueles escritores que tem um temperamento e uma personalidade parecida com a sua, que tratam de assuntos sobre os quais você tenha um interesse sincero e que, de alguma maneira, realizaram aquilo que você pretende realizar. Vou dar um exemplo que condensa esses dois pontos: No período Barroco, você têm na Inglaterra as figuras centrais de William Shakespeare e John Milton mas, ao redor deles, temos uma miríade de grandes artistas que, em determinados pontos, chegam a superá-los: Robert Greene (c. 1558–1592), Thomas Kyd (1558–1594), Christopher Marlowe (1564–1593), George Chapman (1559–1634), Ben Jonson (c. 1573–1637), John Marston (c. 1575–1634), Thomas Dekker (c. 1570–1641), Thomas Heywood (c. 1575–1650), Thomas Middleton (c. 1570–1627), John Fletcher (1579–1625) & Francis Beaumont (1584–1616), Philip Massinger (1583–1640), Cyril Tourneur (c. 1575–1626), John Webster (c. 1580–1625), John Ford (1586–1639), James Shirley (1596–1666), William Drummond of Hawthornden (1585–1649), Aurelian Townshend (c. 1583–1643), Thomas Carew (c. 1565–1639), Sir John Suckling (1609–1642), Richard Lovelace (1618–1658), Edmund Waller (1606–1687), Robert Southwell (1561–1595), Robert Burton (1577–1640), John Donne (1572–1631), Thomas Browne (1605–1682), Jeremy Taylor (1613–1667), Henry King (1592–1669), George Herbert (1593–1633), Richard Crashaw (1612–1649), Henry Vaughan (1622–1695), Thomas Traherne (c. 1634–1674), Izaak Walton (1593–1683), Robert Herrick (1591–1674), Abrahan Cowley (1618–1667), Andrew Marvell (1621–1678) e John Bunyan (1628–1688). Em um período relativamente curto — mais ou menos um século — e em um lugar determinado, vejam a variedade e a quantidade de possíveis modelos — além dos dois grandes gênios — que um aspirante a escritor tem a disposição. Variedade essa que está disponível apenas para aqueles que conhecem a Tradição e levam a sério o fazer literário. Conhecer a Tradição para dela retirar os modelos a serem imitados é o caminho inescapável para o aprendizado literário. É somente imitando os grandes escritores que, quem sabe um dia, você também venha a tornar-se um deles. Fora disso, o que reina é o pedantismo, o amadorismo e a barbárie. ■

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Pedro G. Segato

Estudante de Literatura; apaixonado por Fotografia, Música, Cinema e Belas-Artes.