ELUCIDAÇÕES

Mensagem de Allan Kardec, por Zilda Gama, “Diario dos Invisiveis”, 1929

Caliban Kalitz
37 min readAug 12, 2023

20 — V — 1913.

Ao medium Zilda Gama

CAPITULO I

Summario: A genese da humanidade na Terra. As differentes raças e linguas. Os Espiritos, ou as scentelhas divinas.

Leste, finalmente, os capitulos da A Genese (*) — relativos ao apparecimento do homem primitivo neste orbe, em desaccordo com a Biblia, e eu desejo fazer algumas revelações sobre esse magno assumpto, de grande interesse para os que almejam investigar o passado obscuro de nossos ancestraes, ou de nós mesmos. Até a actualidade os geologos, os philosophos, os naturalistas, ainda se debatem em um cháos de perplexidades, relativamente á origem, neste planeta, do ser intelligente, racional, de organismo mais perfeito que o das outras ordens zoologicas — o denominado Primata hominio — cuja procedencia, como a de todos os animaes, ficou sempre envolta em sombras caliginosas, offuscada pelo mysterio, quasi insondavel, de muitos millenios transcorridos, immersa em varias hypotheses, todas ventiladas com alguma convicção, mas logo regeitadas como illogicas ou incoherentes. Venho, hoje, esclarecido por excelsos Instructores do Espaço — cuja existencia é anterior á formação do globo terraqueo — trazer o meu pequenino contingente para as Sciencias naturaes, accrescentando algumas allegações ás que já explanei, quando elaborei o livro que estás lendo, coadjuvado mediumnicamente por emisarios sideraes, que se esforçam pelo progresso intellectual do genero humano, auxiliando efficazmente todos os que se preoccupam com os grandes problemas universaes, afim de lhes serem dadas soluções satisfactorias.
(*) Allan Kardec — “A Genese”.

Quanto á origem da Terra mantenho o que escrevi. Reporto-me agora, especialmente á procedencia do ser pensante, responsavel por seus actos, o qual, por suas faculdades mentaes desenvolvidas, sobrepuja todas as especies zoologicas, da qual se fez, incontestavelmente, rei e potentado — o Homem.

Façamos, primeiramente, uma rapida peregrinação retrospectiva a uma das épocas mencionadas pelas sacras Escripturas — aquella em que vivem o patriarcha Noé. Assevera a Biblia que o diluvio, assistido por aquelle justo varão, foi universal, e descreve esse phenomeno meteorologico com negras cores, dando margem á crença de ter sido este planeta despovoado completamente, sobrevivendo apenas á pavorosa hecatombe Noé, seus descendentes e, affins e os casaes de todas as ordens zoologicas que foram abrigados na Arca. Isso, porém, está em antagonismo com a realidade, pois as regiões que, seculos depois, foram desvendadas pelos mais audaciosos nautas de antanho, estavam habitadas por outras raças, quer humanas quer de irracionaes, desconhecidas dos europeus — as americanas e australianas, das quaes se achavam separados por mares ainda inexplorados.

Hoje se pode affirmar o inverso da Biblia: houve um diluvio, mas parcial, que damnificou apenas grande extensão da Asia Menor, não attingindo as outras regiões do globo terrestre.

A especie humana já era, em uma fracção do Antigo Continente, qual se mostra, presentemente, quanto ao physico, apenas inferior quanto ao intellecto, ainda inculto, pois se achava na infancia espiritual.

Já existiam diversas raças, falando differentes idiomas, sem a fusão que, só mais tarde, se deu com alguns delles, formando outros — os dos nossos contemporaneos, oriundos do latim, grego e arabe, — desconhecidos na antiguidade. A época anterior ao alludido diluvio é ainda mais obscura para o exegeta, porque as Escripturas são defficientes a respeito dos povos pre-historicos, e nenhum alfarrabio, menciona, com clareza, o apparecimento da humanidade neste planeta.

Os Livros Sacros relatam a genese, não só da Terra como de todo o Universo, em uma semana, o que, hoje, está scientificamente averiguado não ser a expressão da verdade, pois todos os astros e planetas do Macrocosmo não têm a mesma edade: ha seculos medeiando a elaboração de uns e outros, e, actualmente sabemos que os cometas e as nebulosas — que as ha em numero infinito pelo Espaço — são mundos em formação.

Mostram-se, pois, as revelações de Moyses, para o analysta criterioso, contradictorias, com a realidade, e extremamente confusas, pois affirmando ser o genero humano proveniente de um só casal, constatam o assassinio de Abel pelo zeloso Caim — unicos filhos de Adão e Eva, até então e, logo após, narram a fuga do fratricida para a extrema do Oriente, onde edificou uma cidade com o nome derivado do de seu primogenito — Henochia… (*) É logico, pois, que, além dos pre-genitores de Caim ja existissem muitos povos semi-civilizados, ulteriores ao troglodyta, — que desconhecia qualquer industria e vivia nas cavernas, — em numero sufficiente para a fundação e povoamento de uma cidade. De accordo com a Biblia deduziremos que Caim já era consorciado na occasião do homicidio de Abel, pois possuia um primogenito, e, por motivos que o bom senso aconselha, eu deixo de fazer commentarios que occorrem a qualquer observador criterioso, sobre esse debatido thema, porque o meu objectivo é outro — prende-se exclusivamente á origem dos seres biologicos deste planeta.
(*) H. Universal do Duroy.

CAPITULO II

Tendo demonstrado que a Biblia é contestavel, faço, agora, algumas arguições ás quaes me proponho dar resposta, de accordo com a Cosmogonia sideral, cujo conhecimento não é vedado aos que são norteados pelos luminares do Espaço:

I — Como surgiram em todos os Continentes, nas regiões insulares e polares, os primitivos habitantes, racionaes e irracionaes?

II — São contemporaneos dos povos do hemispherio Oriental os americanos e os incolas da Oceania — desconhecidos completamente por Moysés, quando psychographou a Genesis?

III — Por que, se a humanidade descende de um só casal, acha-se dividida em varias raças, dessemelhantes umas das outras, falando cada uma dellas idiomas especiaes?

Eis o que desejo elucidar. Chegamos, pois, ao ponto capital do assumpto que tanto te preoccupa, e aqui explano o veredictum obtido por mim e que não deve ser indifferente aos pesquizadores dos enigmas mundiaes:

O genero humano surgiu, ao mesmo tempo, não só nos Continentes, povoando-os em varios pontos, afastados uns dos outros, como tambem nas ilhas esparsas pelos Oceanos, pois quasi todas, ao serem conquistadas pelos europeus, já eram habitadas, não estando no dominio de nenhum povo o relato do inicio da navegação no Pacifico e no Atlantico, do lado occidental, — temidos e intransponiveis para os marujos de antanho, que não conheciam senão empyricos rudimentos de nautica, — e, no entanto, desde épocas immemoriaes, possuem raças distinctas das dos continentaes, quer no physico e na cor, quer na dialectica e nos costumes.

São, pois, todas as tribus humanas provenientes de um so casal?

Absolutamente, não.

Está, pois, em antithese á Biblia, a minha primeira resposta. Vou, agora, esclarecer-te o que jaz, até hoje, em compacta obscuridade — a origem do homem primitivo neste orbe. Elaborada a Terra, esta ainda passou por muitas phases, representadas cada uma dellas por longos periodos seculares. Foi extincta a photosphera incandescente que a circumda, proveniente dos metaes e de outros corpos inorganicos em ignição, ou antes, da materia cosmica ainda em expansão prodigiosa (*).
(*) A Terra é um planeta resfriado, um sol extincto — Laplace

Localisaram-se em seus alveos os rios e os Oceanos que, até então, se achavam cohesos uns com os outros; seleccionaram-se intelligentemente os elementos constitutivos do globo terrestre que estiveram em promiscuidade. Deu-se o transbordamento das aguas fluviaes e maritimas, qual se Deus as houvesse creado em demasia, e foi esse, realmente, o diluvio universal que houve neste planeta em formação, transformado superficialmente numa esphera liquida, que continha, até á éra a que me reporto, somente um dos tres reinos da Natureza — o mineral. (*)
(*) “A Terra era coberta de agua”. Choyer.

