Ingressar na creche: o novo desafio das crianças com a síndrome congênita do zika

Um ano depois dos primeiros casos da síndrome, crianças como Isabelly se preparam para começar a vida escolar

UNICEF Brasil
5 min readFeb 8, 2017
©UNICEF/BRZ/Paulo Rossi

No início de 2016, o Brasil declarou uma emergência de saúde pública: o número de crianças com a síndrome congênita do zika havia se multiplicado no País. Em apenas 12 meses, 2.366 bebês foram diagnosticados com a síndrome, em especial na Região Nordeste.

Passado um ano, essa primeira geração de crianças se prepara para um novo desafio: garantir seu direto à educação. Em fevereiro, bebês como Isabelly, 10 meses, chegam pela primeira vez à creche e começam sua vida escolar.

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Moradora de Campina Grande, a menina só foi diagnosticada com a síndrome congênita do zika aos 5 meses de vida. “Como a mãe dela teve zika na gravidez, ela era acompanhada no Hospital Pedro I [que faz parte do projeto Redes de Inclusão] desde pequena. Aí, com 5 meses, confirmaram a síndrome”, conta a avó Valdeci da Silva Rodrigues. “Na hora, bateu aquele desespero. Mas a gente se uniu para cuidar dela. Desde o primeiro momento, passei a apoiar a mãe e começamos o tratamento no hospital”, diz Valdeci.

Os primeiros meses foram dedicados aos cuidados com a saúde e ao estímulo do desenvolvimento de Isabelly. Fisioterapia, consultas ao neurologista, terapia ocupacional, exames e mais exames entraram na rotina da família. “A gente deixou nossas coisas de lado e passou a ficar com ela 24 horas por dia”, conta a avó.

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Enquanto a família cuidava de Isabelly, um grupo de profissionais de educação se preparava para também entrar na vida da menina. Em 2016, diante da emergência do zika, a Secretaria Municipal de Educação de Campina Grande passou a capacitar professores e cuidadores e organizar as creches para acolher essas crianças na rede pública de ensino. O trabalho tinha como foco a volta às aulas em 2017 — momento em que Isabelly e outras crianças com a síndrome entrariam oficialmente na rede.

O primeiro dia na creche

Isabelly foi matriculada em uma turma de berçário na Creche Alcides Cartaxo. O primeiro contato com a creche aconteceu dia 1º de fevereiro de 2017. A avó Valdeci chegou cedo, com a neta nos braços, acompanhada por duas tias da menina. A criança dormia tranquila, sem notar a movimentação ao redor.

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Logo chegaram a professora Roseane Farias da Silva e a cuidadora Antonieta Régia Ramos. Com um largo sorriso, as duas receberam a família e começaram um diálogo que deve se tornar rotina nos próximos meses. A apreensão inicial da família foi deixada de lado e a conversa fluiu, animada. Isabelly é a primeira criança com a síndrome congênita do zika a ingressar na creche e todos ali tinham muito a conversar.

A família queria saber como seriam os cuidados com a menina. As educadoras buscavam conhecer mais a criança e os familiares, além de explicar o dia a dia da creche. “A Isabelly está em uma turma de 13 crianças. Somos duas professoras na sala, além da Antonieta, cuidadora que ficará responsável por ela o tempo todo. A rotina da Isabelly será semelhante à dos demais — estimulação, comida, banho, soninho — além das orientações específicas que a cuidadora vai nos passar”, explicou Roseane à família.

“A Isabelly precisa de alimentação especial e tem horários diferentes por causa das consultas médicas. Como a gente faz?”, quis saber a avó. “As crianças aqui chegam às 7h e saem às 16h30, mas os horários são flexíveis. Vocês podem manter a agenda de atendimento médico dela e trazê-la antes ou depois das consultas”, explicou a professora. “Sobre a alimentação, vamos seguir a dieta enviada pelo hospital, como fazemos em outros casos como o dela”, tranquilizou a cuidadora.

©UNICEF/BRZ/Paulo Rossi

Conforme a conversa se desenrolava, família e educadoras começaram a trocar experiências e se aproximar. “Ela prefere ser segurada assim”, explicava a avó. “Ela gosta de brincar desse jeito”, mostrava uma das tias. As educadoras ouviam entusiasmadas e faziam perguntas e comentários.

Ao final do dia, ficou claro que a proximidade entre família e creche será fundamental para que a inclusão aconteça. “Ano passado, todas as professoras do berçário passaram pela formação teórica. Agora, com a Isabelly e a família dela, será nossa experiência prática”, afirmou Roseane. “Já acompanhei outras crianças na minha carreira e percebi que é sempre uma troca. Você sabe a teoria, mas cada criança é única. Tenho certeza de que todos vamos aprender muito juntos”, complementou a cuidadora Antonieta. “Vamos sentir falta da Isabelly em casa, mas desejamos tudo de melhor para ela neste ano que começa”, resumiu a avó.

Sobre o Redes de Inclusão

Redes de Inclusão é uma iniciativa do UNICEF, coordenada com governos no âmbito federal, estadual e municipal, com organizações da sociedade civil, como a Fundação Altino Ventura (FAV), com o Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (Conasems), o Instituto de Pesquisa e Apoio ao Desenvolvimento Social (Ipads), outros organismos internacionais — como Opas/OMS e ONU Mulheres — e o setor privado (Johnson & Johnson) para garantir os direitos de crianças com a síndrome congênita do zika e outras deficiências.

Elisa Meirelles, Brasília/Campina Grande, fevereiro de 2017

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Assegurar que cada criança e adolescente tenha seus direitos humanos integralmente cumpridos, respeitados e protegidos é a nossa principal missão.