O CRUZEIRO CAMPEÃO BRASILEIRO DE 2013

Alma do Futebol
8 min readApr 15, 2020

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Da esquerda para a direita, em pé: Rafael, Leandro Guerreiro, Paulão, Nilton, Léo, Fábio, Thiago Carvalho, Ricardo Goulart e Anselmo Ramón; Agachados: Borges, Diego Souza, Éverton Ribeiro, Ceará, Egídio, Dagoberto, Luan, Lucca e Mayke. / Foto: Juliana Flister/VIPCOMM

Além do espírito vencedor que esse time possuía, o senso coletivo que ressaltava as qualidades individuais de cada jogador foi fundamental para o Cruzeiro chegar à conquista de seu terceiro campeonato brasileiro. Uma característica interessante era a de que os jogadores do elenco eram desconhecidos ou desacreditados, em sua grande maioria. Apostas que o diretor de futebol Alexandre Mattos e o presidente Gilvan Tavares foram felizardos em acreditar.

Dez dos dezenove atletas contratados por Mattos e Gilvan para a temporada de 2013. Metade deles vingaria no Cruzeiro. / Foto: Vipcomm

A principal dessas apostas foi naquele que fazia a magia acontecer dentro de campo: Éverton Ribeiro, também conhecido por Peléverton Dribeiro. O reforço veio à pedido de Marcelo Oliveira, com quem o meia-atacante já havia treinado no Coritiba. Com suas jogadas de pura genialidade, como o golaço contra o Flamengo pela primeira partida das oitavas de final da Copa do Brasil, Éverton se consagrou como o craque do Cruzeiro naquele ano, levando os prêmios da Bola de Ouro e da Bola de Prata, que premiavam o melhor jogador do Campeonato Brasileiro. Extremamente ligeiro, o jogador de 1,74m de altura tinha no raciocínio rápido sua principal arma para efetuar os dribles — um mais bonito que o outro — em seus adversários.

Éverton Ribeiro teve uma passagem marcante pelo Cruzeiro. / Foto: VEJA

O meia ao seu lado - para ajudar na organização e no arremate das jogadas criadas - era Ricardo Goulart. Vencendo a disputa com o Atlético pelo jogador, Goulart provou ser digno do esforço que a diretoria celeste realizou para trazê-lo ao Cruzeiro, após mais de quatro meses de negociação. Em 2012, o meia-atacante realizou uma temporada excelente com a camisa do Goiás, sagrando-se um dos principais destaques do time campeão da Série B. Nesse time, possuía um entrosamento excelente com o lateral-esquerdo Egídio, dobradinha cujo sucesso se repetiria ao longo de 2013 e 2014, já que o lateral também seria contratado pelo Cruzeiro após a campanha vitoriosa com a equipe esmeraldina na segunda divisão.

Egídio e Goulart: de campeões da Série B em 2012 para campeões da Série A em 2013. / Foto: Tarcísio Badaró

Os cabeceios e as finalizações precisas de Goulart eram incrementadas pelas assistências de Egídio, que sabia exatamente onde seu companheiro estaria na hora do cruzamento ou do passe. Ainda que deixasse espaço na defesa quando subia ao ataque, Egídio compensava as falhas defensivas pelas inúmeras oportunidades de gol que gerava para seus companheiros. Pelo lado estratégico, Marcelo Oliveira conseguia manter um lateral tão ofensivo no time graças a Nilton, que preenchia os espaços deixados pelo jogador do ‘’tique da perninha’’ - apelido carinhoso de Egídio perante a torcida cruzeirense.

Nilton dava o sangue pelo time. / Foto: Washington Alves / VIPCOMM

Falando do volante, que estava sempre na cobertura dos laterais e dos meias, pode-se dizer que foi um dos jogadores desacreditados que veio integrar o elenco estrelado. Vindo do Vasco com fama de brucutu, Nilton provou ser muito mais do que um volante qualquer. Com oito gols anotados no ano, um destes magnífico contra o botafogo, o camisa 19 mostrou ser útil em todas as áreas do campo. Um verdadeiro leão em campo. A explicação do porque foi vendido à preço de banana para o Internacional, no começo de 2015, ainda é procurada. Perfeito nos desarmes, dava tranquilidade para Lucas Silva ter liberdade em sair para o ataque e criar jogadas ofensivas com os talentosos meias.

