Djivina

Bia Bonduki
2 min readMar 20, 2020

Outro dia eu tive um sonho onde não só eu tentava golpear Thammy Miranda pré-transição com um canivete suíço de inúmeras funções, golpear pra matar mesmo, eu também descobria quatro tatuagens horrendas no meu braço.

Elas ficavam ali no muque, escondidas de mim mesma, por isso a surpresa. Em fonte manuscrita, uma dizia “Me Gusta Dulce” e a outra “I Like It”. Ou uma se transformava na outra, talvez, porque diz a lenda que não é possível ler em sonho. As outras duas eu não me lembro, mas eram frases, também.

Acordei aliviada de ter somente minhas cinco tatuagens de sempre, nenhuma cafonice presente… até que eu pensei na primeira tatuagem que fiz.

Lembro de num sábado ensolarado subir até um estabelecimento na Avenida Vergueiro, de nome Scorpion’s, e abrir a pasta de desenhos do artista. Tinha 20 anos e queria muito tatuar uma joaninha (don’t @ me), mas os modelos de joaninha-biscate, joaninha-de-Jah e joaninha-black-metal não me apeteceram. Então eu lembrei de uma ideia que tinha tido num banho da vida, uma coisa MADE IN BRASIL de Mariana Weickert porém mais FEITA POR DEUS, adicionado ao fato de eu gostar muito de uma música do Breeders, e foi aí que eu peguei um papel sulfite do tatuador e escrevi:

DIVINE

Ele falou “assim, em Arial 10?” e eu falei “manda brasa”. Depois disso minha amiga fez um piercing cascata e nós fomos passear num evento na Vila Madalena.

Eu estava orgulhosa do meu carimbinho, daquela minúscula bazófia que podia ser posta de lado com “é uma música que eu gosto, só”. Saibam, não era. Eu tava ali querendo me convencer de que era divina.

Essa tatuagem causou discórdia no lar (“tatuagem é coisa de MARGINAL”), comentários de rapazes iletrados (“divide?”) e até um jeito de eu me exibir para um recente ex, mostrando que finalmente eu seria cool do jeito que ele queria, porém não seria mais dele.

Volta e meia, meu ímpeto é de apagar, ou cobrir. Mas eu esqueço que essa tatuagem existe. Hoje ela é uma mancha esticada escondida pelo elástico das calcinhas de cintura alta que prefiro. Faz parte da minha vida, e faz parte do conjunto de escolhas, questionáveis ou não, mas minhas, que eu fiz aos 20 anos.

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