Invadiram-n’a, por muito tempo, os mares e os rios. animados de movimentos espantosos, formando impetuosas torrentes, fluxos e refluxos extraordinarios. como um coração pulsando desordenado, depois de terem sido decepadas todas as veias e arterias de um organismo colossal, concentrando-se nelle ondas de sangue, ainda agitado por systoles e diastoles violentas… (*).
(*) Nota do medium. Alexia Carrel, em Nova York, no Instituto Rockefeller, apresentou ás summidades scientificas um coração de passaro, que ja estava vivendo havia 8 annos, palpitando dentro de um vaso de crystal, contendo uma composição chimica antiseptica que o allinenta e avigora.

Confundiram-se, em uma só massa liquida, todos os actuaes rios, Oceanos, lagos e regatos, que, só volvido muito tempo, se desligaram.

O Caspio e o Aral — isolados dos outros mares, — são fragmentos do grande Oceano primordial.

As procellas eram incessantes. Assombrosos phenomenos meteorologicos — desconhecidos pelos scientistas e astronomos de todas as éras, os quaes fariam enlouquecer os que os presenceassem, — deram-se, aqui, outr’ora, mas cessaram por fim.

A atmosphera, muito densa, separou se das aguas, que descresceram, surgindo-lhes á tona as ilhas e os Continentes como immensos coagulos de terra, ou titanicos esqueletos completamente dissecados, mas saturados de intensa humidade.

Estava este planeta, — esteril até então, mas em preparo para receber a vida em seu amago, — em um de seus ultimos periodos de elaboração, pois teve outros, mesmo depois que nelle germinaram os seres biologicos, o que fica demonstrado pelas differentes camadas que formam a crosta terrestre, contendo fosseis de animaes e plantas, que são especimens inestimaveis para os estudos paleontologicos.

Subitamente a esphera terraquea ficou envolta, em grande extensão, por compacto nevoeiro, descido do Espaço, no qual se alliou como por encanto o ambiente que a rodeava.

Não era mais a agua que inundava o solo, mas este, bem como todos os liquidos nelle existentes, que se ligaram a uma atmosphera sui generis, ou antes, a um oceano fluidico que o circumdou, saturando-o até ás maiores profundidades. Era este nevoeiro a materia cosmica ou organica, etherisada, em diffusão, contendo todos os elementos imprescendiveis á existencia, ou á genese de todos os seres vivos, a substancia primordial de que se formaram os dois reinos da Natureza — animal e o vegetal — que lhe faltavam, a qual envolve copiosamente os mundos em formação, e, quando já são habitados, torna-se rarefeita. Essa nebulosidade — semelhante á que constitue a cauda dos cometas, que são mundos em gestação, — não era mais que a materia em um de seus estados, o gazoso, apta para ser condensada e engendrar todos os organismos conhecidos de Fauna e da Flora terrestre.

Ella poz em contacto directo este orbe não só com o Espaço — que contem os germens de todos os seres organicos e inorganicos em diffusão, — como com outros mundos já habitados e em plena vitalidade (qual um cyclone marinho liga as ondas ás nuvens), trazendo, com espantosa profusão, germens vegetaes etherisados, que, como impetuosos torvellinhos, se dispersam por toda a crosta terrestre e por todas as massas liquidas.

Subitamente as moleculas dispersas ficaram cohesas — qual a bruma que se transforma em flocos de neve, — os germens foram reconstituidos, cahiram sobre o solo e nas aguas, ferteis em elementos vivificadores, proliferaram prodigiosamente, dando origem ás cyclopicas florestas primitivas de que restam especimens fosseis nas lycopodiaceas, nas sigillarias, nas calamites, etc.

Era mister, porém, que, depois de medradas as plantas — que cobriram quasi todas as regiões terrestres — surgissem todas as especies zoologicas, e, logo após, os Primatas hominios. A terra, até então, era um extenso laboratorio de vidas, tendo a envolvel-a, como já me expressei, espessos fluidos, contendo todos os elementos vitalisantes, — a materia de que se formam todos os tecidos organicos, tambem denominada effluvios odicos — faltando-lhe apenas, este propulsor, o dynamo para com elles serem elaborados os corpos dos racionaes e irracionaes — a Alma — que, sob o influxo divino, emigrou de diversos planetas, com o sеu mediador, plastico, ou perispirito, Este, o corpo ethereo, como não o ignoram os psychistas, é a estatua integral de todas as creaturas, possuindo, intangiveis, todos os membros e todas as visceras que constituem o organismo animal, com uma precisão anatomica admiravel, e, uma vez em contacto com a substancia já descripta, que a elle se adheria facilmente, solidificava-se, dando origem ás plasticas mais variadas de todos os seres zoologicos, com uma diversidade de formas só concebivel pelo Creador do Universo.

Não ignoras que a materia é uma e sempre a mesma na Natureza, — seja solida, liquida ou gazosa, — dependendo apenas da cohesão e diffusão, ou movimento vibratorio de suas moleculas, os seus diversos estados, que se revesam constantemente. Ora, nas épocas alludidas — como ainda o é agora, — a Terra era um receptaculo de vidas, vastissimo reservatorio de substancias fertilisantes, solidificaveis ao influxo da vontade do Eterno, que se acha localisada em cada Espirito, que é uma das scentelhas desprendidas d’Elle. Todos os seres existentes possuem essa materia primordial metamorphoseada em musculos, visceras, ossos, etc., passando, após o desprendimento da alma, successivamente para os estados liquido e gazoso. A materia organica, nos seres animados, sem o perispirito, é dissolvente e tende logo a se decompôr, assim delle se desligue. (*) É a alma, com o seu envoltorio fluido, que a torna cohesa, que a mantem em equilibrio, assimilando e desassimilando cellulas, renovando-se assim os tecidos vivos incessantemente, sem que seja perdida a individualidade de cada ente humano. Essa substancia vitalisavel, de que te falo, é o fluido universal que circula em todos os mundos habitados como um sangue etherisado, que os vivifica e fertilisa, e, se delles fosse banida, todas as creaturas que se acham nella submersas, succumbiriam bruscamente.
(*) O medium, ao receber este topico interpellou á entidade que lh’o dictou:
— Por que, nas mumias e nos cadaveres embalsamados, apezar da separação da alma, não se dá a dissolução da materia?
Resposta — Porque a materia de que se compõem os cadaveres, não embalsamados, não se acha desvitalisada, tem germens que, pela composição dos tecidos, se expandem ou se transformam em seres microscopicos, e, sendo-lhe injectados os toxicos que servem para a esterilisar, são anniquilados todos os elementos vivificantes nella existentes, tornando-a, desde então, indissoluvel ou empedernida.

Não te cause extranheza, pois, o que te revelo, pois sabes que, qualquer corpo fluidico pode tornar-se consistente e até petrificado, se fôrem condensadas fortemente as suas moleculas por uma força magnetica potente, uma corrente electrica vigorosa, e foi o Espirito — que contém grande energia electro-magnetica — o dynamo que attrahiu, (*) congregou e solidificou o fluido disseminado profusamente por este globo, em uma de suas ultimas phases de elaboração, tornando tangiveis orgãos até então imponderaveis, formando-se, assim, todos os tecidos imprescindiveis á vida animal.
(*) Nota do medium: “Do cerebro humano, em condições psychicas especiaes, irradiam oscillações electro-magneticas do typo das ondas radio-electricas da telegraphia sem fios, ondas curtas e de grande frequencia”. Ferdinando Cazzamali, prof. de Neurologia e Psychiatria da Universidade de Milão, em 1926, na “Revista Metapsychica”.

