Uma despedida

Claudio Leal Neto
6 min readApr 1, 2016

Olá para todos vocês que começaram a ler este texto. Agradeço por sua curiosidade, o apresso ou a atenção, pois este é um texto de despedida.

Antes de começar a ler, pare, dê o play em alguma música que te deixa feliz ou simplesmente a primeira que vem a tua cabeça, pois eu não consegui escolher uma para este texto.

Como muitos de vocês já sabem, desde 2006 eu venho sofrendo com algo chamado Síndrome do Pânico e isto não é somente algo da minha cabeça.

Em um texto recente, expus meus sentimentos a respeito destas reações químicas que acontecem em meu cérebro e toda a dor que elas meu causam. Não gostaria de chegar ao ponto onde cheguei, mas não nego que ele sempre esteve em algum ponto da minha vista desde que me recordo por gente, aos 4 anos de idade.

Você talvez esteja se perguntando que ponto é este, que despedida é esta. Eu lhe respondo de forma simples e direta: Isto é uma carta de suicídio. Sim, assim como nos filmes, livros e contos, quando você estiver lendo este texto eu provavelmente não estarei mais vivo.

Você se perguntará o porquê, talvez se perguntará o que você fez ou o que poderia ter feito para impedir que isto acontecesse. Não se preocupe, não se culpe, pois não é sua culpa ou responsabilidade uma decisão tão particular quanto esta.

O porquê é relativamente simples, eu não consigo mais encarar essa situação. Muitos serão os que vão dizer que eu deveria ter tentado mais, que havia alternativas e todo o resto que pode ser dito a respeito. Não discordo de vocês, mas a questão sou eu. Sou eu quem não consegue mais lidar com esse medo, essa agonia, esse desespero trucidante que ocorre durante uma crise, essa desespero que imobiliza por completo. Você está bem, de repente não está, tudo ao redor perde o sentido, você não consegue se focar, só consegue sufocar nesta agonia e rezar para que ela termine logo, para que ela não volte ao menos por hoje.

Eu sei que é, de várias formas, egoísmo da minha parte, que esta minha decisão causará muita tristeza naqueles que se importam comigo, sei que outras pessoas sofrem muito mais do que eu, mas como eu já disse no outro texto, o sofrimento alheio não alivia o meu, pelo contrário. Lembre-se, eu lutei por 10 anos contra isso, caí e levantei incontáveis vezes, mas agora eu sinto que não consigo mais levantar e eu lhes peço perdão por entregar os pontos assim. Muitos foram os que se ofereceram para me ajudar e eu vos agradeço de todo o coração, mas durante a crise ocorre uma batalha onde estou sozinho dentro de minha própria mente, eu contra eu mesmo e por mais que eu tenha tentado, o medo de continuar existindo assim superou o medo do que me espera do outro lado, pois eu quero acreditar com todas as minhas forças de que não há um outro lado.

Enquanto este problema imobilizava somente a mim, eu aceitei e lutei o quanto pude. Agora ele passou a afetar a vida da minha irmã e da minha mãe. Agora, quando uma delas viaja eu fico em crise, querendo que elas não saiam ou voltem logo. Não posso permitir que este meu problema impeça elas de viver e faça com que elas fiquem amarradas a mim. Eu simplesmente não suporto está ideia. Da mesma forma este problema tem me impedido de ficar junto do meu pai, tanto para ir até a casa dele quanto para ele vir até aqui em casa.

Este é um ato sim, de desespero. Eu nunca conseguiria uma justificativa lógica e verdadeira para esta decisão.

Só tenho, assim como o Alladin, três pedidos para fazer a todos vocês. Aos que se importam comigo, apoiem minha família como eu não pude, se aproximem não somente no dia de meu enterro. Aos que se importam com a situação, ajudem a outros que, assim como eu, sofrem deste problema. A todos, perdão. Procurem lembrar de mim de forma feliz, não pelo ato que acabei de cometer.

Meu pai é um homem realmente muito valente, pois ele enfrentou isso sozinho por quase toda a minha vida sem nem ao menos saber do que se tratava, sem nem ao menos ser medicado ou tratado e ainda sim, nunca perdeu a doçura e este coração imensamente lindo que ele tem. Ele se recolheu sim, se trancou como eu, mas sempre se manteve doce e enfrentou o problema de frente por muito mais tempo do que eu.

