Como eu aprendi inglês sozinho?

Minha jornada com o idioma, técnicas utilizadas e fontes de estudo

Christian Costa
11 min readAug 31, 2019
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Escolas de ensino formal de idiomas

Escolas de inglês se tornaram um dos negócios mais rentáveis para empresários brasileiros de diversos portes. Estão espalhadas por todo lugar, são tão comuns quanto padarias, auto escolas, sorveterias, salões de beleza e oficinas mecânicas.
Mas ao contrário do que era de se esperar, a Lei da oferta e da procura parece falhar quando se trata dos custos de fazer um curso formal de inglês. Se você já procurou alguma vez escolas desse tipo sabe que estamos falando de mensalidades assustadoramente elevadas e gastos semestrais (ou trimestrais) altíssimos com material. Além de tudo essas instituições parecem desenvolver em seus alunos um bloqueio mental para “destravar”, uma insegurança irracional que gera uma eterna síndrome de inglês intermediário que os mantém presos ao curso.

Quando o pessoal da escola de inglês te fala os valores

Custear um curso formal de inglês representa um investimento altíssimo nosso ou de nossos pais, e em ambos os casos representa também um desequilíbrio financeiro. Entretanto quando esse investimento ameaça colocar o rendimento mensal da casa no negativo, restam duas opções: não aprender inglês ou dar um jeito de aprender sozinho. E foi por isso que eu decidi partir na minha jornada disposto a aprender por conta própria.

Minha motivação

Em 2017 eu tinha acabado de terminar o Ensino Médio e estava desempregado. Não queria fazer faculdade por que tinha “um monte de engenheiro com diploma e sem emprego”, mas o mercado de trabalho em crise tratou de me dar um soco no estômago dizendo:
“Você é um moleque que acabou de sair do E.M não tem experiência alguma, não sabe de nada e não produziu nada de relevante para a sociedade! Você apenas existiu e foi mantido de forma parasítica. Então é bom você mudar essa atitude ou vai continuar levando pedrada”.

O mercado é implacável. Eu sabia que teria que aumentar “meu valor no mercado”, e a principal forma de fazer seria aumentar meu leque de habilidades, caso contrário seria 7x1 atrás de 7x1.
Então eu comecei a pesquisar “Como aprender inglês”, “Aulas inglês iniciante”, “Inglês básico”… E logo depois ser bombardeado com os anúncios de professores de inglês no YouTube (que eu sempre pulava). Até que vi um anúncio do Mairo Vergara falando sobre o livro dele, onde ensinava técnicas de aprendizado do inglês. Baixei o livro, depois de ler percebi que tudo aquilo fazia sentido, então resolvi aplicar.

Falar menos e ouvir mais

A primeira coisa que me surpreendeu entre as técnicas apresentadas foi a de primeiro buscar compreensão dos que os nativos falam antes de se aventurar em desenvolver conversação. Afinal, antes de saber o que responder você precisa entender a pergunta. Meu primeiro contato com essa abordagem foi através do livro, mas algum tempo depois achei o Steve Kaufmann, poliglota que é adepto da mesma mentalidade para aprender novos idiomas.Essa ideia de entender MUITO antes de falar talvez seja alvo de críticas e desconfiança, pois deixa a balança da fluência (composta de listening, speaking, e writing) desequilibrada num primeiro momento. Por isso vale ressaltar que essa é apenas uma das várias abordagens possíveis, e a escolha de como fazer isso vai de cada indivíduo.

Quando você fica pedindo pro gringo repetir a mesma coisa pela vigésima vez

Estudando

O livro não somente me introduziu uma abordagem totalmente diferente do que eu pensava ser a metodologia ideal para aprender inglês como também me apresentou ferramentas muito úteis para melhorar os resultados do aprendizado.
Eu dividi meu estudo em duas partes principais: desenvolvimento de compreensão escrita e desenvolvimento de compreensão oral.

