Por que representatividade não é mimimi

Caio Costa
4 min readMay 11, 2018

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Depois do fortalecimento das mídias sociais, muitos de nós ficamos relativamente confortáveis com o que lemos e assistimos. Afinal, o Facebook é craque em mostrar o que você gosta e te fazer ignorar muita coisa que não faz parte da sua realidade. Mas a bolha não é perfeita e, de vez em quando, você encontra algo desconhecido e te faz rejeitar a ideia de saber mais sobre. É bem provável que essa atitude seja a semente para o nascimento do “mimimi”.

Já percebeu como o termo é usado por quem não tem experiência sobre o fato que criticou? É muito comum ler comentários de homens (em alguns casos, mulheres também), que não se dão ao trabalho de entender o feminismo, definindo o movimento como mimimi. Geralmente são pessoas contrárias aos movimentos LGBT e têm preconceito racial, mas tentam minimizá-lo dizendo publicamente que “até tem amigos que são gays/lésbicas e negros”.

Vou usar um exemplo, entre tantos, para ilustrar como existem pessoas que gostam de questionar quando projetos são protagonizados por minorias. Trata-se do fenômeno This Is America lançado por Childish Gambino, nome artístico de Donald Glover, criador de Atlanta, série que faço questão de recomendar para todo mundo, inclusive você que está lendo este texto (a primeira temporada está disponível na Netflix). O clipe atingiu 10 milhões de views no YouTube nas primeiras 24 horas e foi notícia em várias sites e blogs.

Além da parceria com Hiro Murai na direção, outro ponto em comum entre a série e o clipe é a habilidade de Glover ao mostrar a condição do negro na sociedade, como temos que nos esforçar muito mais no mundo para conseguir o mínimo de respeito. De como até mesmo o artista, uma das estrelas do novo filme da franquia Star Wars, não está imune em sofrer preconceitos e insultos quando terminar de entreter com sua arte, quando estiver longe dos holofotes, simplesmente ser negro. O post do Buzzfeed expõe outros detalhes da crítica foda contida no clipe.

Frame de This Is America

Enquanto o clipe era celebrado por muitos, logicamente algumas pessoas no Twitter perguntaram na timeline onde estava a genialidade do clipe que todo mundo estava falando, outros não achando tudo isso. O motivo já estava no avatar: pessoas brancas que nunca precisaram passar pelo que foi mostrado em This Is America. E a probabilidade de dizer é a mesma sobre Atlanta, caso acompanhassem, seria a mesma.

Um dos maiores problemas para a falta de representatividade concentra-se na mídia, tanto televisiva quanto publicitária. Um dos casos recentes que deixou isso mais evidente do que nunca é a polêmica sobre o elenco de Segundo Sol, a nova novela da Globo.

O trio protagonista de Segundo Sol, novela ambientada na Bahia

Como lembra esta matéria, na Bahia 76% dos habitantes são pretos, segundo dados do IBGE de 2013 e novela optou, mais uma vez, por um elenco com maioria branca. A emissora declarou que escala o elenco apenas por competência técnica e não pela cor da pele, mas curiosamente parece que não encontraram problemas para escalação de negros para a sua série Carcereiros.

Sem falar que, até hoje, vilões e papéis de empregada, porteiro, motorista e por aí vai são dedicados quase sempre para negros. Será que não existem brancos também nessas funções?

Na publicidade o preconceito é reforçado através de estereótipos, que está sendo desconstruindo aos poucos. Mesmo assim, nos EUA uma pesquisa revelou onde mascotes das marcas, em sua maioria, são representados por homens e, quando formatos femininos são criados, o clichê de representações femininas dominam. No Brasil não deve ser diferente.

No episódio do meu podcast sobre As mulheres no mercado publicitário, eu debati com minhas convidadas como nas agências publicitárias a criação ainda é quase toda ocupada por homens brancos que adoravam transferir as piadas machistas para as campanhas. E este fato foi exposto nos comentários postados na pesquisa Como é trabalhar aí 2.0.

O filme Eu não sou um homem fácil, na Netflix, praticamente desenha para quem gosta de falar em mimimi para o feminismo a visão que a sociedade possui sobre as mulheres.

Um dos passos para desconstruir décadas de preconceitos que absorvemos na sociedade é praticar a empatia. Desta forma, você pode se colocar no lugar do outro e imaginar como mulheres, gays, transexuais, lésbicas, negros, índios, asiáticos e outras pessoas passam, mas nunca será suficiente por que você nunca passou por tudo o que eles passaram. Mas é um bom passo a ser dado rumo à aposentadoria do mimimi no seu vocabulário.

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Caio Costa

Produtor de conteúdo que fala sobre publicidade, marketing digital e mídias sociais. Gerente do Social Media Bahia e palestrante.