Não é isso admissivel pelos scepticos, que discordam do resultado dessas pesquizas transcendentes:

— Por que? dir-lhes-ei. Não é ainda hoje, o proprio Espirito que tece, no seio materno, seu casulo carnal? Não é o caracol, repulsivo e semi-gelatinoso, que forma o seu estojo calcareo, petrificado, para protegel-o contra qualquer esmagamento, constituindo essa crosta um contraste com o ser que o gerou? Attribuis, incredulos, mais intelligencia e faculdades creadoras ao caracol e aos polypos, — que produzem a perola e o coral — do que á alma humana!

Forneço outro exemplo, que é recente, mas não desconhecido pelos desencarnados que investigam os magnos problemas deste e de outros planetas.

Refiro-me ás sessões psychicas effectuadas por scientistas europeus, nas quaes se manifestaram phenomenos até então ignorados por todos, de maxima importancia para os que se interessam pelas verdades metaphysicas. Por diversas vezes presenciaram elles um agente espiritual utilisar-se dos effluvios odicos de um medium, que diminuia de peso e ficava sem membros ao passo que a entidade immaterial ia-se tornando tangivel.

Apreciaram-se, então, os movimentos isochronos do sangue nas arterias; perceberam-se as systoles e diastoles do coração, funccionando normalmente, por momentos. (*)
(*) Experiencias realizadas por W. Crookes, Aksakof e outros scientistas europeus, como Eusapia Paladino, o sujet. — Nota do medium.

Ora, desde que um medium póde ficar parcialmente desmaterialisado, por influxo espiritual, torna-se patente que os tecidos corporaes são susceptiveis de se desaggregarem por meio de uma força magnetica poderosa — que a possue todo o Espirito, mormente depois de desencarnado. Portanto, sob a acção de um dynamo animico, podem ser desintegrados e reconstituidos membros ao organismo de que se utilisara momentaneamente o agente sideral, após o phenomeno descripto, fica imponderavel e invisivel aos que não possuem a visão psychica. Quanto ao corpo que, por instantes, elle animou, é semelhante á bruma do alvorecer que, assim surge o sol, se esvae no cimo das montanhas, mas não deixou de existir; seus átomos se dispersaram, mas podem ser condensados quando as condições meteorologicas o permittirem. Por esse phenomeno, o da desmaterialisação parcial de um sujet, ficou demonstrado que, ao Espirito, é concedido a faculdade de assimilar e desassimilar todos os tecidos vivos, o que confirma tudo quanto já foi expendido em paginas antecedentes.

CAPITULO III

Comprehendes, agora, que, em éras remotas, foram os proprios Espiritos que engendraram os seus involucros tangiveis, surdindo desse modo, todas as especies zoologicas conhecidas, e, por serem communs a um mesmo reservatorio fluidico é que os organismos — tanto os dos racionaes como os dos irracionaes — têm, uns com os outros, analogia incontestavel, principalmente nas visceras, possuindo tambem elementos existentes nos reinos mineral e vegetal.

De onde, porém, vieram os Espiritos com os seus organismos tangiveis, mas anatomicamente modelados, que animaram e manipularam numero incalculavel de corpos materiaes — desde os mais microscopicos, como os rhizopodes, aos mais titanicos e exoticos quadrupedes. especimens da Fauna de outros planetas que aqui se não habituaram, tendo tido duração transitoria? Não deixaram inolvidaveis vestigios neste globo onde jazem os seus ossarios, encontrados nas camadas subterraneas, salientando-se os do mastodonte, mammuth, ichtyosauro, megatherio e de outros que pareciam hybridos, conjuncto de ave e quadrupede, como o pterodatylo, o ramphorynco e o monstruoso iguanodonte, os quaes, julgo eu, deram origem á lenda das hydras e dos dragões assombrosos? Vieram elles ás myriadas, de diversos mundos disseminados pela Amplidão sideral. Eram, e são, especimens variados da Fauna de muitos planetas, constituindo aqui, raças distinctas.

Os Espiritos humanos tiveram a mesma procedencia que os dos seres inferiores, sendo reconheciveis os que provieram de orbes mais e menos civilisados.

Alguns foram aqui exilados por expiação, outros, em cumprimento de missões dignificadoras, afim de trazerem á Terra os prodomos das Artes, das Sciencias e das Industrias.

Ficaram consistentes; assim foram mergulhados nos effluvios adherentes ao globo terraqueo e que constituiram um só oceano fluidico — gigantesco e inexhaurivel reservatorio de vidas, de onde surgiram todos os seres organisados.

Foi esse o penultimo periodo de genese deste planeta, pois ainda houve um outro, de summa importancia para a Historia Natural — aquelle em que vegetaes cyclopicos, que attestam a exuberancia do solo em que germinaram, ficaram soterrados, — em consequencia de violentos abalos sismicos, de poderosas correntes electricas que percorreram o solo em diversas direcções, fendendo-o em differentes pontos, — e hoje se encontram intactos mas petrificados, formando inexgotaveis minas de hulha.

Uma vez produzidos todos os seres de que se compõe a Flora e a Fauna deste orbe, os fluidos espessos que o envolviam, absorvidos por numero incontavel de corpos, foram-se rarefazendo, e, pela primeira vez, a atmosphera ficou diaphana, respiravel, azulada, contendo os elementos que ora existem nella.

Os mais antigos Primatas hominios — os anthropoides, segundo a classificação de alguns naturalistas, — eram, quasi todos, procedentes dos planetas menos evoluidos do Universo: tinham proporções descommunaes, traços physionomicos sem delicadeza, musculatura athletica, frontes comprimidas, mandibolas salientes e estavam quasi tão imbecilisados como os irracionaes que os circumdavam.

Não provieram, pois, de um só mundo as diversas tribus humanas, patenteando-se, desse modo, a desigualdade de typos, linguagem e progresso.

Algumas, depois que seus Espiritos se revestiram da materia solidificada, ficaram em completa inconssciencia — verdadeiras algas, ou medusas humanas, — silenciosas por algum tempo, não sabendo transmittir reciprocamente as suas idéas, como os recem-nascidos, não pairando em suas mentes embryonarias a mais tenue recordação de sua hégira para um mundo infante que, no emtanto, concebeu um incalculavel numero de entes.

A Terra é, pois, a nossa mãe commum. Os corpos nella se formam e nella se desfazem.

Essa remota expressão da sabedoria popular é uma realidade que, qual vago sonho, existe em todas as almas millenarias…

Engendrada a humanidade que, por muito tempo, foi dominada pelos instinctos, as creaturas sentiram, pela vez primeira, carencia de alimentar os seus corpos gigantescos, que desfalleciam assim lhes faltou a substancia vitalisante em que se achavam immersos e os mantinha confortados.

Foi, a fome, pois, a primeira manifestação da vontade de todos os seres terrestres — e continua a sel-o ainda na actualidade, — repercutindo-se, em todas as regiões, como um clangor selvagem, seus brados e seus rugidos, — mixto de lamento, vagido, ou dor infinita! — desprendidos por myriadas de creaturas de todas as especies zoologicas!