Lucas Silva venceu Tinga, Guerreiro, Henrique e Souza na disputa da posição. Foto: Washington Alves/Vipcomm

A principal qualidade do segundo volante celeste era a regularidade de seus passes e lançamentos, sempre visando o jogo à frente. Assim como acontecia com os dois meias, as características de jogo dos dois volantes se complementavam. Enquanto o ex-jogador do Vasco era o responsável pelo trabalho sujo, o camisa 16 ficava encaminhado pela ótima saída de bola do time celeste. Uma qualidade em comum dos dois era a potência do chute: no espetacular 5 a 3 contra o Vasco, Lucas Silva marcou dois belos gols de fora da área. Dois anos depois, não seria à toa que o Real Madrid pagaria quinze milhões de euros por ele.

O 4–2–2–2 de Marcelo Oliveira. Flutuação do quarteto ofensivo era o ponto alto do esquema tático. / Arte: João Lamêgo

Ao longo de 2013, Ceará e Mayke travaram uma intensa disputa em torno da titularidade no lado direito da equipe. Ao passo que Ceará teve maior regularidade ao longo da temporada, Mayke assumiu a titularidade na reta final do ano. Em entrevistas, os dois relataram que aprenderam muito um com o outro, e que a saudável disputa só trouxe benefícios, tanto para eles quanto para o próprio Cruzeiro. À época, Mayke falou para o Portal ndmais: ‘’O que eu penso é poder ajudar nos jogos, procurar fazer o que o Ceará faz nas partidas. Mas, enquanto o Ceará estiver no Cruzeiro, ele vai ser titular absoluto.’’ Com boas viradas de jogo, Ceará ajudava o cruzeiro a cadenciar a partida, e quando o time precisava ser mais ofensivo esta era a deixa para Mayke entrar na partida, explorando de sua velocidade e de seus cruzamentos eficazes.

A lateral-direita cruzeirense nunca teve dois nomes tão bons na temporada para o setor. / Foto: SuperEsportes

Acomodação não era algo presente no elenco. O ataque era o reflexo disso. Com mais de dez opções, a dor de cabeça ficava inteiramente para Marcelo Oliveira. Uma destas opções era Ananias. O jogador, falecido no voo da LaMia2933, foi um dos destaques da Portuguesa campeã da Série B de 2011, fez boa campanha no Brasileirão de 2012. Chegou em troca do veterano meia Souza, que viria a ser o camisa 10 da Portuguesa no campeonato. Não teve muitas chances e acabou emprestado ao Palmeiras, que em troca repassou o volante Souza ao Cruzeiro, conhecido pelo seu chute à longa distância, suas cobranças de faltas e seu chamativo cabelo ruivo. Uma troca satisfatória para o Cruzeiro, que precisava de mais um volante com boa saída de bola para revezar com Lucas Silva. Martinuccio era o gringo do ataque celeste. Acabou não sendo tão útil quanto em 2012, quando fez 4 gols em 10 jogos. As lesões, aliadas das diversas opções ofensivas, atrapalhavam-no em sua frequência de jogos. Lucca também jogou pouco em seu período pelo Cruzeiro: apenas onze jogos e dois gols marcados. Toda a expectativa feita pela transação — em que foram mandados cinco jogadores por empréstimo ao Criciúma — não se concretizou. O consagrado Júlio Baptista, apresentado à torcida dentro de um carro-forte, e o atacante Luan, emprestado pelo Palmeiras, marcaram cinco gols cada ao longo da temporada, porém ficou o sentimento de que se esperava mais dos dois. Luan marcou três de seus cinco gols contra o São Paulo, no Morumbi, em uma vitória por 3x0 que mostrava que o Cruzeiro realmente não estava brincando na disputa do título. Em outra vitória pelo mesmo placar, mas desta vez com o adversário sendo o Botafogo, Baptista marcou dois dos três gols, decretando o aumento da diferença entre os dois times, naquela que foi considerada a ‘’final antecipada’’ do campeonato. Por sua vez, Vinícius Araújo marcou 9 gols em apenas 24 jogos, marca bem expressiva, ainda mais por ser o primeiro ano do jogador como profissional. Ficou marcado negativamente pela torcida por ter perdido gols contra o Flamengo nas oitavas de final da Copa do Brasil, em que provavelmente um desses gols poderia classificar o Cruzeiro para a fase seguinte do torneio. Foi vendido ao Valencia no final do ano. Agora, os três homens mais importantes do ataque celeste: Dagoberto, Borges e Willian.