Minha mãe é uma guerreira também, embora as batalhas tenham sido diferentes, não fica devendo em nada ao meu pai. Lutou por todos estes anos para sustentar os filhos, voltou a estudar, fez curso de técnico de enfermagem e chegou a ter dois empregos para conseguir botar alimento dentro de casa enquanto meu pai enfrentava completamente só este inferno em vida.

Meu avô…ah, meu avô. Eu teria de escrever milhares de textos para descrever o tamanho do meu amor e admiração por este homem e não caberia em uma vida o quanto eu lhe sou grato.

Minha irmã sempre foi uma figura e tanto. Sempre te amei e me preocupei contigo, mesmo que as vezes tenha dado a entender o contrário. Você é linda, principalmente por dentro. Tenho orgulho da mulher que se tornou, só não pode esquecer da tua essência.

Eu tive sim, uma linda família, com uma avô paterna carinhosa, uma irmã bagunceira mas zelosa, uma prima bruta mas de um amor irrefutável, uma tia madrinha mãe que me amou antes mesmo de eu pensar em existir. Tive também uma avô materna divertida e carinhosa e belos primos, tios, amigos.

Ana Paula, eu te amo e sempre te amei com todo o meu coração, de formas que eu nunca achei que pudesse amar uma mulher. Perdão por qualquer lágrima que eu já te fiz derramar. Você sabe que esta minha decisão não tem nada a ver com nós dois, certo?!

Carol Martins, embora tenhamos passado pouco tempo juntos, você foi a pessoa mais doce e pura que passou pela minha vida.

Meus brothers, putos e afins. Obrigado por todas as loucuras e risadas que demos juntos. Continuem lembrando desses momentos e rindo. Não deixem as zueira morrer, não deixem a zueira acabar, o mundo precisa de zueira, zueira pra gente zuar.

Ao site Flatout e à toda comunidade gearhead. Muito obrigado por todo o aprendizado. Infelizmente vocês não verão a minha Belina Del Rey com um V8 central-traseiro e 650cv. Não deixem as peruas morrerem, façam eventos para promovê-las e aproveitem para divulgar informações sobre as doenças relacionadas à ansiedade. Isso vai ajudar muitas pessoas.

Muito, muito obrigado por tudo o que todos vocês fizeram por mim, só tenho coisas boas por todos vocês e perdão pela dor que estou lhes fazendo sentir.

Quero que minhas roupas sejam doadas, minhas ferramentas e gadgets sejam vendidas e que meu computador permaneça com a minha família, pois nele há mais de 14.000 fotos que guardei com carinho por todos estes anos.

Para finalizar, gostaria de escrever uma canção escoteira que sempre mexeu muito comigo:

Por que perder as esperanças de nos tornar a ver?
Por que perder as esperanças, se há tanto querer?
Não é mais que um até logo, não é mais que um breve adeus
Com nossas mãos entrelaçadas, ao redor do calor
Formemos nesta noite um círculo de amor
Bem cedo junto ao fogo, tornaremos a nos ver
Pois o senhor que nos protege e nos vai abençoar
Um dia, certamente, vai de novo nos juntar

Eu gostaria muito, muito que meu corpo fosse cremado e as cinzas lançadas para fora da órbita do planeta. Se esta carta chegar a alguém com possibilidades de realizar isso, seria um imenso favor. Conto contigo Elon Musk, tanto para realizar isso quanto para tornar o planeta um lugar melhor, junto com a Bill&Melinda Gates Fundation, pois admiro muito o trabalho de vocês e um dos meus objetivos era poder realizar algo similar.

Se o parágrafo acima não for possível, gostaria que meus órgãos fossem doados aos que precisam e meu cérebro possa ser doado para estudos relacionados ao meu caso. Se não for possível doar, quero que parte das cinzas sejam espalhadas no terreno do meu pai, nos vasinhos de planta da minha mãe, sob o túmulo do meu avô e um finzinho sob onde o Pluck está enterrado na minha antiga casa

Um beijo na bunda de cada um, sorria, embora eu tenha partido, olhe ao seu redor e veja o quanto você pode viver de bacana. Viva e viaje por mim da forma que eu adoraria ter feito.

Sorria e seja tão panaca quanto eu

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