Foi esse o seu despertar no berço terrestre, um dos ergastulos de expiação do Cosmos, que o é ainda, bem como o da lagrima e da remissão…

Guiaram-se os troglodytas pelos instinctos de conservação e de defesa, que os faziam tementes ás intemperies: acossados pelo frio intenso, pelo sol causticante, ou pelos temporaes, procuraram asylo nas cavernas, disputando-as ás feras, empunhando lascas de silex com penetrantes arestas e, depois, conduzindo folhagens para o interior de seus toscos albergues, improvisaram leitos mais suaves que as lages e os calháos lá encontrados…

Nutriram-se dos primeiros fructos — que os havia em grande cópia — pendentes das arvores titanicas e, mais tarde, da carne dos irracionaes; que devoravam crua, sangrenta, como canibaes.

Os primeiros abrigos que engenharam foram feitos de diversas frondes atadas umas ás outras por cipós, ou tiras de couro, circulando um caule cyclopico, ou formados por varios ramos decepados a golpes de machados de pedra, depois architectados de fragmentos de rochas, surgindo os dolmens, ou edificação megalithica.

A construcção de choupanas foi o passo inicial para a civilisação, o acordar do genero humano, depois de uma lethargia secular, para o florescimento das industrias, em um mundo que se achava em sua puericia.

O celebre conto da — Bella Adormecida no Bosque — que tanto delicia a infancia e a juventude, não é mais do que uma allegoria, uma vaga reminescencia que ficou impressa nas almas centenarias das creaturas pre-historicas: aquella floresta impenetravel, cerrada, inaccessivel, exhuberante, sem desbravar, era a Terra na sua final transição, coberta de selvas gigantescas e com todos os obstaculos a serem vencidos para a civilisar: a Princeza, mergulhada em somno cataleptico, a Humanidade, até que foi desperta pela evolução animica, para que fosse iniciado o seu adestramento moral e intellectual.

Houve, porém, uma época em que o homem e os irracionaes se rivalisavam, confundiam-se quasi moralmente, dominados pelos mesmos instinctos. Gradativamente, porém, a intelligencia e os nobres attributos d’aquelle começaram a deseclipsar-se; os instinctos grosseiros foram sobrepujados pelos sentimentos affectivos; o amor santificante irrompeu nas almas, como fagulha divina, associando os seres, ligando-os pelo espirito, distanciando-os por todo o sempre dos irracionaes, embora haja tribus insulares na Micronesia e na Melanesia que se conservam no antigo statu quo, quasi na situação primordial do genero humano. A Bella Adormecida acordou de seu somno cataleptico e comprehendeu que havia um papel preponderante a desempenhar no vastissimo proscenio deste orbe; dominou as feras; domesticou muitas ordens de animaes, que reconheceu lhe serem inferiores e poderem prestar-lhe relevante auxilio; predominou sobre todas ellas por meio de percepções lucidas, e, assim, houve na Asia e depois na Europa, o florescimento das Artes, das religiões e da Philosophia.

Nenhum individuo, porém, guardou, em estado de vigilia, mas nos arcanos da retentiva — velada pela materia e pela vontade divina, — a origem de seus antepassados, como ninguem na Terra — excepto Jesus, — por mais esclarecido que seja, se recorda de sua existencia transcorrida antes e logo após ao nascimento.

CAPITULO IV

Não foi, pois, resultante de um só casal, a humanidade terrena. É evidente que, se todas as creaturas racionaes descendessem de um par unicamente, não apresentaria caracteristicos physicos tão diversos como os possuem os de nações differentes, nem falariam idiomas incomprehensiveis de povo para povo.

Elaborado este planeta, a sua penultima phase foi aquella em que se originaram os seres biologicos. Os animaes, de todas as ordens, foram degredados de varios mundos. Eram Espiritos que se corporificaram assim foram submersos no fluido vivificante que, em grande extensão, envolvia este orbe e ainda existe por todo o Universo, e formaram, em varias regiões, verdadeiras florestas zoologicas.

Esquecidas de suas plagas extra-terrenas, com as faculdades mentaes obscurecidas, surgiram as raças prehistoricas, constituidas de phantasmas materialisados, que começaram a ter vida physica limitada. Cumprindo os designios da Providencia celestial suas potencias intellectuaes desabrocharam lentamente, no transcurso dos évos, como as flores que, ao influxo da luz e do orvalho, ostentam toda a sua primorosa belleza, depois de terem sido apenas inodoros embryões.

— Por que — indagam todos, formulando um problema mundial — a especie humana apresenta tanta diversidade de typos e de idiomas?

Respondo-lhes: o perispirito é que dá fórma á materia, é a estatua impalpavel que se reveste de carne, modelando todos os orgãos, todas as visceras que possuem os seres organizados, e cada planeta tem personalidades diversas das de outro, com caracteristicos inconfundiveis. (*)
(*) Por achar as idéas aqui expendidas de accordo com as de G. Delanne, em sua magnifica obra — A Alma é Immortal — transcrevo o seguinte, da pag. 26: “A fôrma fluidica reproduz não só o exterior mas tambem toda a constituição do ser. A morte não destróe a alma: esta persiste com todas as suas faculdades psychicas e com um organismo physico, invisivel e imponderavel, que possue todas as leis biologicas da individualidade humana” — Nota do medium.

Por muitos seculos o corpo fluidico apresenta o aspecto originario que lhe aprouve conceder o Creador, os distinctivos individuaes que seleccionam as raças humanas, — podendo patentear deformidades que se reproduzem em varias existencias. Depois, depurado em diversas avataras, adquiridas as virtudes que o elevam á categoria de entidade lucida, pelo livre arbitrio e pelo poder da volição que lhe é outorgado, — a qual se torna uma faculdade creadora nos Espiritos superiores, — imprime-lhe um outro aspecto, pleno de nobreza e de magestosa formosura, como o têm os que culminam a Perfeição psychica.

Ora, como os Espiritos aqui proscriptos provieram de planetas de differentes categorias, as tribus humanas apresentam typos dessemelhantes, falam varios idiomas que são apenas reproducções dos que se utilisavam em suas patrias longinquas.

A diversidade de cor, notada em differentes raças, proveio da desigualdade de aquecimento no fluido que envolvia a crosta terrestre — o que succede até hoje, quanto á temperatura, nas zonas que a dividem.

Como não ignoras essas zonas são desigualmente aquecidas pelos raios solares, e, então, os effluvios que as sobrepunham formaram varias tonalidades, dando origem á côr peculiar aos individuos de cada raça, que possuiam no mediador plastico os distinctivos ethnicos.

Os da zona torrida — no hemispherio que estava no estio — ficaram ennegrecidos, originando os ethiopes; os do hemispherio opposto aquelle, nas regiões equatoriaes e tropicaes, que não se achavan na alludida estação, tornaram-se acobreados, amarellos ou trigueiros, constituindo os malaios, os mongoes, os australianos e os americanos; os das zonas inter-tropicaes e frigidas, formaram a raça caucasea. Com o fluir do tempo foram emigrando de suas plagas nataes e povoaram as que mais lhes convinham, mas a humanidade ficou, sempre, seleccionada pela cor da epiderme dos individuos, que conservam ainda em seus perispiritos, através dos seculos, as formas originaes, soffrendo lentas metamorphoses.

Alguns povos da raça caucasica revelaram, sempre, apreciavel cultivo intellectual, idéas progressistas, porque provieram de mundos mais apurados que aquelles de onde emigraram os que habitaram a Africa, a Oceania e parte da Asia. Os conhecimentos que já haviam adquirido, archivados nos escaninhos espirituaes, defluiram-lhes das mentes como as aguas de um manancial que parecia exgottado.

Houve, pois, desde então, por influxo desses povos mais evoluidos, o alvorecer das Artes, das sciencias e das industrias, ao passo que os oriundos de planetas inferiores não desobscurecem as suas faculdades psychicas senão como o convivio dos que são adestrados nas conquistas uteis ás collectividades.

