Queda de casos, mortes no Irã, arma biológica e Carnaval

Ana Silva
6 min readFeb 20, 2020

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Total de casos: 75,676

Total de mortes: 2,123

Total de recuperados: 16,342

Hoje a província de Hubei declarou apenas 349 novas infecções.

É provável que o número de novos infectados por dia diminua bastante nos próximos dias e, se epidemias em outras localidades como Japão, Coréia e Hong Kong estiverem realmente em curso (tivemos mais 10 casos só hoje no Japão e mais 27 na Coréia do Sul) teremos um aumento exponencial novamente daqui duas ou três semanas.

Só hoje morreram 3 pessoas fora da China. Uma em Hong Kong e duas no Irã. Lembrando que, depois dos primeiros casos detectados na China, demorou cerca de um mês e meio pra que fossem registradas 3 mortes.

A queda no número de casos em Hubei significa boas notícias? Pode ser. Definitivamente o número de casos por dia dentro da China está caindo. A China também está começando a permitir que as pessoas voltem a trabalhar. Pode ser que a situação esteja sendo controlada ou pode ser uma forma de fazer com que a economia não sofra tanto o baque. Mas a notícia de que a China voltou a adotar o padrão de diagnóstico anterior, no qual a pessoa só pode ser considerada como positiva após o teste genético, torna o número baixo de casos meio suspeito. Há kits suficientes agora? Muita gente que esperava um diagnóstico foi diagnosticada clinicamente. A fila foi diminuindo, e, quando acabou, voltaram a adotar o teste genético. Fica aí a dúvida e a esperança de que logo as pessoas de Wuhan possam sair de casa sem medo e sem novos contágios.

Caso peculiar do dia:

Logo cedo, o Irã anunciou seus dois primeiros casos de COVID. Lá pelo meio dia, anunciou as duas primeiras mortes.

(O trecho foi tirado daqui e é traduzido pelo google)

[…]também escreveu em sua conta no Twitter: “Após o pico de doenças respiratórias agudas em Qom nos últimos dias, dois casos foram relatados positivos para coronavírus nos testes iniciais, infelizmente ambos O paciente faleceu em UTI devido a idade avançada e deficiência imunológica

Os pacientes foram diagnosticados no dia da morte. Entre o início dos sintomas e a morte, vão aí uns 14 dias em média. Antes disso, esses pacientes estavam internados sem isolamento, e com profissionais que não sabiam da doença. Nenhum dos dois tem histórico de viagem à China ou contato com outros casos. Até porque, no Irã, eles foram os primeiros.

Por outro lado, uma frase chamou a atenção: “Após o pico de doenças respiratórias agudas em Qom nos últimos dias,”

Levando em consideração que mesmo entre pessoas mais velhas a mortalidade gira em torno de 14%, qual a chance que esses dois, após cerca de 14 dias sintomáticos e mais alguns dias assintomáticos, sem saber de quem pegaram a doença, são os únicos casos nessa cidade, e além disso, acabaram ambos morrendo com apenas 14% de taxa de letalidade entre pessoas de mais de 80 anos?

E, vamos lá, quem garante que esse pico de doenças respiratórias agudas não tem, pelo menos, uma boa porção de COVID19 que nunca foi testado, já que nenhuma dessas pessoas veio da China ou teve contato com alguém que veio? Será que o COVID já não se instalou e essas duas mortes são realmente apenas 2% dos casos?

Já sabemos quão rápido a doença se espalha em hospitais. Sem isolamento, talvez saibamos mais sobre a velocidade dela no Irã, se o governo por lá não censurar dados.

Agora vou falar de outro assunto muito sério.

O SARS-CoV-2 ou COVID 19 não é uma arma biológica lançada propositalmente nem foi feito em laboratório

Existem características muito específicas para armas biológicas. E armas biológicas são raramente usadas, justamente porque é difícil atender esses critérios. Além disso, não dêem tanto crédito ao ser humano. A natureza ainda é muito melhor que a gente em criar microorganismos pra nos matar.

