5S: Nós Estamos Fazendo Errado!

Bianca Sandes
11 min readMar 5, 2018

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Tradução livre de Artigo — 5S — We are doing it wrong Professor Associado da NTNU (Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia), Torbjørn Netland. Link: http://better-operations.com/wp-content/uploads/2015/10/2015-09-LMJ-5S-complete.pdf, feita por mim, Bianca Sandes.

Os Sensos do 5S. Atualizações recentes da metodologia incluíram mais 5 sensos, incluindo o da Responsabilidade Social. As vantagens da implantação do Sistema 5S são inúmeras. Para citar alguns exemplos: tornam o trabalho diário agradável, melhoramento das relações, a valorização do ser humano, o cumprimento dos procedimentos operacionais e administrativos, melhor qualidade, produtividade e segurança no trabalho.

5S — Nós estamos fazendo errado!

Cinco pequenas palavras japonesas começando com a letra S. A maioria dos empregados do setor industrial e, cada vez mais, do setor público, já escutou sobre o 5S.

O problema? A vasta maioria das empresas que tentou implementar o 5S falhou. E ainda falham. Muitos a confundem com um conceito de limpeza e arrumação, uma atividade chata, mas necessária para todos os negócios profissionais.

Os 5S são: Seiri, Seiton, Seiso, Seiketsu e Shitsuke. Feita de maneira correta o 5S cria um local de trabalho um bonito e efetivo.

Ele sustenta o controle visual, facilita a comunicação e auxilia no aperfeiçoamento contínuo. Os efeitos indiretos são: mais segurança, melhor qualidade do produto, redução no tempo despendido nas atividades, redução dos custos de operações, melhora da satisfação dos trabalhadores e, em geral, aumenta a produtividade. Mas, então, por que a maioria das empresas se bate com o 5S? Considere essa conversa:

- Seiri, seiton e seiso são importantes para manter a fábrica em ordem, certo?

- Sim, manter a fábrica na condição de praticar o seiketsu é essencial para a sua gestão.

Essa conversa aconteceu em 1965. A pessoa que perguntou era Shiego Shingo, e a que respondeu era Taiichi Ohno. O relato estava em um manuscrito que eu recebi do Sr. Kouichi Kimura, consultor em métodos japoneses de produção. Compartilhando a sua experiência de vida Kimura-san enviou-me um manuscrito de mais de 100 páginas — somente sobre o 5S. Em contraste, a descrição convencional do 5S utilizada pela indústria é um único slide de Power Point traduzido de maneira equivocada. É possível que aspectos importantes do 5S tenha se perdido na tradução?

O primeiro e o segundo S: Seiri e Seiton

Os primeiros dois S’s — seiri (整理) e seiton (整頓) pertencem um ao outro. O primeiro caractere em kanji(整), compartilhado por ambas as palavras é um símbolo de ordem. As duas letras em kanji subsequentes (理 e 頓) significam “lei, lógica e razão” e “familiarização, raíz, adequação” respectivamente, e modificam o significado do primeiro caractere. Aparentemente, os japoneses não diferenciam o seiri e o seiton no dia a dia. Um dos meus colegas japoneses me contou:

“No que diz respeito ao Seiri e Seiton, nos ensinam essas palavras desde o ensino fundamental. Essas palavras são quase sempre utilizadas juntas. As duas palavras estavam sempre a mostra na nossa sala de aula. Nós costumávamos deixar nossos livros e outros acessórios de escrita na nossa mesa. Nós éramos sempre mandados pelos nossos professores para manter eles em ordem. Os professores sempre nos mandavam “seiri-seiton”.

Seiri é usualmente traduzido por “arrumação”. É sobre arrumar uma área, decidir o que é necessário para o trabalho ser feito e o que não é. Seiton é usualmente traduzido como “colocar em ordem ” ou “endireitar”. Também inclui o sequenciamento e o etiquetamento visual dos arquivos. Um slogan intuitivo e usual é “um lugar para tudo e tudo no seu lugar”. Um importante objetivo do Seiton é reduzir a desnecessária atividade de procura de materiais, ferramentas e documentos. O principal significado do Seiri-Seiton é o de manter somente o que você em breve precisará perto de você, em um local ordenado e previamente designado. Essa organização do local de trabalho é o alicerce do 5S.