Na Africa — excepto os paizes do Norte e do Sul, e em grande numero de ilhas australianas, — os barbaros têm estado quasi estacionados, e só morosamente é que o progresso se implanta em seus nucleos. Nessas raças incultas sempre se encarnaram as almas exiladas dos orbes de expiação exclusivamente.

É-lhes impostas essa pena para lhes punir a rebeldia ou a ferocidade. Constituem uma transição do troglodyta para os individuos semi-civilisados, como o eram alguns incolas americanos, que possuiam noções de civismo, de culto artistico e religioso.

Não é de causar assombro, pois, que, a America, nova relativamente á sua conquista pelos europeus, tenha sido invadida bruscamente pelo progresso, como por uma avalanche de luz, — porque sempre, abrigou em suas plagas phalanges de espiritos aptos para os grandes surtos da civilisação.

A humanidade, que povoou este orbe, tem a mesma antiguidade, muitas vezes millenaria; seleccionou-a, apenas, a diversidade de categorias de suas tribus. Pela Paleontologia verificou-se a existencia de fosseis humanos e de varios animaes — cujas raças de alguns já foram extinctas, em quasi todas as regiões continentaes. (*)
(*) Nota do medium: “O ex-prof. de geologia da Universidade de Sydney, sir Edgeworth David, annuncia haver descoberto nos montes Flinders, na Australia meridional, vestigio de vida animal em um periodo anterior de muitos milhões de annos ás épocas geologicas até agora estudadas”. “Minas Geraes” de 14 — 9 — 1928.

Patenteiam-se, por toda a parte, vestigios de povos antiquissimos, barbaros ou semi-civilisados, como os Incas e os Aztecas, que, absolutamente, não figuram nos Livros Sacros nem consta houvessem descendido dos asiaticos, — apezar de já ter sido a America unida a Asia em éras remotas, depois separada por um cataclysmo, formando o estreito de Bhering, — manifestando elles conhecimentos que não foram adquiridos pela interferencia dos naturaes do Antigo Continente.

Sendo as tribus primitivas oriundas de planetas de differentes categorias, está demonstrado que os idiomas, nos quaes expressaram suas idéas desde pristinas épocas, eram a reminiscencia dos que usavam nos mundos de que foram elles transitorios habitantes. Tambem fica patenteada a variedade de typos, inherentes a cada povo, pois que são elles a reproducção dos que possuíam em suas patrias dispersas pelo Espaço.

O perispirito é que modela o corpo carnal, dá-lhe contornos e sustem-lhe a estatura, e, emquanto a alma não está burilada e não adquire todos os attributos de Perfeição — conquistadas em multiplas existencias — conservam-se os caracteristicos de uma raça ancestral, até que, attingidos todos os predicados moraes e intellectuaes immanentes dos evoluidos, se aprimora, afeiçoa artisticamente o seu envoltorio fluidico, tornando-o idealmente bello — mixto de neblina e luz!

Esses são já os habitantes dos páramos sideraes, os emissarios do Omnipotente que têm por Patria o Universo, em que transitam como aguias divinas, scindindo livremente o Espaço, o ether…

Quando ha transmigração de um espirito, que sempre se reencarnou em determinado paiz, para outra nação, — por um designio da Providencia, muitas vezes para progredir, estreitar laços affectivos, resgatar delictos, — conserva elle no seu mediador plastico a forma originaria. Não é raro, por isso, ver-se um individuo de uma raça com frisante semelhança com o de outra, de que não descende physicamente. Succede tambem, ás vezes, que, de genitores normaes nascem entes de proporções herculeas, e outras de estatura diminuta, os denominados anões. Estes são um vestigio de emigração dos espiritos dos esquimós para uma outra raça, da qual se destacam por sua pequenez; e aquelles, os gigantes, dos individuos de outros planetas, onde os seres attingem uma altura descommunal, e quasi sempre têm, na terra, uma permanencia ephemera, pois as condições meteorologicas e physicas d’aqui muito se diversificam das de suas plagas nataes. São como plantas dos tropicos que se estiolam e fenecem nas regiões polares…

Os fluidos absorvidos pelos proscriptos do Universo, que aqui acamparam, ainda não se acham extinctos, pois os organismos vivos e em decomposição permutam incessantemente as suas moleculas constitutivas, ficando assim os reinos da Naturaza em perpetua fusão atomica; passando, continuamente os tecidos, dos animaes para os vegetaes, ou para os animaes. (*)
(*) Nota do medium: Por achar de accordo com as idéas do Mestre, explanadas nesta mensagem de além-tumulo, com as que expendeu Flammarion, no discurso que proferiu á beira do seu sepulchro, delle transcrevo:
“Por lel suprema da Natureza, o corpo material é um aggregado transitorio de moleculas que lhe não pertencem e que a alma congrega, segundo um determinado typo, para formarem orgãos que a ponham em relação com o mundo physico. E emquanto o nosso corpo se renova, peça por peça, pela perpetua substituição das particulas, emquanto elle pende e um dia descamba, massa inerte, para o tumulo, de que não mais se ergue, o nosso Espirito, ser pessoal, guarda sempre a sua identidade indestructivel e reina como soberano sobre a materia de que se reveste, estabelecendo por esse facto, constante e universal, a sua personalidade independente, a sua sciencia espiritual não sujeita no imperio do tempo e do espaço, a sua grandeza individual, a sua immortalidade”. — Flammarion.

Muitos leitores objectarão que o Altissimo, a superlativa intelligencia, não necessitava exilar de outras paragens os Espiritos, podendo creal-os aqui, ou alhures, ao influxo de sua Vontade alma, inegualavel, formando uma só raça, falando um só idioma.

Estou de pleno accordo com os que assim argumentam, mas, por que aprouve á Entidade Suprema banir de outros planetas os habitantes terrestres: foi para punir Espiritos rebeldes ou exclusivamente para colonisar este mundo?

Foi não somente por expiação mas tambem para congregar familias de diversos orbes em um outro recem-elaborado, estabelecendo, assim, os vinculos indestructiveis de solidariedade e fraternidade que ligarão entre si as humanidades planetarias, trazendo, ao mesmo tempo, para aqui, os elementos de todos os conhecimentos uteis que, além, ha muito, proliferam.

Não é uma prova de magnanimidade essa resolução deifica? Os Espiritos que aqui foram degredados não têm, no seu recondito, a aspiração louvavel de regressar ás mansões sideraes, que, por seu turno, têm progredido como as almas que abrigaram, pela primeira vez, em seus seios? Lá não ficaram entes queridos e que os aguardam? Pelo desejo de encontral-os novamente não abreviam as suas provas aqui, soffrendo-as heroicamente, evoluindo moral e intellectualmente?

Não é a bondade e a omnisciencia do Creador que se manifestam com maior pujança neste designio seu — o de congregar irmãos, os suppostos anjos decahidos, conforme se expresaram os sabios da antiguidade, provenientes de varios mundos, em um outro, para poderem collaborar, em seculos de convivio, pelo mutuo progresso?

Eis as conclusões a que chegaremos, interpretando a resolução do Omnipotente, já manifesta, e que acabo de revelar aos pesquizadores das verdades transcendentes.

Congraçou o Eterno, em um só planeta, elementos varios, habitantes de muitas paragens do Cosmos, deixando que permanecessem entorpecidas nos recessos das almas as reminiscencias dos seres amados que além ficaram. Entrelaçou, desse modo, a humanidade do Universo, como differentes flores fórmam uma só grinalda, estreitando sentimentos affectivos, encadeando os Espiritos pelo amor, em todas as suas modalidades, reunindo no globo terrestre muitas especies planetarias — innumeros élos vivos de uma só corrente infinita, — que, mais tarde, se confundirão, estabelecendo aqui, indissoluvelmente, as bases da solidariedade universal!

