Aquela rasteira

Giovana
2 min readSep 15, 2017

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Na aula de interpretação, era para escolher um sentimento e fazer a construção dele a partir do corpo. Lembrei de quando ele terminou comigo e passei três dias tendo crises aleatórias de choro ao longo do dia. Em uma delas, me peguei agachada no chão, na porta da cozinha, como se fosse um desmaio. Decidi que seria a última, mas a cena ficou na minha cabeça porque estava sentindo o coração tão partido que parecia que podia pegar os cacos como peguei do copo de vidro que ele quebrou na minha casa. E porque foi uma cena bastante ridícula.

Então, na aula, repeti a posição. Tentei relembrar o que senti na hora.

Nada.

Me forcei a lembrar das palavras dele, do jeito que me olhou, de como me tratou.

Nada.

Pelo contrário, não senti tristeza. Senti orgulho de mim, pela maneira como lidei, como transformei isso tudo em uma historinha besta, como vai ficar bonita no meu livro.

Uma hora, senti. Mas apenas a sensação, o coração partido, não o motivo. Não pensei em saudade, raiva, tristeza, nada.

Coincidentemente, fui procurar uma informação numa conversa antiga. Minto, não era uma informação, era uma red flag. Encontrei. Por curiosidade, vi o perfil. Encontrei o da namorada, aquela, que tem o mesmo nome que eu, que ele dizia que o tratava igual um descarte de material reciclável, a ex que ele encontrou e ficou confuso.

Nada. Nem no dele, nem no dela.

Achei ela muito bonita. Mais que eu. Eu acho que eu também faria essa troca.

Ele não me impacta mais. O que me impacta é o que ele significou na minha vida. Eu achava que ele tinha me mostrado que era possível gostar de mim, e eu era grata por isso, até cheguei a dizer. Mas não é verdade. Ele me mostrou que é impossível gostar de mim por muito tempo, que minha graça se esgota em uma ou duas semanas, que o material reciclável, na verdade, sou eu. Eu deveria me sentir agradecida por qualquer pessoa que tenha o mínimo interesse em mim e aproveitar isso ao máximo porque não vai demorar para surgir outra pessoa muito melhor. Eu, que em certo momento me fiz acreditar que era tão sensacional, tão única e especial que os caras não sabiam lidar, que ouvi uma, duas, três, dezenas de vezes que eu era demais e muito divertida e apaixonante e todas essas baboseiras que os caras dizem achando que precisam disso pra me comer, entendi que, na verdade, eu é que sou completamente descartável.

Talvez seja baixa auto estima, talvez não. Talvez seja isso o que me joga sempre no colo de caras que me tratam como lixo — como o do começo desse texto — e talvez seja por isso que eu nunca vá deixar de me sentir descartável, substituível e desimportante. Talvez, por me sentir assim, eu trate todo mundo como insignificante. E, por todo mundo sentir que eu faço isso, a única coisa que eu recebo de volta é o mesmo.

E o ciclo recomeça.

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