Memorizando tudo que eu lia com Flashcards

O uso dos flashcards é muito eficiente para sempre se lembrar de novas frases, palavras ou expressões no decorrer do estudo. O principal software pra isso é o Anki, que é basicamente uma versão digitalizada dos cartões de estudo.
De um lado coloca-se aquilo que deseja lembrar e do outro a resposta. Se for fácil lembrar o card vai pra uma pilha, se for difícil lembrar ou não lembrar vai pra outra.
Eu utilizava as seções “Como se diz em inglês”, “Qual a diferença em inglês”, “O que significa em inglês” no site do Mairo para alimentar criar meus cards. Na frente eu colocava a frase em inglês e no verso a tradução dela. Também dá pra colocar o áudio, mas alimentar o deck com frases novas é a parte mais chata do processo, adicionar áudio ia dar mais trabalho ainda e eu ficava com preguiça.
É recomendável adicionar cerca de 20 frases por dia, pois isso reduz o tempo de captação de frases e encurta o tempo de revisão.
Num ritmo de 20 frases por dia, isso dá 140 frases em uma semana e 560 frases em um mês.

Ao final eu acumulei pouco mais de 7000 cards no meu deck de Inglês

Ouvindo muito inglês nativo

Eu juro que essa publicação não é propaganda pro Mairo, mas também era do site dele que eu obtinha meus textos com áudio. Na seção “Aprendendo Inglês com vídeos” tem centenas de transcrições com tradução de vídeos curtos do YouTube, eu salvava a página em .pdf e baixava o video pra poder ouvir em segundo plano(dá pra fazer isso com o YouTube Go).
Depois de preparar o material eu lia o texto buscando palavras, expressões, e frases que eram desconhecidas. Em seguida eu lia o texto e ouvia o áudio simultaneamente várias e várias vezes, até memorizar tudo. E por fim eu abandonava o texto e seguia somente ouvindo o áudio

Eu fiz isso durante 359 dias! E meu melhor resultado foi de 194 dias seguidos!

Aplicativo Loop Habit

Escrevendo em inglês

Eu assistia vários e vários tutoriais de programação, tudo em inglês. E a maneira que eu encontrei de praticar minha escrita foi através das anotações que eu fazia. Ao invés de traduzir e escrever eu simplesmente escrevia, mesmo se saísse errado eu revisava depois e corrigia.
Algumas pessoas também usam diários para praticar todos os dias. Uma simples e breve descrição das tarefas feitas ao longo do dia já é suficiente para praticar.

Treinando a pronúncia dolorosamente

Esse é o ponto mais crítico ao estudar sozinho. Na escola de idiomas os professores podem te ajudar com nessa parte, mas ao estudar por conta própria, como eu sei que estou falando corretamente? E agora vem a resposta dolorosa: gravando você mesmo falando em inglês.
Sim, vai ser doloroso. Sim, vai dar vergonha alheia de si mesmo. Sim, vai sair uma m****. Mas é o preço.
Basta usar um app de gravação no celular, procurar uma frase ou texto curto, e gravar sua leitura. Assim fica mais fácil perceber onde está saindo errado. Depois é só repetir o processo até a pronúncia ficar boa.

O impacto do inglês ao iniciar minha carreira

No fim de 2017 fui contratado por um supermercado. Ainda naquele ano prestei o vestibular pro curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas.
Iniciei o curso em 2018, e aplicava pra todas as vagas de TI que apareciam. Eu queria sair daquele emprego e iniciar minha carreira na área de TI o mais rápido possível.
Em abril de 2018 fiz meu primeiro processo seletivo pra estágio. O site responsável pelo processo pedia a realização de um teste de inglês. Fiz o teste e passei. Na fase seguinte eu tinha que gravar um video em inglês. Gravei o vídeo. Até então eu nunca tinha falado uma palavra de inglês. O vídeo saiu horrível. Não passei.
Alguns meses depois outro processo seletivo começou, apliquei novamente, passei de fase novamente. Tive que gravar o vídeo novamente, mas dessa vez tive mais calma e passei.
A fase seguinte era o painel com gestores. A essa altura eu sabia que faria entrevista em inglês em algum ponto do processo. No dia do painel todos os candidatos tiveram que se apresentar. O processo foi todo em inglês, o slide com o script da apresentação estava em inglês. Quando chegou minha vez de falar não sabia se deveria seguir em português como o resto dos candidatos havia feito, ou se eles não “pegaram” que era pra se apresentar em inglês. Inclusive no slide havia o tópico “Qual seu nível de inglês?”.
Tinha poucos segundos pra decidir como me apresentar, e por fim me apresentei em inglês. Quando voltei pro meu lugar, sentei e pensei “Não devia ter feito isso”, mas já era tarde.
A etapa final era entrevista individual. Tivemos um intervalo para que os gestores escolhessem entre os 16 candidatos. Fui escolhido. A entrevista foi parcialmente em inglês. Consegui o estágio, me livrei do supermercado.