CAPITULO V

Agora direi sobre este ponto obscuro da Historia humana, o qual tem suscitado innumeras controversias entre os investigadores de seus arcanos — a Metempsychose — conforme era classificada na India e no Egypto a transmigração das almas para outros corpos, e, mais tarde, com algumas alterações, foi denominada theoria de Darwin.

Affirmam os transformistas que o homem teve a sua procedencia nos quadrumanos classificados na mesma ordem a que elle pertence — a dos Primatas.

Para elles, pois, o simio é o lemure ou anthropoide. isto é, a transição do irracional para o racional, o mediador entre todas as especies zoologicas e o homem.

Aqui lhes faço, porém, as seguintes arguições:

— Como surgiram tambem, neste orbe, os quadrumanos, cujos organismos mais se assemelham aos dos bimanos?

Não appareceram com a Fauna e a Flora, em sua totalidade, sem que os naturalistas pudessem, até o presente, averiguar a sua genese? Acha-se esta no dominio da Hstoria Natural? É admissivel, in totum, no seculo XX, o systema de W. Darwin, que assegura serem todos os vegetaes e animaes oriundos de uma unica cellula ou glóbulo, átomo vivo, produzido pela espuma das éras primitivas (*), ou quando assegura que o homem é o simio metamorphoseado, o nosso avoengo primordial?
(*) Não será essa espuma o fluido universal, descripto pelo Mestre, ou o ectoplasma dos metapsychistas? — Nota do medium.

Pois bem, esperando responda-nos de accordo com a verdade, pela qual pugnamos, eu lhes dirijo mais estas palavras amigas: sendo o Omnipotente um Espirito almo e omnisciente — como affirmam quasi todas as religiões existentes, — poude crear o Universo, todas as maravilhas incomparaveis que contém, os corpos titanicos dos astros e dos planetas, os robles mais gigantescos e as plantas mais microscopicas, os mastodontes e os protozoarios, porque acharias difficuldade sómente em produzir o corpo humano, precisando utilisar-se do organismo dos bugios para nelle implantar a alma do racional — fantatica enxertia psychica, — como se o maki e o homem não houvessem sido medrados exclusivamente por sua vontade, ou qual se aquelle existisse anteriormente a este, originado por outro Deus primitivo?! Absurdo! Elle poude produzir a luz — o supremo portento do Universo, — que se irradia de sua propria alma indefinivel, a contextura das estrellas, de fulgor inextinguivel, as gemmas radiosas que se entranham no solo, e não poderia, á sua propria Volição potente e infinita, se o quizesse, corporificar os espiritos em organismos proprios, mais perfeitos que os dos quadrumanos, ou outorgar-lhes a faculdade de os manipular, tecer suas vestes carnaes, não constituidas de uma unica celula viva, mas de numero illimitado de cellulas, ou moleculas vitalisadas por Elle, congregadas por uma força magnetica proveniente deste iman inegualavel — a Alma — uma das scentelhas divinas, que possue muitos dos attributes do Supremo Factor do Universo — a immortalidade e o poder creador?

Far-me-ão, os scepticos, esta arguição:

Como, depois de povoado o Orbe terraqueo, jamais surgiu um ser que não proviesse de outro?

Antes de responder-lhes, far-lhes-ei tambem esta interrogação:

— E vós, darwinistas, já vistes sahir das selvas, no decorrer dos seculos, em que se distingue o racional do irracional, algum simio aperfeiçoado, sem pellos, com outra conformação craneana, sem mandibulas proeminentes, articulando palavras intelligiveis, transformado em homem, emfim? (*)
(*) Nota do medium — Para corroborar a opinião do Mestre, transcrevo algumas affirmativas de abalisados scientistas:
“Se os animaes se formaram modificando-se pouco a pouco, se mudaram, achar-se-iam signaes dessas modificações graduaes e, até hoje, não se chegou a isso.” — Cuvier.
“Dieu a établi des lois que se conservent.” (Tradução: Deus estabeleceu leis que se conservam.) — Buffon.
“L’homme est un être á part.” (Tradução: O homem é um ser á parte.) — Gratiolet.
“Incontestavelmente o homem não é puro animal. Ha entre a nossa especie e as especies animines tão perfeita differença, como entre os animaes e os vegetaes”. Theoria da Loucura — Bezerra de Menezes.

Enquanto não m’a satisfizerdes dir-vos-ei, em duas breves respostas:

1.º — Não ha necessidade de recorrer-se á colonisação extrangeira em um paiz populoso, portanto, estando a Terra completamente habitada não se reiterou o phenomeno já descripto, o da corporisação dos Espiritos.

2.º — Porque os elementos constitutivos dos corpos tangiveis foram absorvidos pelos perispiritos dos primeiros seres terrenos e são restituidos á Natureza quando a materia se decompõe ou por assimilação, isto é, por meio da permuta constante que ha das moleculas componentes dos organismos vivos.

Surgem ainda especimens zoologicos e vegetaes desconhecidos pelos naturalistas provando ser inextinguivel o laboratorio mundial, em que se plasmam todas as formas, ao passo que vão desaparecendo animaes e raças humanas — como os Aryanos, os Druidas, os Celtas, no Antigo Continente, os Aztecas e os Incas, na America, — porque suas almas já evoluiram e transmigraram para as mais civilisadas, cognatas dellas.

Se houvesse obstaculo para o Fatotum crear os corpos humanos, tambem haveria para tornar fertil este orbe, que se originou, como succede a todos os mundos, de substancias igneas, que não podiam conter vivo nenhum germen vegetal ou animal, e, no entanto, o solo cobriu-se de selvas infinitas, surdiram nellas myriadas de seres biologicos, dos infusorios ao mammuth, e, entretanto, ninguem cogitou que tivesse havido um semeador divino a fazer da Terra um colossal alfobre…

Concluindo quasi, agora, direi que a intelligencia humana, por mais lucida que seja, tem deficiencias e, por isso, muitos dos problemas que hão preoccupado os sabios e os philosophos de todas as raças, serão resolvidos, com extrema facilidade, quando seus Espiritos concluirem, aqui, a sua aprendizagem, adquirindo, pelo esforço proprio, todos os conhecimentos e virtudes imprescindíveis á perfeição psychica, conquistando o direito de ingresso nos mundos — Academias, em que as Artes e as Sciencias já attingiram a culminancia.

Aqui, neste orbe, carcere e sanatorio da humanidade imperfeita, não podem as creaturas conseguir senão conhecimentos rudimentares, como um alumno de escola primaria que, ao finalisar o seu curso se acha apto para se tornar gymnasiano, e, após, para frequentar Institutos de ensino superior. A vaidade, porém, dos doutos terrestres fal-os suppor que a sua erudição já alvejou a superlatividade e que, os phenomenos inexplicaveis segundo a sciencia em que pontificam, ficarão sempre insoluveis, despresando a Causa, o Factor primordial de todos elles, de tudo quanto existe — Deus — a synthese de todas as sciencias!

Mais tarde, porém, convencer-se-ão de que a Universidade em que aprenderam a resolver todas as equações e enygmas inextricaveis até a época actual, está além, acima de suas frontes e não ao nivel de seus pés…

CAPITULO VI

Terminando, hoje, a minha digressão espiritual através de éras remotas, dir-te-ei que os magnos problemas relacionados com os arcanos da Creação, continuam a despertar-me o mesmo culto sincero que lhes consagrava emquanto me achava com o estojo carnal.

