A saga por reconhecimento

Em feiras de livro ou nas livrarias o espaço dos escritores catarinenses é o mesmo: pequeno.

Portal Cotidiano
8 min readMay 18, 2015

Texto, fotos e ilustrações de Priscila dos Anjos

Em destaque na banca de livros, as cópias do Jardim Secreto, de Johanna Basford, dividiam o espaço com outros best-sellers na oitava edição da Feira Catarinense do Livro. Chegando ao evento com a ilustradora Maria Lúcia Rodrigues, a escritora Elizabeth Fontes observando as cópias dos livros de colorir comentou: “Malu, Sobre os Jardins aqui ó”. Em frente à banca a escritora e a ilustradora iriam expor suas obras conjuntas: História de uma Aquarela e Sobre os Jardins.

Era o oitavo dia da feira que ocorreu de 6 a 16 de maio em Florianópolis, e 16 autores catarinenses já haviam ocupado o último estande da grande tenda montada no Largo da Alfândega. Um letreiro exibia a palavra escritores, em caixa-alta, na cor preta, para indicar que aquele espaço com duas cadeiras e uma mesa de plástico era destinado aos escritores catarinenses. Com os livros já expostos em uma prateleira de alumínio e ilustrações originais de “Sobre os Jardins” em folhas A3 coladas nas paredes do estande, Elizabeth e Maria estavam prontas para vender seus livros e encontrar leitores.

Os livros Jardim Secreto e Sobre os Jardins podem ter o nome parecido e possuírem muitas ilustrações, mas as semelhanças param por aí. Enquanto o primeiro — que é sucesso de vendas e tem cerca de 100 mil exemplares vendidos no Brasil — têm desenhos simétricos sem cor, o segundo, com tiragem de mil exemplares, traz textos e imagens que fazem relações entre os elementos de um jardim e a vida. “Na verdade existe um confronto, por que aqui você tem toda uma reflexão, uma história um contexto filosófico, ilustrado a mão, não há uma reprodução de imagens padronizadas. Enquanto o outro, tirando as proporções, é um livro que não trabalha com a criatividade, a pessoa só pratica o exercício do manuseio com as cores” disse Elizabeth Fontes.

A parceria entre Maria Lúcia e Elizabeth começou pela internet em 2012, quando a escritora morava na Colômbia e procurava um ilustrador para sua obra História de uma Aquarela. Uma amiga em comum indicou Maria Lúcia, que morava em Joinville, para o trabalho. Por causa da distância, o primeiro livro foi feito sem as duas se conhecerem. Com o livro publicado e Elizabeth morando em Joinville, nasceu Sobre os Jardins, publicado pela editora universitária Univille em agosto de 2014.

Os dois livros foram patrocinados por um edital, em Joinville. Há dois na cidade: o de Apoio à Cultura, que contemplou a escritora e ilustradora, e o Mecenato Municipal. Ambos oferecidos pelo Sistema Municipal de Desenvolvimento pela Cultura (Simdec). “A área cultural em Joinville fervilha muito por meio dos editais de cultura, porque a gente sabe que viver disso ainda é muito difícil sem ter um empurrão ou uma ajuda de recursos” frisou Maria Lúcia.

Também contemplado por editais de cultura de Joinville, o escritor Jura Arruda publicou dois livros. O escritor esteve presente no primeiro dia da feira de Florianópolis, no estande para escritores catarinenses. Seu primeiro livro: Fritz, um sapo nas terras do príncipe, foi lançado em 2007 pela editora Letra D’água com auxílio de edital. Arruda escolheu escrever seu livro sobre a colonização alemã na cidade para mostrar a cultura local de Joinville. “Em Santa Catarina a nossa autoestima cultural é muito baixa, então eu quis escrever um livro que se passasse em Joinville na época da colonização.”

O personagem principal da história é Fritz, um sapo alemão que fica sabendo, em 1850, que um navio irá para a cidade dos príncipes, como Joinville é conhecida. “Então o sapo que tem mania de realeza diz: opa eu estou indo para lá” explica o escritor. 

Espaço restrito nas livrarias

Nos dias em que não há feira de livro em Florianópolis, as publicações de escritores catarinenses podem ser encontradas no final de estantes ou atrás de escadas. A escritora Katia Rebello, que têm nove livros publicados, acredita que os escritores locais não são valorizados pelas livrarias. “Não adianta ceder uma estante somente para escritores catarinenses, para facilitar a busca do vendedor, e a colocar embaixo da escada, atrás das teias de aranha, aonde o leitor alérgico jamais vai procurar. Precisamos repensar a divulgação dos nossos autores”.