Pré requisito e não diferencial

Sem saber inglês eu não teria passado nem da avaliação curricular, e mesmo cursando uma graduação na área teria sérios problemas ao buscar oportunidades. Por isso, deixar de aprender inglês seja lá por qual motivo é negligenciar seu próprio futuro.

Lessons Learned

Ouvindo muito mais inglês nativo

Esse estudo direcionado pode ser bastante cansativo, por isso, além dos textos específicos eu recomendo fortemente assistir filmes, series e vídeos, ou ler livros e quadrinhos em inglês assim que sua compreensão melhorar. Dessa forma você estuda de uma forma mais leve e perde aquela rigidez que pode desacelerar o aprendizado.
Uma prática que fez meu estudo para compreensão decolar foi passar a ouvir podcasts. Esse tipo de mídia não tem legendas, mas a qualidade do áudio é muito boa e assim a clareza das palavras é muito vantajosa para o listening.

Não seja paranóico

Seu inglês só vai ser perfeito se você for americano, professor de inglês ou morar muito tempo na terra do Tio Sam. Não tenha essa ambição absurda de ser muito bom no inglês, caso contrário você entra num limbo interminável de “Estou aprendendo inglês”. Se as legendas não fazem falta você já é bom o suficiente, o resto da prática vem com o tempo.

Fatores que facilitam

Pra quem vive 100% em português o começo do aprendizado pode ser mais complicado, pois tudo é novo. Para os maratonistas de Netflix que assistem tudo legendado, talvez seja mais fácil porque mesmo que esteja legendado em português, os sons do idioma não são totalmente desconhecidos e algumas vezes assistindo dá até pra pegar uma frase ou outra.
Sendo assim, o nível de desconhecimento do idioma varia de pessoa para pessoa, e não é uma questão de “ser inteligente” e sim do contato prévio de cada um com o idioma.

“Ah mas você tinha tempo livre, por isso aprendeu mimimimimi”

Engole esse choro. E nem vem com esse papo de não ter tempo. Muito tempo livre é uma benção e uma maldição, é fácil deixar pra estudar mais tarde até que o “mais tarde” seja um dia antes da sua tão sonhada entrevista de emprego, que pro seu azar vai ser parcialmente ou totalmente em inglês.

Redes sociais

Essa suposta falta de tempo na verdade se chama “tempo inútil de tela”, e isso não é culpa sua, as redes sociais foram feitas pra prender sua atenção e te deixar em estado letárgico da hora que você acorda até a hora que você vai dormir. Se esse é o seu problema, um aplicativo que bloqueia essas armadilhas do tinhoso pra não deixarem você ser bilíngue pode ajudar a resolver essa questão.

Consistência no tempo de estudo

O mais importante ao desenvolver qualquer hábito é estabelecer uma meta realista. Não adianta de um dia pro outro falar “Vou estudar 3 horas de inglês”, pois não há um costume de estudar estabelecido e o tempo definido como meta é exagerado.
Se eu começasse a estudar hoje definiria 1h30 de estudo, sendo 15min recolhendo frases pro Anki, 15min para revisar os cards, e a hora restante fragmentada em 4 partes de 15min para ler o texto com áudio. Entretando rotina de estudo também é algo muito subjetivo que depende dos objetivos pessoais de cada um.

