Os Últimos Jedi: As Promessas, As Armadilhas e O Que Fica Pra Gente

Camila Novaes Maia
8 min readDec 20, 2017

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Esse texto é uma tradução livre do texto: The Last Jedi: Promises, Pitfalls and What Sticks With You escrito por Kameron Hurley (@KameronHurley) para o seu site Kameron Hurley Intellectual Badass, escrito no dia 16/12/17.

E sim tem SPOILERS

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Eu saí da sessão de Os Últimos Jedi assim, “Bem, foi bom, mas não me surpreendeu.” Ele tem muitas tramas; parece que são três filmes em um, e o amontoado de tramas em um filme só, fez com que parecesse um pouco inchado. Os beats do roteiro não têm aquela estrutura como a de um relógio que O Despertar da Força e a trilogia original estavam presas. Houve alguns sólidos momentos emocionais que precisavam ser trabalhados melhor do que foram.

Contudo…

Contudo, ainda nesta manhã, eu não consigo parar de pensar nele. As histórias são, em seu âmago, sobre os personagens. Se eu estiver investida nos personagens e em suas batalhas, você pode ferrar com a trama que ninguém vai se importar. Fanfiction é sobre os personagens e as jornadas emocionais deles, não sobre a Jornada do Herói. Como o O Despertar da Força seguiu tão intimamente à estrutura de Uma Nova Esperança (até mesmo com cenas e sequências semelhantes), entrei no cinema esperando que este filme imitasse O Império Contra-Ataca de maneira semelhante, estruturalmente.

E não foi assim.

No entanto, o que ele fez, foi forçar os seus personagens a fazerem escolhas difíceis. O que ele fez, foi mudar a forma como nós vemos o universo de Star Wars e nos fornece algumas ideias sobre como lutar contra o Lado Negro sem necessariamente explodir a porra toda, o tempo todo.

Como alguém que, atualmente, está se esforçando para contar diferentes tipos de histórias, sem ser aquelas que dependem de uma enorme Jornada do Herói, onde simplesmente explodimos tudo para resolver nossos problemas, apreciei muito o que esse filme tentou fazer, tematicamente.

Eu amei que o Luke fodeu tudo. Que ele era fraco. Que ele tentou ser esse grande e legendário Mestre Jedi que todos pensaram que ele ia ser, e que falhou nisso. Que ele estava com medo. Que ele estava incerto. Que ele era, afinal de contas, aquele moleque chorão de fazenda que conhecemos em Uma Nova Esperança. O que aconteceu com Luke foi tão verdadeiro contrastando com o personagem original, que eu admito que foi um pouco revigorante. Esperamos que os heróis façam diferentes tipos de jornadas, para se tornarem um tipo específico de heróis. O fracasso de Luke nessa história foi uma das partes mais agradáveis ​​e críveis do filme.

Eu queria mais vai ou não vai, com Kylo Ren — admito que adoraria ver um pouco mais dele indo para o Lado da Luz, mas, Adam Driver compensou com a sua entrega em uma única fala, quando ele está pedindo à Rey para se juntar a ele para governar a galáxia, e ele diz: “Por favor”, e você vê quem ele realmente é, aquele menino aterrorizado, solitário, cujo mestre se virou contra ele e que ultrapassou uma linha para o lado sombrio e se recusa a voltar. Kylo Ren é literalmente o vilão do nosso tempo: um jovem privilegiado que acredita que todos o prejudicaram, e que tem um grande poder, que ele não sabe controlar, seja uma arma, ou fisicamente, ou, neste caso, a Força. Nós merecemos esse vilão. Se você acha que ele é descontrolado, mimado, e ridículo, bom, deixe-me lhe apresentar alguns caras que atiraram em todo mundo, em suas escolas e em salas de cinema, e sim, também, GamerGates e jovens brancos nazistas e nacionalistas, etc. A mesma juventude irritada e amarga, que acredita que o mundo lhes deve algo, e atacam e destroem tudo porque eles não conseguiram o que eles sentem que lhes pertence.

Eu com certeza poderia assistir mais da Rey, também. Se Kylo foi verdadeiro quando falou sobre os pais dela, então, devíamos ter visto um flashback deles a abandonando. Como público, precisávamos ver isso. O fato de que eles não mostraram, me incomoda. Deixa a entender que o Kylo Ren é um narrador não confiável; embora, o fato de que Rey seja uma “ninguém” e que “esta não é a sua história” é uma das mensagens mais poderosas do filme inteiro. Toda a sequência entre ela e o Kylo Ren é uma das melhores de todo o filme. É a escolha entre o lado sombrio e da luz, entre ser alguém e não ser ninguém, de escolher o seu lado. Mas, novamente, emocionalmente, precisávamos da revelação sobre os seus pais. É por isso que ela foi para a escuridão sob o templo Jedi, o que nos deixa pensando se a escuridão tivesse revelado seus pais, ela teria se voltado para o lado negro? Nós não sabemos. Rey sendo uma “ninguém” é profundamente importante para a reinicialização da franquia, e por isso espero que não seja uma mentira. A imagem final, com o jovem com o dom, que anseia em se unir a resistência, parece dizer que é verdade.