O conceito de arrumar e colocar em ordem não tem a sua origem no Japão. Os homens da caverna arrumavam comida e lenha há milhares de anos. Quando nós refletimos sobre, os dois primeiros S’s são, na verdade, senso comum. Três bons exemplos do quão excelente o seiri-seiton pode ser nas nossas vidas cotidianas são os cintos de ferramentas dos carpinteiros, a organização das cadeiras de dentista, e o “mise em place” (um termo francês referente a organização de ingredientes e utensílios para um rápido acesso). No trabalho cotidiano o processo de colocar os objetos de volta no lugar, depois de os ter usado é katazuke, que é traduzido por organizar.

Como fazer

Seiri e Seiton devem fazer parte da rotina diária, mas de tempos em tempos as empresas devem atualizar seus padrões devido a mudanças de condições. Isso implica em arrumar e fisicamente mover objetos, usando um etiquetamento padronizado. A Toyota organiza campanhas mensais de katazuke para o seiri-seiton. Outras empresas recomendam a realização de um grande evento katazuke a cada seis meses. É importante observar: os objetos que você precisa são mantidos e os que não, ou são guardados para uso posterior, ou são descartados.

Um Seiri adequado precisa de um padrão pré-estabelecido, que defina as regras do que é mantido, devolvido e descartado, respectivamente. O que é necessário em um local depende da frequência que aquilo é usado. O Seiri não é tão fácil quando muitos acham. Você deve manter os itens que você precisa no próximo mês, na próxima semana, no próximo dia ou na próxima hora? Qual a quantidade de cada item que deve ser mantida? Obviamente, depende da quantidade, da frequência (takt time) e das características do produto, mas, como regra geral, um horizonte de duas a quatro semanas é legítimo para decidir o que manter próximo. Além disso, o quão frequente um objeto é usado deve ser considerado para decidir qual a quantidade de cada objeto deve ser mantida. Objetos desnecessários em um local podem ser marcados com marcadores vermelhos e devolvidos ou descartados se não forem usados antes de certa data. Alternativamente, uma área de marcação vermelha pode ser feita.

Marcadores visuais, quadros de ferramentas e fitas coloridas podem delimitar as áreas e o número mínimo-máximo de objetos; o quê, onde e quantidade. Desse jeito fica imediatamente visível para todos se alguma coisa não está em seu local e de acordo com o padrão. Preste atenção na ergonomia e utilize o apoio da tecnologia caso preciso. Mantenha objetos usados juntos próximos um do outro. Utilize caixas padronizadas e deixe um espaço maior que o depósito para utilizá-lo de forma fácil e eficiente. Essas dicas simples vão te levar para próximo do seiri-seiton.

O terceiro e o quarto S: Seiso & Seiketsu

Os dois próximos S’s — Seiso (清掃) e Seikesu (清潔) — também compartilham o primeiro caractere que conota pureza, limpeza, frescor e é associado com a água. O último caractere kanji em Seiso, 掃, significa varrer. O segundo caractere kanji em Seiketsu, é um caractere muito positivo que descreve pureza, limpeza, sacralidade e/ou livre de poeira e de germes. Claramente ambos estão relacionados à limpeza. Seiso literalmente significa “limpeza” e Seiketsu é um termo geral que referente a “manter a limpeza” (assim como uma boa higiene) e é uma expressão muito comum no Japão.

Nas escolas japonesas é uma prática bem comum que os alunos tenham um período de limpeza, por exemplo: 30 minutos. Eles limpam não apenas suas próprias salas, mas áreas comuns, como corredores, toaletes, entradas, etc. Uma palavra mais comum para Seiso é Souji 掃除. É um dos costumes japoneses fundamentais. Um exemplo para ilustrar foi na Copa do Mundo de 2014 no Brasil. A mídia local reproduziu imagens dos fãs japoneses arrumando sua área e seus assentos depois dos jogos.

Repare que o Seiso não é apenas sobre esfregar e lavar. Ele ajuda a manter máquinas, equipamentos e documentos em um estado funcional, visual e de boa conservação. Isso porque “poeira atrai poeira” e “lixo estimula lixo” e a falta do Seiso, rapidamente, resulta em um ambiente de trabalho prejudicial.

