CRÍTICA: Relatos de uma rapariga nada púdica, por Julia Morais
“Quando eu era pequena, tinha o hábito de dormir com a mão dentro da cueca. Todos os dias, a meio da noite acordava com gritos de repressão de quem de mim cuidava, acabando por ficar de castigo.”
Assim tem início a confissão da rapariga nada púdica, um relato íntimo que nos aproxima de nós mesmas e umas das outras.
Repressão é a palavra-chave na infância e adolescência de muitas de nós, mulheres pretas. Corpos cerceados, identidades negadas, sexualidade desconsideradas — principalmente quando se é lésbica. O que Lolo Arziki faz é trazer à tona lembranças e sentimentos da tenra idade, associando com a construção de sua -nossa- identidade enquanto mulher preta, lésbica, cabo-verdiana e consciente do que todos esses lugares implicam.
Reconheci-me nela, a nada púdica que facilmente coloca-nos em seu lugar de (des)conforto. O mexer das mãos é agonia, pura agonia de pertencer a um corpo-lugar não apreciado, não desejado, não amado. Incomoda!!!
Lolo nos carrega até um lugar confessional, particular e universal, onde sentamos juntas, questionamos afetos e nos amamos.
Ouça a entrevista que a cineasta Lolo Arziki deu para a rádio Afrolis, de Lisboa: https://radioafrolis.com/2016/10/19/audio-127-sobre-relatos-de-uma-rapariga-nada-pudica/