Transformando tempo inútil em tempo útil

Você deve ter reparado que no meu Anki há um deck chamado Spanish, isso porque uma vez superado o inglês meu novo objetivo é aprender espanhol, mas agora eu não tenho mais o tempo livre pra estudo que tinha em 2017. Preciso me organizar pra encaixar meu novo objetivo na minha nova rotina.
Se assim como eu você fica a maior parte do dia fora de casa, provavelmente gasta algumas horas se locomovendo, e esses são bons períodos para alocar o tempo de estudo. Dá até pra superar a uma meta diária de estudar 1h todos os dias. Sem falar que ao associar a rotina de pegar o busão com a rotina de estudar torna o hábito muito mais forte até que se torne automático.

Fontes de estudo recomendadas

Mairo Vergara (Todos os níveis)

Eu só aprendi inglês graças as técnicas que aprendi com esse cara. O livro dele é gratuito, e esse site é uma verdadeira mina de ouro! Tem os vídeos com transcrição citados, frases com exemplos, expressões do inglês, tem de tudo.
Também há muito conteúdo no canal do YouTube com aulas ao vivo e no Instagram com dicas de pronúncia. Simplesmente sensacional!

TED (Todos os níveis)

Ted é um site com várias palestras de pessoas influentes em diversas áreas do conhecimento, seja ciência, tecnologia, sociedade, literatura ou arte. Nesse site todos os vídeos tem transcrição e tradução, e podem ser uma alternativa para estudar usando textos com áudio. O aplicativo deles também é muito bom pra quem prefere estudar pelo celular, com possibiliade de ouvir em segundo plano e fazer download dos conteúdos. Uma ótima fonte para estudar o idioma e ao mesmo tempo aprender coisas interessantes.

Thomas Frank/College Info Geek (Intermediário)

O Thomas é criador do College Info Geek, um blog sobre técnicas de estudo que se tornou um canal do YouTube, e logo depois um podcast. Ele produz muito conteúdo interessante pra quem é estudante ou é interessado em aprender coisas novas. Todos os vídeos dele tem muito embasamento bibliográfico e o inglês dele é bastante claro. Além disso vários videos tem legendas em inglês. Não apenas um ótimo canal para estudar inglês, mas também um dos melhores canais do YouTube.

Matt D’Avella (Intermediário)

O Matt é um videomaker relativamente novo na plataforma, começou a publicar conteúdo há cerca de dois anos. Seus vídeos tem uma qualidade visual absurda e ele fala com bastante clareza. Ele também é host no próprio podcast The Ground Up Show, onde entrevista pessoas que tem ideias pra compartilhar sobre empreendedorismo, minimalismo e carreira.

TED-Ed (Básico)

Você já ouviu a expressão “entendeu ou quer que desenhe”? Essa é a pegada do TED-Ed, animações que explicam! O TED-Ed é um spinoff do anteriormente citado TED, que ilustra através de animações incríveis fatos sobre história, ciência e política. Todos os vídeos tem transcrição e a maioria também tem tradução. Os vídeos também são narrados num ritmo mais lento o que facilita bastante a compreenão para iniciantes, além disso por serem desenhos as associações visuais ajudam na hora de lembrar das coisas. Um canal muito enriquecedor não apenas para estudar o idioma mas também aprender.

Joe Rogan Experience (Avançado)

O Podcast do Joe é um dos melhores e mais divertidos! A qualidade do áudio é de primeira, e as entrevistas são sensacionais. Podcasts podem dar um boost no seu aprendizado, pois são puro listening. Eu gosto de podcasts pois não demandam preparação de material nem leitura de legendas/scripts, basta colocar os fones e ouvir em qualquer lugar.

Canais específicos

Se você curte programação, ciência da computação e desenvolvimento web, eu ainda indico os canais Sentdex, Traversy Media, freeCodeCamp, Computerphile e Harvard CS50 com tutoriais sobre Python, Javascript, C/C++ e mais uma tonelada de conteúdos.

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Christian Costa

“Pelos livros que eu tive acesso minha obrigação é espalhar pro resto”