Um sonho de Baía
Com uma câmera na mão, Ricardo Gomes mergulhou, em uma noite, sozinho, na Baía de Guanabara. Ele não poderia imaginar que, ao voltar para a superfície, sua vida nunca mais seria a mesma. Tempos depois é que ele entendeu que tinha mergulhado nele mesmo em busca de sua missão: projetar um sonho que passa por mostrar para o mundo a beleza da Baía de Guanabara.
“Água!nabara: Território Urca” é uma apresentação do Ministério de Turismo com o Instituto Urca.
“A realidade é interpretação. Eu interpretei a Baía de Guanabara pela beleza”. O autor dessa frase é o diretor de filmes Ricardo Gomes. Desde a década de 80, ele mergulha nas águas da baía. São mergulhos verdadeiros e metafóricos.
Se os “verdadeiros” lhe renderam sobrevivência e conquistas no mundo material, os metafóricos o ajudaram a identificar seu propósito de vida — que passa por mostrar para o mundo não apenas a beleza da Baía de Guanabara, mas contar aos sete ventos que a baía está viva, muito viva.
Ele já foi pescador naquelas águas, uma atividade que vislumbrou como fonte de sobrevivência, após a morte prematura da mãe. Porém, a cada peixe que tirava da água, sentia uma desarmonia profunda por ter provocado uma morte. Decidiu não mais matar. Abandonou a vida de pescador e se tornou vegetariano.
Para sobreviver, montou uma equipe de filmagem de casamentos. Até alcançou o sucesso material que tanto desejava. Porém, a desarmonia voltou a tomar conta dele. E Ricardo literalmente mergulhou na Baía como um batismo para uma vida nova.
“A gente fica com medo de viver o caminho que a vida escolhe para a gente. Cada pessoa é única e importante para o ecossistema. O medo da mudança paralisa a gente. Às vezes, o grande tesouro está no fundo do poço e é preciso mergulhar para encontrar”, diz.
Quando intuiu que seu caminho passava pela Baía de Guanabara, passou a fazer mergulhos de forma rotineira, sempre sozinho, sempre à noite. Ele admite que sentia muito medo: de ser preso em uma rede de pescador, de ser levado por uma correnteza.
Medo, solidão, escuridão. Breu total no dia em que apagou sua lanterna por alguns segundos eternos: “Naquele momento, resetei meu HD interno. Deixei de ser o Ricardo e passei a ser parte da Baía de Guanabara. Senti ela dentro de mim. Às vezes, para ser alguma coisa, é preciso ser nada”, comenta.
Ricardo tem certeza que a vida no interior da baía entendeu tudo o que aconteceu com ele. Tanto que passou a ser presenteado por aparições de animais marinhos raros, closes “sorridentes”, imagens surpreendentes que podem ser vistas no documentário “Mar Urbano” e no filme “Baía Urbana”, ambos exibidos em vários locais no Brasil e no exterior.
Ele não fecha os olhos (nem os ouvidos) para os problemas da Baía. Ricardo conta que o ruído debaixo da água aumentou muito desde seu primeiro mergulho — um barulho provocado pelo vai e vem de navios e que atordoa espécies como os botos. Sem falar na poluição provocada pelos mais variados despejos feitos por indústrias, naquelas águas que acabam por contaminar toda uma cadeia alimentar que pode chegar até o homem. Mesmo com tudo isso, a baía resiste.
“Olhar para a Baía e encontrar vida é como olhar para a nossa consciência, para o nosso pessimismo e trazer luz. É transformar medo em ação. Minha grande conquista foi projetar um sonho para a Baía de Guanabara. Por esse sonho, pela primeira vez, as pessoas viram beleza na baía, a beleza do mar. Esse sonho vai ficar brilhando para sempre. Se a gente veio do mar, eu já voltei para lá”.
Ao dizer isso, Ricardo se emociona e vai às lágrimas. As águas nos seus olhos aumentam o seu desejo de sonhos:
“Quando todo mundo sonhar, o mundo vai mudar. Esse é um grande lapso da ciência que não consegue explicar como uma pessoa consegue realizar tudo o que deseja por ter amor no coração”.