Synthetisando o que já patentiei a respeito do passado nebuloso de nossos antepassados, reitero: a humanidade mixta deste planeta não descende de um só casal, consoante a Biblia, mas de innumeras familias, que para aqui foram degredadas com os seus organismos astraes, que assimilaram, condensaram e solidificaram — por illapso da Vontade suprema, — os elementos componentes dos tecidos animaes.

Uma vez corporisados, colonisaram, ao mesmo tempo, todos os Continentes e muitas ilhas, ficando, por algum tempo, em completo estado de inconsciencia, dominados apenas pelos instinctos. As faculdades animicas, porém, estavam embryonarias, e, pouco a pouco, se foram desabrochando, recordaram o que já haviam apprehendido em outras espheras, tornando-se logico que, as grandes invenções não passam da reproducção de cousas conhecidas alhures, avivadas subitamente na memoria, quando apraz ao Inspirador divino passar-lhe pinceladas de luz. Se o grande philosopho atheniense Platão dizia que “Aprender é recordar” pode-se imital-o affirmando “Inventar é recordar”.

Os autochtones da America, da Oceania e da Africa provieram de planetas inferiores aos que povoaram grande parte da Asia e Europa, e só em contacto com os civilisados pódem modificar habitos millenarios, ampliar conhecimentos uteis, expurgar as asperezas e as maculas de suas almas conturbadas pela pratica de actos condemnaveis.

Fica assim esclarecido o problema que tanto tem preoccupado a humanidade: o da diversidade de idiomas dos incolas de um mesmo Continente, e a differença physica e moral que ha de raça para raça, que não provêm exclusivamente do clima e da educação. Os descendentes de europeus, nascidos em Benguela ou em Zambeze, não têm a menor semelhança com os africanos, quer nos organismos quer nos sentimentos, portanto, não é acceitavel que hajam tido por ascendente a Noé, asiatico, hebreu, unicamente por causa da supposta maldição paterna lançada sobre Cham e sua progenie, em desaccordo com a integra justiça do juiz universal — cada um segundo suas obras.

Os typos differem em cada raça por causa do perispirito, que é a effigie imponderavel mas perfeita — distincta em cada individuo e em cada planeta, — que se reveste de musculos e de ossos.

Seus agrupamentos constituem as tribus humanas, com caracteristicos plasticos e mentaes peculiares a cada uma — conforme o progresso psychico realisado, — até que a alma, depois de longo tirocinio, cinzelada por arduas pugnas, quintessenciada, attinge o seu completo aprimoramento.

Então toma um aspecto diverso do que possuia nos planos inferiores, pleno de nobreza e formosura, que não podem ser idealisadas na Terra, formando a especie sideral, ou a das Entidades fulgidas. É, pois, cada alma, uma chrysallida a metamorphosear-se lentamente, no escoar dos seculos, em radiosa phalena.

CAPITULO VII

Algo direi, agora, sobre outro thema, de summo interesse para os que se devotam nos assumptos transcendentes — a genese dos Espiritos, que a tiveram em mundos mais remotos que este. São elles fagulhas do proprio Creador, como raios de Sol desprendidos a todos os instantes de seu nucleo resplandecente e inexgottavel. Têm, todos, no inicio de suas existencias planetarias, egual aptidão para o Bem e para o Mal, porém, ás vezes por longo tempo, os seus mais nobres attributos ficam em lethargia como o bombyx mori, obliterados pela materia espessa em que se encarceram, havendo quasi que somente a eclosão dos instinctos e o eclipse dos sentimentos dignificadores.

Fica, pois, a alma semelhante a um raio solar interceptado por um sudario de trevas espessas, por um casulo de imperfeições geradas pela pratica das iniquidades, mas desintegradas, destruidas por caudaes de lagrimas, preces, abnegações — o filete de luz readquire a pureza e o brilho dos astros, desfaz-se a caligem e, então, segue, uma trajectoria triumphal, que não poderá mais ser sustada e incide no Infinito, volve-se para o Fóco universal — Deus.

Essas muralhas de trevas, que impedem a marcha ascencional dos Espiritos, são erguidas pelos delictos, mas, as expiações remissoras, as aprendizagens moraes e intellectuaes realisadas em muitos avataras, as vão derrocando lentamente.

Ao passo que são pulverisadas, elles se tornam lapidados; solidificam-se os sentimentos excelsos; despojam-se dos vicios e das paixões malsãs, esphacelam-se os compactos nevoeiros das perversidades pelos jorros fulgurantes das virtudes conquistadas penosamente; readquirem a contextura radiosa que revela a sua origem celeste, o Nucleo diamantino de onde se derivou toda a Creação — Deus — para o qual se alam!

— Não seria mais razoavel que o Omnipotente os creasse invulneraveis ao Mal, sem nenhuma tendencia para as crueldades e para os desvios da honra e do dever? — interrogarão muitos.

— Sim, segundo o vosso julgamento, dir-lhes-ei eu, — mas, prefere creal-os com egual pendor para o Bem e para o Mal, dos quaes, pelo livre arbitrio, pódem fazer o uso que lhes aprouver, afim de que Elle possa punil-os ou amercial-os de accordo com as suas acções, valorisando assim o esforço proprio. Se os creasse infalliveis, torna-los-ia uniformes, sem merito pessoal, não galardoaria o Bem pela ignorancia do Mal, e é luctando com este, em varias encarnações, que se decupla o merecimento dos denodados moraes, até que culminem a Perfeição. É assim que architectam a sua propria individualidade, seleccionam-se uns dos outros, elaboram a sua propria ventura, detestam o que é damnoso ás sociedades, amam verdadeiramente á Virtude e ao altruismo, unicos erarios inextinguiveis e que os tornam ditosos, possuindo-os.

O Altissimo é um Marechal que dirige os seus exercitos invictos em myriadas de campos bellicos, em cada um de seus innumeros Reinos, para alcançar o triumpho definitivo de uma Causa excelsa — Redempção psychica — conquistando-o juntamente com elles e, finda a campanha, divina, no transcurso da eternidade, galardoa os heroes, promove-os de posto, cobre-lhes os peitos de lucidas insignias, encarrega-os de missões nobilissimas em todas as regiões do Universo. Que valor haveria no Bem sem o conhecimento do Mal? Como se poderia admirar a luz se não houvesse treva?

A percepção do que é nocivo e prejudicial a nosso semelhante é imprescindivel ao espirito, porque desse modo sabe valorisar o que pode tornal-o venturoso, e, para o conseguir, não pratica nenhum acto reprovavel ou que possa molestar o nosso proximo, não ignorando. quanto se soffre em identica situação. O Mal, pois, é transitorio, só o Bem é perenne.

A pratica voluntaria das iniquidades produz um eclipse espiritual, mas a alma, pela Virtude, se desoffusca, torna-se esplendente como setta de luz com a contextura das estrellas.

CAPITULO VIII

Eis elucidada a procedencia do genero humano na Terra.

Muitos leitores farão objecções ao que venho de relatar, mas, o que lhes posso assegurar é que, jamais, descobrir-lhe-ão outra origem. Que investiguem os naturalistas as regiões mundiaes e encontrarão, em todas ellas, até nas polares, o vestigio de nossos antigos ascendentes ou de nós mesmos.

Convencer-se-ão, assim, de que o Eterno fez a humanidade surdir, ao mesmo tempo, em todas as zonas, como fez abrolharem do solo todas as florestas e todos os vegetaes, de germens que aqui não existiam, bem como todos os seres zoologicos — os mais variados especimens, dos mais gigantescos aos microscopicos e invisiveis a olhos nús, — que aqui appareceram como por magia de uma vara de condão, á vontade potente do Creador!

Os ethnólogos nunca desvendarão outra origem dos povos seleccionados pelo physico e pela dialectica, senão de accordo com o que foi exposto pelos Instructores sideraes.

