Explicando “que diabos aconteceu com a Geração Y”

Anthony Ravoni
6 min readFeb 15, 2016
Os nativos digitais. A geração Y, também conhecida como Millennials

Diversos amigos e até mesmo meu padastro fizeram pipocar em minha timeline um artigo questionando “O que diabos aconteceu com a GERAÇÃO Y?!”. Ele parte de bons pontos e traz questionamento que todos devemos fazer sobre o nosso ambiente de trabalho. Porém, se você realmente concorda com a maioria dos argumentos apresentados no artigo, talvez você não tenha entendida tããão bem assim a “Geração Y”.

Sim. Você produz dezenas de vezes mais do que seus pais ou tios. E isso graças as tecnologias digitais que revolucionaram todas as formas de interação nas últimas décadas. Os avanços tecnológicos tornaram desnecessárias indas e vindas ao centro da cidade, cartórios, lotéricas e bancos. Scanners, e-mails e até mesmo as câmeras dos smartphones solucionaram isso. Permitiram nos livrar de todo o entrave burocrático e colocou o foco da jornada de trabalho no que realmente importa: criar.

O mundo não precisa mais de funcionários obedientes que batam o cartão pontualmente, façam serviços burocráticos e produzam o necessário para manter as engrenagens do atual sistema girando. Precisamos de criativos, pessoas que desafiem regras, inovadores, gente capaz de olhar todas essas mudanças que estão acontecendo e tentar tirar o melhor delas para construirmos um mundo mais sustentável e justo.

O que mais incomoda no texto é o lugar de fala do autor. Parece partir de um caso quase isolado para tentar retratar toda uma geração de brasileiros. Ele comenta como aos 24 anos seu avô já tinha um carro e estava estabilizado na vida. Bem, o meu avô nessa idade mal tinha um cavalo que ele precisava dividir com quase toda a família na roça capixaba. Minha história é regra e não exceção em um país no qual 25 milhões de pessoas saíram da pobreza nos últimos 30 anos.

A exceção no contexto brasileiro é o filho de classe média alta que hoje tem uma qualidade de vida inferior à dos patriarcas. E diversas circunstâncias podem levar a esse fenômeno. Escolha por profissões que se desvalorizaram no novo contexto ou até mesmo o fato dessa geração nascida na classe média alta pela primeira vez ter que disputar vaga com uma geração de “emergentes” que teve uma inédita oportunidade de chegar ao curso superior e se qualificar profissionalmente.

Se o autor se referia a um contexto mundial… Bem, o recorte ficou um tanto amplo né? E não dá pra desconsiderar que estávamos a pouco naquela que já é tida por alguns como a maior crise financeira dos últimos séculos. E pensando nisso, vamos convir que os Y nem estão indo tão mal assim né?

Bansky

Felicidade VS Salário

Fazer o que ama e ganhar rios de dinheiro raramente vão andar de mãos dadas. Quem consegue isso realmente são pessoas fora da curva. Se o seu sonho é receber altos salários talvez você deva realmente procurar seu próximo emprego baseado nisso e não em regalias ou flexibilidade de horário.

Mas sabe o que é bacana? Tá ficando cada vez mais fácil se tornar um ponto fora da curva. Tenho diversos conhecidos que conseguiram largar profissões estabelecidas e hoje pagam as contas fazendo aquilo que amam. Desde escrever sobre séries até viajar o mundo e ganhar dinheiro com isso. Eles já são ricaços? Nenhum deles. A maioria nunca foi. Mas estão ganhando cada vez mais e tem acesso a novas formas de monetização. São felizes? Todos me disseram que sim. Talvez seja uma questão de tempo até eles se fixarem fora da curva. Ou talvez não. Assim como quem escolhe uma carreira mais tradicional. Entretanto, ao menos eles estão no caminho onde se julgam mais felizes. Isso deve valer de algo né?

Claro que viver do que ama não é um mandamento escrito em pedra pelos Deuses da Geração Y. Você pode “só” ter um trabalho e através do merecido salário viver as experiências que ama. Isso não é crime. Só tente arranjar um trampo que não te faça infeliz na maior parte do dia. Eu juro que existe um assim te esperando por aí ;)

E se você trabalha em um lugar descolado cheio de pequenas regalias. Garanta que eles sejam descolados em tudo que é preciso. Inclusive em ter as contas abertas de forma transparente para os funcionários. Assim você vai se certificar se o salário tá justo e terá mais argumentos para negociar aumentos e benefícios.