Willian, Dagol e Borges: os protagonistas do ataque celeste. / Foto: Maurício Paulucci

O primeiro, que veio de um ano sem tanto brilho no Internacional, destacou-se no campeonato mineiro de 2013 e foi um reserva à altura no restante da temporada, lidando com lesões que o tirariam de jogos importantes da temporada. Foi um dos jogadores mais reverenciados pela torcida, principalmente pelo gol no clássico contra o Atlético, e por sua postura irreverente, contida em frases como: ‘’Eu não sei a música, mas tô cantando.’’ e ‘‘Entrega logo a taça.’’ Seu parceiro de ataque no São Paulo, Humberlito Borges — o dono da camisa 9 celeste daquele ano -, fez jus ao manto que estava usando. Com 19 gols em 39 jogos no ano, foi o artilheiro do Cruzeiro no ano. Um dos melhores finalizadores que já passou pelo clube. Formou um quarteto de ataque admirável com Éverton, Ricardo e Willian. Este último foi a chave que faltava ao time para engrenar de vez. Chegando de empréstimo pela troca que o Cruzeiro fez com o Metalist, da Ucrânia, envolvendo o meia Diego Souza, que esteve presente em alguns jogos do Cruzeiro ao longo do ano, além de uma compensação financeira ao time celeste, Willian caiu como uma luva no time de Marcelo Oliveira. Jogando pelo lado esquerdo do ataque, quase como um parceiro de Borges, utilizava de sua velocidade para afunilar as jogadas.

Willian em ação pelo Cruzeiro. Foto: Washington Alves / Vipcomm

Tendo um chute colocado preciso, era o cobrador do escanteio pelo lado direito do ataque, muitas vezes levando grande perigo de gol aos adversários, pela forma da batida — com muita curva — e dos grandes cabeceadores cruzeirenses — Nilton, Bruno Rodrigo e Dedé.

A força da bola aérea do Cruzeiro não era brincadeira. / Foto: Washington Alves / Vipcomm

Estes dois últimos formaram a melhor dupla de zaga que o Cruzeiro poderia querer em 2013. O primeiro chegou em baixa e jogou tudo aquilo que não se esperava dele, enquanto o segundo veio a peso de ouro, não correspondeu às expectativas inicialmente, mas assim que pegou confiança, tornou-se o melhor zagueiro do Brasil naquele ano. Bruno Rodrigo e Dedé, respectivamente, eram o pilar que sustentava o time celeste, dois monstros pelo alto. Fazer gol de cabeça no Cruzeiro era uma tarefa quase impossível.

Os zagueiros-artilheiros do Cruzeiro. / Foto: SuperEsportes

Se a bola dificilmente passasse por algum dos dois ainda havia Fábio, que viveu uma de suas melhores temporadas no arco estrelado, merecendo uma convocação para a Seleção Brasileira, que somente chegou em 2011 e parou por aí. Mas é como o próprio arqueiro diz: ‘’O Cruzeiro é minha seleção.’’

Fábio: o goleiro mais identificado da história com o Cruzeiro. / Foto: ESPN

E ele estava certo.

O Cruzeiro daquele ano foi uma seleção.

Das grandes.

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