Necessidade de validação masculina na adolescência
Postas, nossas vidas estão, em detrimento das sensações. Idealizadas, expostas, vendidas. Mulheres, enquanto classe, sustentam diversas indústrias obrigadas — sejam elas a cinematográfica, a pornográfica, a têxtil, a da moda, ou da beleza. E, nesse sentido, não é à toa que a mão de obra feminina seja a mais desvalorizada em tantos mercados. Nossa exploração tem como base o sexo, e é gratuita e tão violenta quanto qualquer outro trabalho compulsório, especialmente porque se inicia junto ao nosso amadurecimento. Fica claro, pois, que a adolescência nos confere uma condição de extrema vulnerabilidade, porque nos encontramos ainda mais expostas à exploração, em todas as suas formas.
A busca por sentir-se vista, por reconhecimento público, validação externa ou por respeito, é interminável; e, pode ser intensificada pelo processo de “adultização”. Acelerar as fases de desenvolvimento natural das crianças não é mera consequência da priorização sistemática da produtividade, mas sim, um projeto político que visa atribuir responsabilidades “adultas” às crianças e jovens mulheres. O imaginário delas, desse modo, é manipulado para aceitem seu destino, como classe trabalhadora, explorada, sem que se questionem sobre a validade de certas hierarquias. Com efeito, na própria transição brusca da infância para a fase adulta se encontra o esvaziamento da ideia liberal de que a emancipação feminina é, de certa forma, alcançada com a sexualização — tendo em vista que se retira a possibilidade de formarem, completamente, seu senso crítico e razão de julgamento. Visando destruir qualquer estofo de racionalidade que tais indivíduos possam ter sobre a realidade que os cercam, evita-se esta fase do crescimento: a adolescência.
A necessidade de validação masculina e a hipersexualização na adolescência, nesse cenário, podem ser explicadas por diversos fatores. Em primeiro lugar, é importante destacar o papel fundamental que a influência midiática cumpre na adultização e sexualização de crianças e adolescentes. Destarte, pelo fato de a infância representar uma fase essencial para a formação de bases identitárias, é nela que se inicia o processo de condicionamento social. Ou seja, a socialização começa a imprimir nas meninas, sobretudo, valores comportamentais, por exemplo, que servirão de base para os papéis sociais, opressivos, que cumprirão quando adultas. Isso porque tal subordinação é um elemento fundamental para o funcionamento do patriarcado sob as lentes capitalistas. Nos são impostos, por meio dos limiares da marginalização, valores e ideais que ajudam na manutenção de nossas próprias violências.
Como sujeitos pertencentes ao século XXI, vivemos revoluções tecnológicas quase diariamente. E, por conta disso, é vital que reconheçamos como, temporalmente, nos tornamos cada vez mais dependentes de interações sociais, a um nível corrosivo à nossa estabilidade emocional e psicológica. Logo, urge atestar que carregamos conosco, involuntariamente, para o mundo virtual, problemáticas como a síndrome de Estocolmo social. Agora, criamos vínculos com nossos captores, também, “on-line”.
“Nós, mulheres, internalizamos a lógica dos abusadores de tal maneira que passamos a fazer o trabalho sujo para eles, garantindo a continuidade da subordinação de mulheres.” — Amar para sobreviver
Outrossim, é igualmente preciso apontar como o monopólio midiático, a partir de apelativas performances, pode reprimir ou estimular determinados comportamentos. O filósofo contemporâneo Zygmunt Bauman defendia que o papel atribuído ao sexo não foi acidental: “Das muitas tendências, inclinações e propensões “naturais” dos seres humanos, o desejo sexual foi e continua sendo a mais óbvia, indubitável e incontestavelmente social.”. Com essa abordagem, percebe-se como são impostas às mulheres, ainda na adolescência, a repressão de instintos tão naturais como o desejo. Logo, tais vontades, recalcadas, são expressas de outras formas, a medida que se consegue validação ou aprovação masculina de outras maneiras, que têm o sexo intrínseco a si.
A título de exemplo, pode-se citar mulheres gordas, e como as expectativas sociais de comportamento e imagem recaem sobre elas. Seu aliciamento para que naturalizem atos violentos contra elas mesmas só demonstra o quanto estamos sujeitas a validação masculina, em detrimento da marginalização social ou aceitação. Ser hipersexualizada na internet ou se submeter a uma dieta absurda para se encaixar em padrões estéticos determinados ultrapassa qualquer noção de livre arbítrio. Apesar do discurso globalizado de que tudo o que é pregado pelas indústrias da moda, beleza ou pornográfica é de adesão voluntária, é claro apenas aceitamo-nas por uma dependência de autoafirmação, instigada em nós estruturalmente.
A institucionalização e naturalização da pedofilia, também, como um dos reflexos mais agudos da hipersexualização de crianças e adolescentes, não só se dá por práticas “legalizadas”, ao redor do mundo, como o casamento infantil, mas, também, pelos papéis sociais que nos são atribuídos, enquanto mulheres — sendo esperado que nos conformemos com os padrões de feminilidade.
Aproveita-se da inexperiência de jovens mulheres para convencê-las de que o problema é individual. Portanto, precisam estar sempre buscando se provar mediante às expectativas sociais de perfeição inalcançável. À vista disso, para a libertação, deve-se ensinar mulheres a reconhecerem o condicionamento que sobre elas exerce constante pressão social, para que não se encontrem mais presas nesse ciclo de auto-violência compulsória, disfarçada de liberdade.
A consciência sobre a coletividade que nos cerca corrói, nessa perspectiva. Nada se pode fazer sozinha, mesmo que as intenções sejam revolucionárias — visto que até mesmo a sexualização de crianças, ou a busca irracional de adolescentes por aprovação, são tidas como indícios naturais de “rebeldia”, ditos típicos desse momento do desenvolvimento humano.