Seiketsu é frequentemente traduzido como padronizar: o que significa manter um padrão. Isso pode resultar em interpretações equivocadas: Seiketsu não é a atividade de realizar os padrões do trabalho, mas a atividade de manter todos os outros 3 S’s. Seiketsu é a atividade perfeita depois que você arrumou, colocou em ordem e limpou. Em uma frase, significa criar e manter os padrões para o Seiri, o Seiton e o Seiso. Seiketsu é o alicerce da melhora, do bem-estar dos funcionários e da produção efetiva. Um dos meus colegas japoneses que mudou para a Europa há alguns anos, me providenciou um exemplo ilustrativo:

Na minha escola primária, as crianças raramente têm a oportunidade de limpar a área comum. Em vez disso, a escola contrata um zelador para limpeza e os pais fazem um grande evento de limpeza, duas vezes por ano. No Japão nós sempre pensamos que é melhor deixar as crianças limparem por elas mesmas para que elas possam utilizar as áreas com mais cuidado e respeito e encontrarem maneiras de melhorar o ambiente escolar. Ter e manter o Seiketsu é um objetivo da escola.

Como fazer

As atividades de limpeza do Seiso podem ser tipicamente feitas no fim de cada jornada de trabalho. Cinco a dez minutos são suficientes. A desvantagem óbvia é que essa rotina de limpeza frequentemente significa 10 minutos de perda da produção. Portanto, nós devemos nos esforçar para realizar a arrumação enquanto trabalhamos. Não limpar nunca é o equivalente de nunca escovar os dentes. É simplesmente uma má ideia. Repare que o Seiso também inclui outras atividades que ajudam a implementar uma “organização visual”, como a instalação de lâmpadas, a pintura das paredes em tons claros e a substituição de capas não transparentes por transparentes. Fazer a empresa mais bonita é importante também, mas não é o objetivo principal do Seiso.

O Seikesu pode ser alcançado aplicando uma combinação de ações de prevenção e de reação. Ações reativas incluem a prática de “Gemba walks” e a marcação de auditorias do 5S com o propósito de identificar espaços para o Seiri, Seiton e Seiso. Essas práticas são muito usuais, mas necessitam de uma rotina e de um compromisso sustentável da gerência para serem efetivos no longo prazo (isso é o porquê de nós precisarmos do 5º e último S). Auditorias semanais ou mensais são talvez as ferramentas mais usadas (e mal-usadas). Um risco óbvio é que privilegia a observância em relação a compreensão.

Exemplos de ações preventivas de Seiketsu são a instalação de ventiladores, filtros de ar, tapetes de entrada, tratamento do piso e por aí afora. As melhores ações preventivas são as que eliminam a causa de objetos desnecessários, desordem e sujeira completamente. Por exemplo, áreas em que a poeira entra na empresa podem ser seladas permanentemente. Obviamente, o Seiketsu não pode ser alcançado com campanhas únicas de katazuke, mas sim do kaizen (atividades constantes e continuadas de melhora).

O QUINTO S: SHITSUKE

O último S, Shitsuke 躾, é diferente dos primeiros 4S’s que Shingo e Ohno debateram na Toyota (4S). De acordo com os colegas japoneses, Shitsuke é uma palavra estranha para ser usada no contexto empresarial, porque é usualmente usada na criação de crianças e animais de estimação. Shitsuke pode ser traduzido como disciplina, educação ou seguir as regras. Shitsuke implica em um conjunto de regras que ensinam a alguém. O caractere em kanji 躾 pode ser divido em duas partes 身 e 美. 身 significa corpo e 美 significa beleza. Neste senso, Shitsuke é o processo de treinamento (mental) do corpo para se tornar bonito — o que se refere ao desenvolvimento de uma cultura organizacional saudável e disciplinada.

A tradução convencional do Shitsuke “sustentabilidade” pode ser mal interpretada. Shitsuke não é sobre sustentar os primeiros 4S por si (lembre-se que Seiketsu é o processo de sustentação do Seiri, Seiton e do Seiso), mas sim um processo fundamental de construção cultural que busca garantir que as pessoas vejam o propósito e estejam motivadas para desempenhar as regras do 4S. Ele abriga a disciplina auto motivada entre os membros da companhia. O Shitsuke deve se manifestar nas tarefas e nos hábitos, como, por exemplo, lavar as mãos, usar os equipamentos com segurança, usar roupas apropriadas, respeitar os horários de trabalho, priorizar a equipe antes de si mesmo, seguir corretamente os procedimentos padrões, e contribuir criativamente para melhorar os padrões. Apenas recentemente nós começamos a entender o poder do Shitsuke na literatura sobre produção.