Ha as pegadas da humanidade por todo este planeta, exilada de outros, aos quaes ficou indestructivelmente vinculada por laços affectivos, que a incitam a progredir, a aspirar o seu regresso ás patrias de outr’ora, disseminadas pelo Além.

Não é mais admissivel o imaginar-se que tantas raças diversas tenham descendido de um só casal.

Para corroborar o que expendi basta a prova evidente de que a America e a Oceania, ao serem desbravadas pelos orientaes, possuiam numerosas populações, differentes das do Antigo Continente, do qual se achavam isoladas pelos Oceanos bravios, não desprovidas de intelligencia, de sentimentos dignificadores e conhecendo as artes mais uteis á existencia.

Não ignoravam o civismo, a immortalidade da alma, a vida extra-tumulo; distinguiam uma potencia do Bem e outra do Mal, — que as ha, realmente, no intimo de cada ser, — até que a segunda seja anniquilada pela primeira.

Manifestavam os Incas e os Aztecas concepções do esthetica, de musica e esculptura, de civilisação emfim, não adquirida por intermedio de seus irmãos de ultramares.

Se a America tivesse sido desmembrada da Asia, no local onde se acha o estreito de Bhering, depois de povoadas, os antigos escriptores sacros, que mencionam até o Paraiso terreal, ter-se-iam a ella referido, haveria vestigios nos idiomas usados aquem e além do Pacifico, o que não succedeu quando foi descortinado o Continente Occidental, inteiramente ignorado nas éras prehistoricas.

Havia apenas a supposição da existencia da Atlantida, imaginada pelos mythographos, uma ilha a Oeste de Gibraltar, não de uma vasta região com quasi um terço da superficie terrestre, falando seus incolas linguagens differentes das dos povos de outro hemispherio, o que prova não terem estado os americanos em contacto com os filhos de além-mar. A descoberta da Groenlandia, por escandinavos antes da da America, não trouxe á humanidade a certeza de que, ao sul d’aquella gelida paragem, existia um immenso Continente por desvendar.

Havia apenas latente, qual fagulha indestructivel, na alma do genial Colombo, a intuição da existencia de um vastissimo territorio, por descobrir, porque jazia em seu imo a recordação de tel-o habitado, em findas encarnações, na tribu dos Incas, por isso, concebeu a inabalavel certeza de que, no Occidente, havia uma fracção do mundo ainda inexplorada. (*)
(*) Nota do medium — Colombo, como quasi todos os seres humanos que se immortalisam com os seus grandes feitos, foi contestado, calumniado, desprestigiado pelos ciosos de sua gloria… que lhe foi amarga e o levou a miseria e ao abandono! Asseveram illustres historiadores que elle se certificara da existencia das Indias Occidentaes, de posse de documentos fornecidos por seu sogro B. Perestrello e por destemidos marujos que já as tinha avistado, e, como naufragos, agonisantes, foram acolhidos na ilha da Madeira, onde Colombo estava residindo. Esquecem-se, porém, os seus detractores, de que antes de Colombo residir em Portugal e na Hespanha, no Congresso de Genova, antes de se haver relacionado com Perestrello e com os alludidos naufragos, já havia concebido a idea de que, se fosse no hemispherio occidental, forçosamente encontraria terras desconhecidas dos orientaes, a fracção que integrava este Planeta em que estamos exilados. Não possuia pois, até então, nenhum documento, nenhuma prova material do que imaginava; era acoimado de visionario porque apenas se deixava guiar por inabalavel intuição que, qual bussola divina, o norteava para as plagas americanas, de que fôra habitante em transcorridos avataras… No — Libro de las Profecias — Colombo assim se expressa: — “Quem duvida que esta inspiração não me foi dada pelo Espirito Santo que, com seus ralos de luz maravilhosa, vinha avisando-me que eu proseguisse e, ainda, sem cessar um momento, continua a inspirar-me com enthusiasmo, consolando-me com a leitura da Sagrada Escriptura, nos livros do Velho Testamento e nos Evangelhos com epistolas daquelles bemaventurados apostolos?”

Triumphante a sua idéa os hespanhoes não patentearam o assombro que deveriam manifestar ao saber que foram encontradas, muito além de suas plagas, em mares longinquos, terras fertilissimas, irmãos que pareciam aguardar a sua vinda, pois os receberam quasi festivamente. Por que? Porque nas almas rudes dos selvicolas fulgurou, bruscamente, a lembrança até então em penumbra, de que já se haviam relacionado outr’ora, quando o destemido nauta e diversos tripulantes de sua esquadra eram seus dedicados companheiros, bem como nas dos iberos esta recordação que os vinculava uns aos outros por eternos liames: a de uma éra afastada em que foram banidos de suas verdadeiras Patrias, marchando todos, através do Infinito, commandados por Espiritos lucidos — qual exercito formidavel, constituido de legiões de diversos planetas, que se immobilisasse para uma batalha universal, — acampando, afinal, em um mundo recem-creado, destinado ao resgate de culpas graves, um dos presidios do Macrocosmo. Era, pois, um élo espiritual, forjado de reminiscencias, o que ligava os filhos dos dois Continentes, reciprocamente.

Termino, agora, esta ligeira palestra psychica, que, ha dias, entretenho comtigo, conscio de haver cumprido um dever, dando-te esclarecimentos que me solicitaste, os quaes interessam a todos os pesquizados das verdades transcendentes.

Lendo-a, talvez sorriam os incredulos, murmurando:

— “Qual! Não é admissivel que os Espiritos, em épocas prehistoricas, tenham podido modelar o seu proprio involucro, tal como foi descripto…”

Eu lhes redarguirei em conclusão:

— Por que? Quem o elabora no interior dos corpos vivos? A Natureza? Mas, que é a Natureza senão uma escrava do Supremo Senhor, ao qual obedece sem reluctancia? Que ha de anormal que o Espirito, uma das scentelhas do Creador do Cosmos, tenha engendrado as proprias vestes carnaes, assimilando-as em seu envoltorio fluidico, se é elle, até hoje, quem as faz, no seio materno? Notando-se que, na éra da genese da humanidade neste orbe, as condições de producção eram diversas das das éras subsequentes.

No periodo final de sua formação todos os elementos componentes dos organismos se achavam em promiscuidade, formando elle um verdadeiro reservatoria de substancias vitalisadas que, em contacto com as baterias espirituaes — electro-magneticas de poderosa energia, — foram congregadas, solidificadas, transformando-se em cellulas, musculos, nervos, arterias, ossos, visceras.

Se negaes a existencia de Deus, não me comprehendereis; se, ao contrario, vós m’o affirmaes, não duvidareis de minhas asseverações. Podeis negar a existencia do Universo? Ignoraes que não ha effeito sem causa e podeis duvidar que um Espirito Omnipotente foi quem produziu os portentos que jazem acima de vossas frontes e abaixo de nossos tumulos? Pois bem, não contestaes aquillo que os vossos olhos contemplam, a vossa razão admitte e a vosso senso confirma. Ouvi-me, pois:

— Que ha de surprehendente e contestavel que, ás fagulhas que se desprendem do Creador Supremo tenha sido transmittida — em grau infinitesimal — a potencia de auto-elaborar suas estatuas carnaes, quando Elle, exclusivamente Espirito, produziu os corpos titanicos de todos os planetas, de todos os satellites, de todas as nebulosas, de todas as estrellas, que constituem incontaveis constellações, com luz propria inextinguivel, todas as maravilhas, enfim, que formam o Universo infinito, incommensuravel, portentoso, incomparavel?

Allan Kardec.

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Caliban Kalitz

"No Man, when he has lighted a candle, cover it with a vessel, or put it under a bed; but set it on a candlestick, that they which enter in may see the light."