Diferente de Katia, Milka Plaza teve que custear a impressão de 500 exemplares do seu primeiro livro, na editora da UFSC. Na feira do livro, Milka expos três antologias, uma fábula infantil e um livro de poesias publicados de forma independente. A escritora também acredita que os autores catarinenses deveriam receber mais destaque nas livrarias “Há muito tempo fui à Livrarias Catarinense, para falar com o gerente e perguntar por que não valorizam os escritores locais. Acho de tanto que eu reclamei eles abriram um espaço para esses escritores, mas eles colocam os livros lá embaixo, onde ninguém vê” relata.

Segundo a gerente das Livrarias Catarinense da Grande Florianópolis, Rosinete Werle, as lojas buscam amparar os autores catarinenses e independentes por meio de difusão das obras na agenda cultural da rede, e da divulgação dos lançamentos, com o trabalho da assessoria de imprensa.“Como a produção independente tem um custo alto, muitos autores não tem condições de fazer a divulgação de sua obra para a sociedade, fora de seu círculo social, para isso oferecemos um espaço em nossa agenda cultural, que vai de março a novembro, com eventos gratuitos em toda a programação” disse Rosinete Werle.

Em Joinville, a livraria Midas organizou há cerca de quatro anos uma estante com escritores catarinenses, na entrada da loja. Segundo o escritor Jura Arruda, isto ocorreu após a fundação da Confraria do Escritor, um espaço onde os escritores da cidade se encontram para trocar experiência e discutir projetos literários. “Com isso nós conseguimos, por exemplo, que a livraria Midas criasse um espaço específico para os escritores catarinense. Então você entra na livraria e bem lá na frente você pode encontrar os livros dos escritores regionais”. Para a escritora Elizabeth Fontes a iniciativa é importante para mostrar à cidade que há produção literária local. “As pessoas entram na livraria e falam: que legal, quantos escritores joinvilenses”.

Escritores independentes apostam no mercado digital de livros

Escrever, editar, registrar o ISBN e enviar manuscritos para editoras. Publicar um livro pode ser difícil, e principalmente se é o primeiro e você é desconhecido. Depois de passar por todo esse processo, e com o primeiro livro publicado, a catarinense L.L Alves, se deparou com mais um entrave: o preço pouco acessível do exemplar. A publicação foi feita por uma editora que opera sob demanda, no lançamento a edição chegou a custar R$ 60 no site da empresa.

A publicação digital foi a solução encontrada pela escritora. A escritora escolheu o portal Amazon para vender seu livro, pois notou que era o mais utilizado pelos autores que conhecia. Segundo L.L Alves o site é ótimo para o autor em começo de carreira. “Todo o site é projetado para que o autor saiba exatamente quantos e-Books vendeu e qual o valor recebido por cada venda. A clareza de vendas me surpreendeu e toda a facilidade que encontrei ao tentar usá-lo pela primeira vez me deixou encantada”.

Ao publicar seu e-book na Amazon, o autor pode lucrar até 70% do preço de cada unidade vendida. O próprio escritor define o preço do e-book — entre um valor mínimo e máximo — e recebe de acordo com o royalty selecionado 35% ou 70%. No caso da escritora L.L Alves, se o “Instituição para jovens prodígios” custar R$1,99, ela receberá R$0,70 (35%) por livro vendido.

Mas nem todo livro pode custar R$ 1,99 na Amazon. Desde que o mercado dos livros digitais entrou no Brasil, em 2007, o alto preço dos e-books tornou-se um tema polêmico para consumidores e editoras. O preço dos e-readers (leitores digitais) são apontados como uma das causas do alto preço dos livros digitais. Tramita no Congresso Federal um projeto que moderniza a atual Lei do livro brasileira. Um dos objetivos do projeto é atualizar o conceito do que é considerado livro no país. Se aprovado irá equiparar leitores digitais, fabricados no Brasil, aos livros. O que garante a isenção dos impostos na venda de aparelhos de leitura, pois no Brasil a venda e a fabricação de livros são isentas de tributação. A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, mostra como o preço dos e-books e dos e-readers interfere na penetração da leitura de livros digitais. Segundo a pesquisa dos 9,5 milhões de leitores de livros digitais, 57% são da Classe A.

Para a autora, a publicação de seu livro em formato digital foi uma ótima experiência “saber que seu livro está alcançando mais e mais leitores dá aquela sensação de dever cumprido. Já estou recebendo feedback positivo desses novos leitores que me encontraram pela Amazon, ao acaso, e posso afirmar que é uma área para se investir e muito!”. Atualmente L.L Alves tem três livros digitais à venda na Amazon: Instituições para jovens prodígios: a seleção, Instituições para jovens prodígios: a traição e Mudanças. A autora começou a escrever com apenas 13 anos, e é formada em Língua e Literatura Inglesa pela Universidade Federal de Santa Catarina.

--

--