Explorando os Labirintos da Mente: A Origem da Psicodelia Brasileira

Lucas Almeida
6 min readJul 22, 2023

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por Lucas Almeida

Prefácio

A história da música é marcada por diversos movimentos que transcendem meras melodias e acordes, introduzindo uma revolução cultural e espiritual em seu caminho. Um desses movimentos que ecoou nas mentes e corações de uma geração inteira, durante a década de 1960, foi a psicodelia.

Nascida em um contexto de mudança social e exploração de novos horizontes, a psicodelia emergiu como uma poderosa expressão artística que fundia sons experimentais, letras poéticas e experiências psicodélicas. Nesta jornada, mergulharemos nas raízes da psicodelia, revelando como essa corrente musical transformou-se em um portal para a expansão da mente e o questionamento do status quo, deixando um legado duradouro na cultura popular.

A Psicodelia Lisérgica

A origem desse estilo musical está fortemente associada à expansão da consciência e ao uso de substâncias psicodélicas como LSD, que influenciaram a música e a cultura da época.

Os primeiros sinais do gênero podem ser encontrados no rock and roll e na música folk dos anos 50 e início dos 60. No entanto, foi a partir da metade dos anos 60 que a psicodelia floresceu. Bandas como The Beatles, The Rolling Stones, The Byrds e Pink Floyd foram pioneiras nesse novo estilo, incorporando novos sons, experimentação sonora e letras que refletiam as experiências psicodélicas.

Os artistas psicodélicos buscavam criar uma experiência imersiva, não apenas através da música, mas também de efeitos visuais, arte e performances ao vivo. Festivais icônicos, como o Woodstock, desempenharam um papel fundamental na popularização da psicodelia, proporcionando um espaço para a livre expressão e experimentação artística.

A psicodelia foi um movimento de contracultura que desafiou as normas sociais e políticas da época, abraçando a liberdade, o amor e a espiritualidade. Sua influência transcendeu a música e deixou marcas duradouras na moda, na arte e na cultura popular em geral.

Hoje, a psicodelia ainda é apreciada por muitos, seja como um retorno à nostalgia da era psicodélica ou como uma fonte de inspiração para novas gerações de músicos e artistas que buscam inovar e explorar novos territórios musicais.

As Portas da Percepção Tupiniquins

A psicodelia também teve um impacto significativo na cena musical brasileira, principalmente durante as décadas de 1960 e 1970. Assim como em outros lugares do mundo, o movimento psicodélico no Brasil estava ligado ao contexto sociopolítico e cultural da época.

Na década de 1960, o Brasil estava passando por um período de efervescência cultural e política, com o regime militar assumindo o poder em 1964. Nesse contexto, a música tornou-se uma forma de expressão e resistência para muitos artistas, e a psicodelia se encaixou perfeitamente como uma maneira de desafiar as normas estabelecidas e buscar novas formas de criatividade.

Podemos dizer que a Região Nordeste – especialmente os estados da Paraíba e Pernambuco – desempenharam um papel fundamental no surgimento da psicodelia no Brasil. Durante a década de 1960, a região foi um importante centro cultural e artístico, que abrigou um movimento conhecido como “Movimento Armorial”.

O Movimento Armorial e Seus Sucessores

O Movimento Armorial, liderado pelo escritor Ariano Suassuna, buscava valorizar a cultura popular nordestina e suas raízes históricas. Eles se inspiraram na música folclórica, na literatura de cordel e nas tradições culturais da região, com o objetivo de criar uma arte erudita genuinamente brasileira.

O movimento buscava valorizar e resgatar as tradições culturais populares nordestinas, elevando-as a uma esfera artística erudita e contemporânea.

O termo “Armorial” deriva de “arma” ou “escudo”, fazendo referência à ideia de que a cultura do Nordeste brasileiro era um verdadeiro escudo identitário e simbólico para o país. O movimento foi fortemente influenciado pela história e cultura do sertão nordestino, que engloba diversos aspectos, como a literatura de cordel, a xilogravura, o repente, as festas populares e a música regional.

Ariano Suassuna defendia que a cultura popular do Nordeste era uma fonte rica de inspiração para a criação de uma arte erudita e genuinamente brasileira.

Ele propôs uma estética que valorizasse as raízes culturais do país, promovendo uma arte com elementos tradicionais em diálogo com a modernidade. A intenção era escapar das influências estrangeiras que predominavam na cultura brasileira e, ao mesmo tempo, preservar as tradições locais.

No âmbito musical, o Movimento Armorial influenciou a criação de composições que incorporaram instrumentos regionais e temas folclóricos nordestinos. Dessa forma, compositores como Guerra Peixe, Cussy de Almeida e Antônio José Madureira se destacaram ao adotar a proposta armorial em suas obras.

