Morte no metrô e como contribuímos com a LGBTFobia.

Bruno Ribeiro
4 min readDec 31, 2016

--

Hoje é quarta feira, 28/12/2016, passeando pela web e suas redes sociais é possível perceber o choque e a revolta diante de um crime que acontecera na última noite de natal e também último domingo. Um vendedor ambulante de nome Luís Carlos Ruas, conhecido como “Índio”, foi espancado até a morte por dois homens dentro da estação de Metrô Dom Pedro II em São Paulo. Segundo o site de notícias G1, o assassinato aconteceu após Índio ter defendido uma Travesti que estava sendo perseguida pelos dois indivíduos em questão, ela conseguiu fugir, mas o ambulante acabou sendo brutalmente morto.

O crime exposto e alguns outros que começaram a ser lembrados na internet após o caso, confirmam o que já era óbvio, a LGBTFobia mata não só pessoas LGBT’s como outras pessoas que não se enquadram na sigla. Olhando a comoção gerada pelo acontecido, vejo pessoas que conheço, amigos e colegas preconceituosos se indignando de tal maneira que nem parecem ser as mesmas pessoas que fazem piadinhas com gênero de outras ou que afirmam não aceitar ter filhos ou parentes gays e etc. Diante disso penso como nós, e digo nós como sociedade, temos culpa no crime hediondo ocorrido neste último fim de semana?

As respostas são claras, eu tenho culpa quando não assumo ser machista e preconceituoso com as pessoas LGBT’s mesmo que eu esteja em desconstrução ou não tenha esta intenção.

E você aí do outro lado da tela que é pai? Você tem responsabilidades neste crime quando faz piadas homofóbicas na frente do seu filho com os seus amigos. Sabe aquelas que geralmente contêm as palavras “viado”, “bixa” e suas derivações. Pois é, além não ser engraçado ensina seu filho a fazer o mesmo com coleguinhas na escola, por exemplo, e contribui para que crimes de ódio a pessoas LGBT’s aconteçam.

E o que dizer de você motorista, que acha “mó da hora” passar de carro e gritar “Traveco”, fazer piadas e até jogar objetos para “zuar”? Porque a seu ver é legal fazer isso com travestis ou transexuais que circulam nos espaços públicos. É por comportamentos assim que pessoas trans são brutalmente assassinadas todos os dias no Brasil, estas não tiveram a sorte de ter um herói de apelido “Índio” para salva-las da selvageria da violência causada pelo seu preconceito.

Oi tio? É você tio! Tu que acha divertido incentivar seu sobrinho a “passar o peru nelas”. Cara, é assim que teu sobrinho vai aprender a não respeitar as mulheres (e quando falo mulheres incluo travestis e transexuais que assim se reconheçam) e quando não houver a oportunidade de desrespeitar uma mulher, vai servir qualquer outro a sua volta, como vimos neste caso do Metrô.

E você amiga, que sai por aí falando que “gay não é coisa de Deus”, “o certo é um homem e uma mulher porque a natureza é assim” e outras barbaridades, mesmo quando ninguém pediu a sua opinião. Nos seus discursos faltam consciência e empatia, estes que você grita tanto ter desde domingo passado, mas ao repercutir estes pensamentos reforça e legitima atitudes como as que tiveram os dois assassinos de Luiz Carlos Ruas.

Negar as atitudes acima e tantas outras que não cabem no texto, não vai mudar o fatos, não muda os números de transexuais e travestis mortos no Brasil (que por falar nisso, é o país que mais mata a população trans no mundo). Este ambulante foi vítima no lugar de uma travesti que estaria morta agora e seria só mais uma das que foram espancadas até a morte, porque outras foram estupradas, empaladas, queimadas, degoladas e afins. Sim, os crimes contra o público LGBT são requintados de crueldades, para se deparar com casos assim é só acessar o site do Grupo Gay da Bahia — GGB, lá todos os dias é possível encontrar relatos de violação dos direitos e da vida dessas pessoas.

A vida de todos tem valor, a vida de todos importa ou deveria importar. Mas afirmo que se essa travesti tivesse sido morta pelos dois indivíduos na estação de Metrô a mídia não teria repercutido o fato da mesma maneira, a comoção não seria tão grande ou talvez nem existisse. Aquele ambulante naquele dia nos deu a oportunidade de enxergar o quanto estamos sendo hipócritas, o quando estamos contribuindo por uma sociedade cada vez mais violenta com as diferenças do próximo, o quanto precisamos discutir nossas posturas e nossos valores individualmente e socialmente, e o quanto ainda somos intolerantes, preconceituosos, machistas e não admitimos enxergar isso.

Espero que não fiquemos só na comoção, mas nos atentemos as entrelinhas desta tragédia, para se questionarmos, para debatermos em busca da construção de uma sociedade mais consciente, respeitosa e igualitária com diversidade em todos os sentidos.

Fica aqui o meu agradecimento ao senhor Luís Carlos Ruas, por ter salvado uma pessoa da morte e por proporcionar estas reflexões em nós. Que em 2017 tenhamos mais humanidade para com as pessoas LGBT’s e todos.

Links sobre assunto:

http://www.ggb.org.br/

https://homofobiamata.wordpress.com/

http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-11/com-600-mortes-em-seis-anos-brasil-e-o-que-mais-mata-travestis-e

--

--

Bruno Ribeiro

Macumbeiro, Economista e Técnico em Políticas Públicas. Apaixonado por política e cinéfilo.