Até 2020 mais de 1 bilhão de pessoas trabalharão de suas casas

A Revolução Home-Office

O artigo também crítica bastante a prática de home-office. Não curte home-office? Procure empresas ou profissões onde você não seja obrigado a trabalhar assim.

A verdade é que o home-office é uma grande novidade e a sociedade em todas as suas instâncias ainda precisa aprender a lidar com ele. O que não falta aqui no Medium são textos com dicas para trabalhar e produzir bem trabalhando de casa sem precisar sacrificar sua vida pessoal. Também não faltam dicas de como produzir bem sentado na cadeira de um escritório no centro da cidade.

Mas você quer responder e-mail 2h da manhã? Tá perfeito. Busque sempre trabalhar da maneira que te torne mais produtivo. Mas seja compensado por isso. E a recompensa não precisa ser dinheiro. Pode ser um agradecimento sincero ou a liberdade de tirar uma folga meio em cima da hora em uma sexta-feira tranquila. Acha que precisa ganhar mais por mandar e-mail às duas da manhã? Justo. Primeiro, certifique se realmente alguém te impôs a fazer isso. Se sim, converse com seu gestor. Explique os seus pontos, se ele for honesto vai te entender. Se não, procure outra empresa para trabalhar e, caso julgue necessário, corra atrás do seus direitos. Tem medo de ficar queimado no mercado? Pense bem se você realmente deseja ser bem visto eme um mercado onde se sente explorado e injustamente remunerado. Mas lembre-se: não adianta fazer post no Facebook às 2h da madruga para reclamar de estar no trabalho se passou mais da metade do expediente normal em conversas de grupos no WhatsApp.

E sobre o cliente ter sempre razão…

Claro que nem sempre ele tem. Mas posso contar um segredo? É ele que tá pagando. Se ele tá contratando a sua mão de obra é justo que a palavra final seja dele. Isso não é motivo para você parar de defender o que você acha correto. Porém apresente argumentos sólidos. Não adianta dizer que “logo dourado com bordas vermelhas é feio”. Traga referências de autores. Apresente estudos. Negocie soluções. Se depois de tudo isso ele bater o pé em algum resultado que não te agrade, tudo bem, se você for autônomo terá sempre a opção de recusar o cliente. Se não, faça o trabalho e pague as contas com ele. Estilo seus avôs e pais faziam. Lembra?

Conclusão? Eu tenho uma

Se você está na décima quarta startup na procura por ser um milionário. Provavelmente você está nessa pelos propósitos errados. Aqui não é Vale do Silício, existem outros empreendimentos com muito mais possibilidades de te tornarem um milionário. Mas você tá na sua décima quarta tentativa de construir algo que realmente acredita ser capaz de impactar a vida das pessoas? Parabéns! Tenho certeza que se não for dessa vez, em breve você vai alcançar um sucesso. A maioria das pessoas consideradas bem-sucedidas já “falharam” antes, a maioria só tem essa parte da trajetória omitida.

Também olho um pouco torto para quem se diz CEO de empresa sem nenhum funcionário. Mas na real? Essa é a grande graça do mundo profissional que a Geração Y está construindo. Sabe todos aqueles rótulos e cargos construídos nos últimos séculos? De tão limitadores e pouco representativos eles já não servem mais. Foi preciso criar rótulos e cargos com base apenas na imaginação e algum senso de coerência. A menina se denomina líder-team da equipe de vendas em vez de vendedora? Bom pra ela. Não entendo como alguém nomear o cargo da maneira que se sinta mais confortável pode ofender alguém.

O que aconteceu com a Geração Y? Ela buscou um caminho de felicidade sem se prender a velhos conceitos de um mundo contextualmente muito diferente do atual. Acertamos todas as escolhas? Claro que não. Nenhuma geração conseguiu isso antes e olha que poucas tiveram que aprender a lidar com tantos avanços tecnológicos em tão curto espaço de tempo.

Estamos tentando vivenciar ao máximo as possibilidades que esse novo mundo nos traz, enquanto resinificamos essa tal “construção de carreira”. E torcemos muito para que a Geração Z (ou a letra que virá a seguir) consiga aprender com nossos erros e acertos para buscarem a experiência que for melhor para o contexto dela. E assim por diante.

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Anthony Ravoni

Consultor de Mídias Digitais & Crowdfunding com foco em projetos de impacto social e cultural. Já passou por Medicos Sem Fronteiras e @catarse