Vamos não nos encontrar

Bia Bonduki
4 min readDec 12, 2020

Descobri um novo podcast (posso resumir o ano de 2020 nessa frase), desta vez um que narra histórias de momentos de quase-tragédia. Chama-se Let's Not Meet, e é apresentado por Andrew Tate e convidados.

Eu já tentei interagir com podcasters, enviar minhas histórias, mas acontece que desde o momento em que botei os proverbiais pés nesta terra (sei lá, eu fui ficar em pé eu já tinha meses) meu destino foi escrito da seguinte forma: não ganharás concursos nem jogos de azar, e também jamais terá seu nome impulsionado à fama. Talvez eu faça um texto à parte explicando isso, outra hora. O que eu quero dizer é que vou contar uma história que daria perfeitamente para ser lida nesse podcast, porém evitarei o desgaste e o sentimento de rejeição não enviando esse caso à produção do mesmo. À história:

Era fim do ano, bem perto do Natal, e eu fui passar uns dias com minha mãe na cidade dela. Aproveitamos a minha presença para resolver coisas da nossa sociedade, tipo abrir uma conta PJ no banco. Passamos bem umas três horas conversando com o gerente e, ao saírmos, ficamos um tempo paradas na frente da agência decidindo o que fazer.

Enquanto minha mãe avisava que ia encontrar uma amiga, eu observei um rapaz muito feio caminhando do outro lado da rua. Pequeno, magrinho, roupas muito largas, cabelo raspado, nariz grande… mão na cabeça, nariz pra frente, olho vesgo e boca sem dente. Sim, ele parecia bastante o ET da dupla com Rodolfo. Eu peço perdão por meu raso referencial.

Ele, só que careca

Minha mãe e eu nos despedimos e fomos em direções opostas — eu, para casa. Mal tinha atravessado a rua, senti uma coisa estranha, alguém parecia estar me seguindo. E estava, o ET. Como eu tinha saído do banco, pensei na hora que ele talvez quisesse me assaltar, e depois de alguns segundos imitando o urso do Pica-Pau mentalmente, decidi entrar numa enorme loja de 1,99. Lá, ou ele seguiria reto, mostrando que era tudo um mal-entendido, ou eu confundiria ele e sairia sem que percebesse.

Meu cérebro no momento

De fato, ele estava atrás de mim. Eu andava pelos corredores em zigue-zague, ia do primeiro direto para o último, me enfiava no meio de senhorinhas testando vassouras de piaçava, e ele continuava na minha sombra. Decidi sair de lá e pensar em outra estratégia no caminho, ao que fui interrompida pela gerente da loja, que me puxou de lado falando baixo:

— Senhora, não é por nada não, mas sua saia tá rasgada. — Botei a mão nela e, de fato, o rasgo estava chegando no Oiapoque da minha bunda. Nesse mesmo momento, o ET passou por mim, me deu um tranco e murmurou alguma coisa. A gerente e eu nos encaramos como quem diz "olha que doido".

Já que ele tinha saído da loja, eu podia seguir em paz pra casa, certo? Errado. Não sei em que fenda do tempo-espaço ele se escondeu, mas quando eu saí da loja ele estava novamente atrás de mim. Perdi a calma e comecei a andar por entre os carros, uma mão na bunda tapando o rasgo da saia. Passei por uma viatura e pensei em gritar pedindo ajuda, porém, sei lá, só pensei. Até que meu cérebro deu um clique e eu percebi que seria ainda pior entrar no meu prédio, afinal eu ia perder tempo virando a chave na porta e ele podia me abordar. Fora que ele saberia onde eu morava. Então eu resolvi achar utilidade pra loja de trajes evangélicos que sempre existiu do outro lado da rua e entrei nela. Fui abordada por três irmãs e, antes que elas começassem a me oferecer o melhor dos looks varoa, fui logo anunciando.

— Desculpa, é que tem um cara me seguindo, eu moro aqui no prédio da frente e não queria que ele soubesse. Por favor, não vão na porta olh…

As três se empilharam na calçada pra ver quem era o cara, que desceu a rua. Esperei ele desaparecer no horizonte pra entrar em casa. Não comprei uma saia nova, mesmo dada a oportunidade.

Meses mais tarde, passei na loja de 1,99 para agradecer a gerente, que talvez tivesse percebido meu desespero e tentado me ajudar, mas ela já não trabalhava mais lá.

ET careca de Tatuí, let's not meet.

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