As características pra uma arma biológica eficiente, dentre outras, são:

  • Altíssima letalidade: afinal, você não vai gastar uma fortuna desenvolvendo e projetando uma arma biológica pra no fim ela não matar quem você quer que mate ou pra que a pessoa busque um tratamento que a cure. Uma doença com apenas 2% de letalidade seria uma arma biológica estúpida.
  • Baixíssimo contágio: uma arma biológica nunca vai ser facilmente transmissível, porque pode sair do controle e infectar sua própria população ou quem quer que seja. A menos que sua intenção seja destruir o mundo todo (e falhar absurdamente no processo, porque uma única doença nunca vai fazer isso), uma arma biológica tem que ser de fácil controle e mirar o alvo certo. Imagine que os EUA quisessem vencer a China em termos de ecomomia e lançasse o SARS-CoV-2. Quanto tempo ia demorar pra que a doença chegasse aos EUA e começasse a destruir a economia dos EUA? Seria estupidez lançar uma arma biológica com o contágio da SARS-CoV-2.

Um exemplo de arma biológica é o Antrax. O antrax era enviado em envelopes a políticos e pessoas da mídia. Ele é altamente letal, difícil tratamento, e baixíssimo contágio. Apenas quem recebia os envelopes corria risco. Certeiro e efetivo. E não sofreu nenhuma alteração por ninguém.

Dito isso, nada no genoma do SARS-CoV-2 indica que ele tenha sido modificado. Há um tempo surgiu um artigo dizendo que havia trechos do HIV no vírus, o que foi rapidamente provado como sendo informação falsa. Mas muita gente segue acreditando. O SARS-CoV-2 não é uma doença “estranha” nem apresenta qualquer característica que implique em alteração em laboratório.

É preciso se lembrar que, no passado, muitas outras doenças que saltaram de animais para humanos causaram pandemias devastadoras, muito antes que nós soubéssemos sequer o que são microorganismos. A Gripe Espanhola dizimou toda uma geração em 1918, quando nós não sabíamos nem a estrutura do DNA. De fato, o SARS-CoV-2 é muito menos impressionante que a gripe espanhola em termos de contágio, velocidade de mutação e letalidade. Se alguém tivesse feito alterações num coronavírus pra criar a COVID 19, essa pessoa certamente não sabia muito bem o que estava fazendo. Uma simples mutação num sítio específico de ligação com a ACE2 teria tornado o COVID 19 muito pior. Mas a mutação não ocorreu. Porque o COVID 19 veio de animais e não de uma placa de petri.

Além disso, se for pra criar uma arma biológica, vamos de H5N1, que não transmite entre humanos e mata 60% dos seus infectados. Mas duvido que alguém queira lidar com esse vírus fora de condições estritamente biosseguras para soltá-lo na natureza.

Enfim, o carnaval está chegando.

Minha recomendação é:

Se você tem diabetes ou hipertensão, evite aglomerações em cidades grandes como São Paulo, Rio ou Salvador. Imagino que cidades pequenas tenham um risco muito menor.

Se você tem mais de 60 anos, igualmente.

Se tiver febre e tosse nos dias posteriores ao carnaval (até 14 dias depois), não hesite em procurar atendimento médico, mesmo que sejam sintomas leves e que uma dipirona te faça se sentir melhor. E use uma máscara para ir até o médico. A máscara não te protege de pegar a doença, mas pode te impedir de espalhá-la. E não é a máscara cirúrgica, é uma N95. Também evite ir ao médico em transportes públicos. Se tiver que fazê-lo, lembre-se de carregar álcool gel e evitar tocar nariz, boca e olhos. Se um dos seus familiares tiver sintoma de febre e tosse depois de pular carnaval (até 14 dias depois), aconselhe-o a fazer o mesmo. Crianças não estão sendo afetadas, então não fique neurótico se tiver filhos. Adultos precisam de mais cuidados.

E não fique neurótico por motivo nenhum. A paranoia é a pior reação possível. Esteja alerta, mas não aterrorizado. Preste atenção, mas não surte. Pode ser que o vírus nunca entre no Brasil, pode ser que entre e suma antes de ser notado. Nenhum cenário está definido. Então não vá atrás de estocar coisas e esgotar o estoque de máscaras da farmácia. O vírus em si não é tão perigoso. Pegar COVID19 não é uma sentença de morte. A maior parte das pessoas passa pela doença como se fosse um resfriado. Portanto não se desespere nem perca o sono.

É isso!

Notícia extra: esse artigo parece ter confirmado a infecção assintomática.

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Ana Silva

Sou Bióloga pela Unicamp, trabalho com diagnóstico de influenza em aves pro governo e posto updates diários da situação do coronavírus.