Ser um “ninguém” é o tema do filme. Não consegui parar de pensar na última piloto de bombardeiros e em seu sacrifício. A trama enfatiza o fato de que Finn costumava limpar sanitários e de que Rose era apenas uma técnica de manutenção. O que os diferencia não é quem eram seus pais, ou de onde eles vieram, é a sua bravura excepcional diante das dificuldades esmagadoras. Quando olhamos para todas as narrativas deste filme, tem muita coisa. Há Finn & Rose, há Poe & vice-almirante Amilyn Holdo, há Kylo & Rey e Rey & Luke. Cada trama tem algo muito original no universo de Star Wars, para falar sobre heroísmo e escolhas.

Consideremos Finn & Rose e suas próprias falhas e traições. Eles trabalham indubitavelmente com muita dificuldade, e se sacrificam muito, apenas para falharem — eles não conseguem destruir o dispositivo de rastreamento, eles não conseguem parar o canhão. Eles falham e falham e falham. Finn é literalmente e figurativamente, salvo por Rose, primeiro quando ela o impede de fugir em um pod de fuga, e então, quando ela o impede de se matar para parar o canhão. Enquanto que no final, “Nós não deveríamos destruir o que nós odiamos, nós devemos salvar o que amamos”, é uma frase excelente, espero que haja mais entregas disso no próximo, pois, foram poucos dos que amamos, que conseguiram ser salvos nesse filme. A construção de um triângulo amoroso me cansa um pouco, mas não estou convencida de que todos esses personagens vão viver no final. Veremos. Certamente será mais interessante e divertido, se todos viverem.

“Nós não deveríamos destruir o que nós odiamos, nós devemos salvar o que amamos”

Finalmente, para mim, o enredo mais surpreendente foi o de Poe & a Vice-Almirante. Eu amei cada parte dessa trama, pois eles reviraram completamente o caminho que uma história tradicional como essa seguiria. Nós esperamos que Poe esteja certo, que o motim seja uma estratégia inteligente, que a Vice-Almirante claramente não sabe o que está fazendo (mesmo quando nos dizem que ela foi uma heroína de guerra foda, durante outra batalha e que o Poe a admirava por isso). O filme brinca com as nossas expectativas de que o nosso herói está tomando a decisão certa, de que ele não é cego, de que mesmo que a vice-almirante esteja no comando, é o Poe que vai salvar o dia. No fim, Finn & Rose falharam, o motim de Poe foi mal pensado, e a vice-almirante realmente tinha um plano em mente — aproximar-se o suficiente da base rebelde para disfarçar o transporte de fuga e eles fugirem. Não havia nenhum motivo lógico de comando, para ela contar nada disso ao Poe — ela é a porra de uma Vice-Almirante e ele é só um piloto de caça! No entanto, as expectativas da história nos fizeram assumir que eles seguiriam outro caminho. No fim, a vice-almirante que se sacrificou e explodiu o navio de comando é que estava certa. Eles escreveram em letras garrafais: “acredite em mulheres”. Há uma razão pela qual essas mulheres estão no comando. Confie nelas. Ainda mais quando se trata da resistência, não é ter a maior arma que significa que você irá vencer, e sim, você ter as melhores táticas, que vai fazer você superar o inimigo. E não vemos isso com frequência, nem no universo de Star Wars, nem no nosso, o que tornou isso profundamente satisfatório de se assistir.

Então, enquanto eu saía da sessão eu pensava: “Bom, acho que esse foi um filme Star Wars”, mas, não me senti bem e agradecida do jeito que fiquei depois de assistir o Despertar da Força, porém, é claro que ainda estou pensando sobre o filme e suas escolhas, os temas e os personagens. E honestamente, estou pensando profundamente sobre o filme, o que não aconteceu depois do Despertar da Força. O Despertar da Força foi bem satisfatório e bom para passar o tempo. Esse foi tiro, porrada e bomba (*do original This was a thick, soupy goo, e quis abrasileirar um pouco), com muita merda acontecendo, e descobri que, embora não consiga admirá-lo por sua estrutura, é muito emocional e os seus fundamentos temáticos continuam me levando para a história de novo e de novo.

O que mais qualquer autor, pode esperar?

Que a Força esteja com vocês.

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Camila Novaes Maia

Procrastinadora e prolixa (não necessariamente nessa ordem). Adoro falar e escrever sobre literatura e cinema, mas me comunico melhor pela escrita (eu acho).