Duna Capítulo 5: O Traidor

Bruno Birth
brunobirth
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5 min readJun 29, 2020

“Yueh (ju’i), Wellington (‘welinten), 10082–10191 Pdr.; doutor em medicina pela Escola Suk (formado em 10112 Pdr.); casado com Wanna Marcus, B. G. (10092–10186?Pdr.); conhecido principalmente como traidor do duque Leto Atreides. (Cf. Bibliografia, Apêndice VII [Condicionamento Imperial] e Traição, A.)”

O artigo a seguir se baseia nas reflexões minhas e de meus amigos Jonathan Thiago, Marcos Carvalho e Marcos Mariano. CONTÉM SPOILERS DO LIVRO UM.

Wellington Yueh nos é apresentado no capítulo 5. O médico da família Atreides, que já havia sido citado pelo barão Harkonnen como parte crucial de seu plano para destruir os Atreides, surge de modo sorrateiro, “pisando em ovos”, com uma atitude própria de indivíduos que carregam culpa, para conversar com Paul sobre mais aspectos do futuro da família em Arrakis.
A descrição da personagem nos mostra uma tatuagem na testa, característica do Condicionamento Imperial. Em análises anteriores havíamos tentado achar uma conexão entre o Condicionamento Imperial e os ensinamentos que lady Jessica havia passado a Paul; ensinamentos esses voltados à obtenção de uma vida mais racional e aquém do modo destrutivo dos humanos do passado. A interpretação permanece porém com leves alterações pois, conforme avançamos na narrativa, fica claro que as diferentes classes do mundo futurista de Duna (as Bene Gesserit, os Mentat, o Condicionamento Imperial) possuem suas próprias interpretações do que é o conhecimento, a ciência nesse novo mundo (algo muito comum quando se pensa em vastidão de conjuntos sociais, não é mesmo?), o que gera diferenças dentro de conceituações que podem ter nascido do mesmo propósito. Mas é claro que teremos mais detalhes sobre a profundidade dessas classes conforme avançarmos no livro.

Outra coisa interessante trazida por Yueh e que de certa forma confronta nossas ideias anteriores é quando ele cita que o planeta Arrakis “aceitou de braços abertos certas formas de vida da Terra”. A suspeita de que Arrakis pode ser uma versão futura e devastada da nossa Terra ainda permanece mas a fala de Yueh abre outra possibilidade: a da colonização espacial. Arrakis (assim como todos os outros planetas do império) podem situar-se em outro sistema solar longínquo, o que levanta vários questionamentos como “por que teriam sido levadas formas de vida da Terra para Arrakis?”, “é da nossa Terra que Yueh fala?”, “e quando Yueh fala ‘formas de vida’, de que tipos de formas de vida terráqueas ele está falando?”.
Ponto muito interessante nessa parte é quando os vermes de Arrakis são citados. Os considerados pequenos possuem 110m de comprimento e 22m de diâmetro. Que absurdo! Como vemos mais à frente, a especiaria de Arrakis, o mélange, é super valioso e possui características únicas, uma delas dá ao mélange o adjetivo “geriátrica”, fazendo com que a especiaria possa estar relacionada à retardo do envelhecimento, além da já explanada mutação, que altera a cor dos olhos do mentat e que aumenta a força dos que a consomem, como o mentat do barão Harkonnen já havia mencionado quando disse que “as máquinas do passado não lhe seriam páreo em combate”. Com características de modificação genética tão únicas, pode ser que os vermes de Arrakis sejam tão absurdos quanto parecem por conta do consumo da especiaria, proveniente das profundezas do planeta Arrakis.
Ainda nas explicações sobre Arrakis, Yueh cita os fremen, os graben e os pias. Nas palavras do médico, os grupos são divisões genéricas da população (nativa?) de Arrakis e entre eles ocorre alguma miscigenação, embora mergulhada em tabus sociais:

“As mulheres das vilas nas pias e caldeiras preferem maridos fremen; seus homens preferem esposas fremen.”

Até então suspeitávamos que os fremen poderiam ser humanos mas os graben e pias fossem de outra raça alienígena humanoide, bem como os Harkonnen. Contudo, as afirmações de Yueh mostram variações raciais dentro da própria espécie humana dos fremen, diferente dos Harkonnen, que possuem descrição diferenciada no capítulo 2, denunciando mais claramente sua forma humanoide alienígena.
É claro que ainda não há certeza se os fremen são realmente humanos. Me baseio na conversa de Paul com Hawat, que diz que os fremen são como eles, para afirmar que os fremen são humanos. Contudo é preciso aguardar cenas dos próximos capítulos.
OBS: mais uma vez trazendo a especiaria mélange à tona, não seria talvez o consumo dela que faz os fremen terem sua genética, de certa forma, alterada e assim suportarem o ambiente hostil de Arrakis? Fica a dúvida.

Eis uma parte essencial do capítulo. Wellington Yueh entrega a Paul Atreides uma cópia da bíblia católica de Orange. Como já mencionamos anteriormente, esse objeto é um elo entre o nosso mundo e o mundo futurista de Duna, e aqui temos mais detalhes sobre essa bíblia, assim como mais perguntas acerca de Yueh. O traidor pede segredo ao garoto quando entrega o presente, por medo de reprimenda de Jessica e Leto, e diz que o livro é muito valioso. Seria essa bíblia um livro apócrifo nesse mundo futurista? E qual a intenção de Yueh ao dar esse livro ao candidato a Kwisatz Haderach? O messias de Duna? Que tipo de ensinamento é interessante a Yueh que Paul absorva? Ao que parece, Yueh é um traidor forçado, que não age contra os Atreides de modo convicto, assim, o ato de dar esse presente a Paul pode significar algum tipo de desencargo de consciência que ainda nos é desconhecido.
Notório o momento em que Yueh pede que Paul leia uma versículo da bíblia católica de Orange e nós, leitores, não vemos qualquer identificação com a bíblia que nós conhecemos. Em 2 mil anos de história a bíblia cristã passou por diversas traduções e adaptações para “atrelar-se” aos interesses sociais, transitórios de tempos em tempos. Isso nos faz questionar se a bíblia católica de Orange talvez não seja a mesma bíblia que conhecemos hoje, só que com mais 8 mil anos de “atualizações” e “retraduções” condizentes com as estruturas sociais do mundo futurista de Duna.

Por fim, temos o desabafo final e solitário do dr. Yueh, claramente forçado a ser instrumento do engodo dos Harkonnen contra os Atreides. Aqui deixo um questionamento: Estaria a esposa de Yueh, Wanna, realmente morta, como ele cita a Paul, de modo muito relutante? Ou seria Wanna o objeto de chantagem que os Harkonnen utilizam para quebrar o Condicionamento Imperial de Yueh, obrigando-o a fazer suas vontades? Achei curioso que a data do falecimento de Wanna, trazida por mais um excerto da princesa Irulan no começo do capítulo, carrega uma interrogação, uma incerteza que só descobriremos no futuro.

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Bruno Birth
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