O movimento teve forte impacto em Pernambuco, especialmente no Recife, onde Ariano Suassuna fundou o Quinteto Armorial em 1970, uma formação musical dedicada a promover a música erudita regional e as tradições folclóricas do Nordeste.

Ao longo do tempo, o Movimento Armorial conquistou reconhecimento nacional e internacional, influenciando não apenas a música, mas também o teatro, a literatura e as artes plásticas. A valorização das raízes culturais nordestinas e o diálogo com a contemporaneidade continuam a inspirar artistas e intelectuais até os dias de hoje, deixando um legado importante para a cultura brasileira. O Movimento Armorial foi uma tentativa profunda de conectar a identidade cultural do Brasil com suas raízes, deixando uma marca indelével na história da arte e da valorização da diversidade cultural do país.

Essa valorização das raízes culturais nordestinas influenciou alguns artistas que estavam envolvidos na cena musical da época, incluindo os integrantes da banda Os Mutantes, liderados pelos irmãos Arnaldo Baptista e Sérgio Dias e pela cantora Rita Lee, assim como pelas correntes da Tropicália e da psicodelia internacional. Eles misturavam psicodelia com influências tropicais e experimentais, criando uma sonoridade única que incorporava elementos de rock, samba, música indígena e música folclórica brasileira. A banda se destacou por suas experimentações sonoras e pela mistura de elementos tradicionais com novas formas de expressão musical.

A influência do Movimento Armorial na formação de artistas e bandas que buscaram uma abordagem inovadora para a música brasileira, incorporando elementos psicodélicos em suas criações foi importantíssima para o surgimento de uma raiz única no movimento mundial. Essa fusão de raízes culturais regionais com a experimentação sonora contribuiu significativamente para a cena psicodélica brasileira e seu desenvolvimento como parte importante da história musical do país.

Além de Os Mutantes, outras bandas e artistas brasileiros também abraçaram a psicodelia, como Novos Baianos, Secos & Molhados e Tom Zé. A música psicodélica brasileira muitas vezes combinava letras poéticas com arranjos complexos e experimentação sonora, buscando expandir os limites da música popular brasileira.

O Tropicalismo também compartilhava algumas características com a psicodelia, incorporando elementos de vanguarda, arte e música experimental.

Embora a ditadura militar tenha reprimido algumas expressões culturais na época, a psicodelia e o Tropicalismo conseguiram deixar uma marca duradoura na música brasileira. Até os dias atuais, a influência da psicodelia pode ser sentida em diversos gêneros e na música de artistas contemporâneos no Brasil. O legado da psicodelia continua vivo como parte importante da história e da identidade musical do país.

Considerações Finais

Ao longo desta exploração sobre a origem da psicodelia no Brasil, ficou evidente como esse movimento musical representou muito mais do que uma simples experimentação sonora. A psicodelia floresceu em um momento de efervescência cultural, em que as mentes buscavam novos horizontes, rompendo barreiras e questionando as normas estabelecidas. Seu surgimento coincidiu com um período de transformação social e uma busca por liberdade de expressão, resultando em uma poderosa ferramenta para a resistência e a transcendência.

A ligação entre o Movimento Armorial em Pernambuco e o surgimento da psicodelia no Brasil mostra como a música pode ser uma ponte entre as raízes culturais de um país e a vanguarda artística, encontrando na fusão desses elementos uma identidade única e pulsante.

Através da psicodelia, artistas encontraram uma linguagem para expressar suas visões de mundo, provocando o público a questionar sua realidade e a abraçar a liberdade criativa. A jornada pela psicodelia transcendeu as notas musicais, levando-nos a uma viagem pela expansão da mente, seja através de experiências psicodélicas ou da introspecção pessoal.

Seu legado permanece vivo, ecoando em diversas correntes musicais e na cultura popular contemporânea. A psicodelia continua a inspirar novas gerações de artistas a explorar fronteiras desconhecidas e desafiar limites, mantendo-se como uma força transformadora e revolucionária.

Assim, concluímos que tanto os movimentos artísticos nacionais quanto os de uma influência internacional puderam e ainda conversam de forma brilhantemente simbiótica. A psicodelia brasileira modificou a forma de se consumir e entender música no nosso país. A influência das nossas musicalidades únicas fizeram com que esse molde modernista importado se tornasse aquilo que essencialmente buscava ser, uma integralmente uma conexão entre nossos ouvidos e alma, uma busca pelo autoconhecimento e pelo equilíbrio místico e divino.

Agradecimentos

Gostaria de agradecer aos meus pais e meu irmão pelos discos e filmes, aos meus amigos Raian e Enzo pela sugestão do assunto, que se revelou inspirador e essencial para o desenvolvimento do meu trabalho e à minha namorada Yasmim que sempre me apoia nos meus mais sinceros e loucos projetos. Obrigado aos artistas da psicodelia mundial que me inspiraram nessa pesquisa.

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