COMO FAZER

É verdade que o Shitsuke parece paternalista — mas a intenção é boa. No sistema japonês, o operador é ensinado pelo chefe de equipe, o chefe de equipe pelo gerente de operações, o gerente de operações pelo gerente geral e por aí afora. Sensei, que significa professor não significa “faça o que eu te digo” ou “me fale o que fazer que eu faço”, mas sim um relacionamento de coaching (treinamento) que visa que alguém com experiência guie alguém sem. O papel do chefe de equipe é essencial para o sucesso do 5S. É o trabalho do chefe de equipe providenciar treinamentos regulares para seus funcionários. É dever dos funcionários implementar e sustentar os 4S por meio do Shitsuke.

Como nos outros 4S, existem métodos práticos que auxiliam a concretizar o processo do Shitsuke. O dia-a-dia e os treinamentos são atividades também. Outros incluindo cartazes informativos, reuniões diárias, boletim regular de notícias, reuniões, “gemba walks”, exibição de indicadores de performance, oferecimento de recompensas e reconhecimento e a realização de uma checklist para realizar os padrões. Mas nada disso trará o sucesso se o estilo da gerência for apenas “comandar e conquistar”.

Os gerentes devem liderar pelo exemplo para desenvolver a cultura correta. Não há nenhuma forma fácil de criar uma disciplina para a implementação da cultura do 5S. No dia-a-dia os gerentes devem ser visíveis, entusiasmados e apoiar seus subordinados. As equipes devem ser empoderadas com orçamento e tempo para as atividades do 5S. Todo mundo na organização deve ser treinado e desenvolvido. Um jeito efetivo de realizar isso é o sistema de “treinar o treinador”, no qual a responsabilidade do 5S se dissemina pela organização. Construir uma boa cultura do 5S leva anos.

CONCLUSÃO

O 5S é extremamente popular na indústria. É frequentemente celebrado como a primeira “ferramenta” para um jornada enxuta. Infelizmente, inúmeras empresas nunca vão além do primeiro S, e depois elas regressam para nenhum S. Como essa discussão sobre o 5S mostrou, o 5S não é uma ferramenta, mas sim um conceito completo que constrói um alicerce para todo e qualquer negócio professional. Introduzir os dois primeiros Ss, Seiri-Seiton, resulta em um local de trabalho ordenado, efetivo e lógico. Adicionando o terceiro S, Seiso, faz esse local de trabalho ser limpo, funcional e bonito. Esses três Ss são práticas de organização e criam um controle visual que é um resultado esperado para qualquer projeto de 5S. O quarto S é sobre sustentar todos os outros. E o último S, Shitsuke, diz respeito a construção de uma disciplina na organização sobre as ideias e padrões do 5S.

Vamos encarar isso, lembrar de 5 palavras japoneses (até lembrar, na sequência, de 5 palavras na sua própria língua nativa) é uma tarefa desafiadora. É muito melhor entender a ideia do conceito. Não forçar uma tradução do 5S com palavras iniciando em S, eu acredito que essa sugestão é a mais correta.

Percepções individuais do 5S diferem amplamente. Frequentemente é percebida como uma simples tarefa de organizar e arrumar. Esses são realmente elementos essenciais do Seiton e Seiso, mas não capturam a ideia original do 5S de Ohno e Shingo. Nós não podemos acusar fortemente ninguém por ter uma ideia limitada do 5S. Primeiramente, há diferentes traduções do conceito — algumas mais corretas que outras. Até livros best-sellers sobre o tema entendem o 5S de maneira equivocada, frequentemente interpretando erroneamente o Seiketsu e o Shitsuke. O 5S não é um conceito intuitivo. O Seiketsu é integralizado pelo Seiri, Seiton e Seiso e o Shitsuke é integralizado pelo Seiketsu e uma característica em nível superior da cultura organizacional. Em virtude das companhias normalmente não entenderem o Shitsuke, os outros S não podem ser mantidos. Isso leva a um ciclo de recomeços e projetos inacabados do 5S. Por fim, o 5S por si só tem um custo direto, os benefícios são enormes, mas difíceis de serem medidos (financeiramente).

Essa é a minha conclusão: tente não fazer o 5+5S um objetivo em si mesmo. É provavelmente uma boa ideia nunca o introduzir ou re-introduzir como uma ferramenta para sua companhia. Foque, em vez disso, na parte da liderança, na construção de uma disciplina e em uma cultura correta na sua organização sobre os objetivos do 5S: Criar, manter, e melhorar uma organização eficiente com altos níveis de controle visual.

Boa sorte na aplicação correta do 5S!

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Bianca Sandes

Advogada desassossegada, eterna estudante, resiliente e confiante no poder da ação comunicativa e do diálogo.