Cesar Bandeira
5 min readJun 6, 2024

A Revolução Industrial e os movimentos operários

A classe operária é um produto de um desenvolvimento do modo de produção capitalista após uma ‘acumulação primitiva’ possibilitada pela expansão do comércio internacional através das grandes navegações no período que conhecemos como mercantilismo. A Revolução Industrial juntamente com nascimento do capitalismo e as novas condições econômicas permitiram o uso em grande escala dos progressos científicos e técnicos. No entanto esse período não deve só como essa gama de novas tecnologias, mas sim a partir de uma mudança na estrutura social determinada e não só pela substituição da ferramenta pela máquina, mas também da separação do Ser Social dos seus meios de produção. A Revolução Industrial foi uma consequência desse processo histórico.

“A Revolução Industrial e sua difusão, primeiro na Europa e depois, com ritmos extremamente diferenciados, pelo restante do mundo, alterou drasticamente as condições de existência da população humana, impondo lhe um ritmo geométrico de crescimento, que superou o ritmo aritmético que tinha seguido em toda a história humana precedente. Foi, portanto a grande ruptura na história humana” (COGGIOLA, 2016, p. 04)

Com essa escalada em proporções exponenciais o capitalismo parte para uma fase na qual o cria sua própria forma de produção, na unidade produtiva em grande escala (a fábrica) na qual se consuma, definitivamente, a separação entre produtor, agora operário e os meios de produção, agora sob o usufruto privado do capitalista. A Revolução Industrial foi segundo Eric Hobsbawm, o processo de transformação mais radical das condições de vida da sociedade de que se tem noticia através de documentos escritos. Essa “radical transformação da vida humana” criou o trabalhador “livre”, que possuía apenas a sua força de trabalho e se vendo obrigado a vende-la em troca de um salário para garantir a sua sobrevivência.

Mas quem eram esses operários? A classe operária surge da dissolução do feudalismo caracterizado pelas relações de vassalagem (senhor/servo), e os cercamentos impostos a essa população de agora “homens livres”.

“A agricultura inglesa desenvolveu-se com o cercamento dos campos e a difusão de novas técnicas e instrumentos de cultivo. O fim do uso comum das terras gerou o trabalhador livre”, expulso do campo, onde não tinha mais condições de sobrevivência, transformado em mão-de-obra urbana.” (COGGIOLA, 2016, p. 12)

Os cercamentos provocaram também um brutal desemprego na área rural, com os camponeses e suas famílias perdendo os lotes de onde tradicionalmente tiravam o seu sustento. Os cercamentos foram chamados de “revolução dos ricos contra os pobres”. Os senhores e nobres estavam perturbando a ordem social, destruindo as leis e os costumes tradicionais, pela violência ou intimidação e pressão. E é com essa violência e exploração que se abre o campo de condições para a “acumulação primitiva de capital”.
As origens das mobilizações dos operários: Na Inglaterra, a agitação operária percorreu todo o século XVIII, em especial movimento de “destruidores de máquinas”, que se desenvolveu a partir de meados do século XVIII, Os luditas (o termo “Luddita” vem do nome de Ned Ludd que, aborrecido com seu patrão, quebrou a marteladas os teares da oficina deste e tomou-se símbolo lendário, além de líder, do movimento) invadiam fábricas e destruíam máquinas que, por incrementarem a produtividade dos trabalhadores, tiravam também seus empregos, requerendo, contudo, duras horas de jornada de trabalho.

“Em uma carta ameaçadora que Ludd endereçou a um certo empresário de Hudersfield, em 1812, lia-se: ‘Recebemos a informação de que é dono dessas detestáveis tosquiadoras mecânicas. Fica avisado de que se elas não forem retiradas até o fim da próxima semanal eu mandarei imediatamente um de meus representantes destruí-las… E se o Senhor tiver a imprudência de disparar contra qualquer dos meus homens, eles têm ordem de matá-lo e queimar sua casa’.” (COGGIOLA, 2016, p. 39)

Reprodução: uncarved.org

A legislação tornou-se cada vez mais repressiva: todo indivíduo sem trabalho ou ocupação podia ser preso ou chicoteado e, em caso de furto, mesmo que fosse para matar a fome, ser marcado a ferro, ter as mãos decepadas ou ser enforcado. O Parlamento britânico a sancionar em 1769 uma lei que punia a destruição de fábricas e máquinas com a pena de morte. Posteriormente a Poor Law Amendment Act passou a vigorar, prevendo a construção de workhouses — casas de trabalho — para onde os desempregados eram levados e obrigados a trabalhar, às vezes até por 14 horas diárias.
As casas de trabalho eram odiadas pelos trabalhadores e a luta contra sua implantação levou a várias revoltas no norte da Inglaterra, sendo uma das causas do surgimento do um novo movimento conhecido como ‘cartista’. A primeira grande organização política operária, o cartismo inglês, assim chamado por basear-se na Carta do Povo, que seria “proclamada” em 1838. A estratégia utilizada pelos cartistas girava em torno da coleta de assinaturas, que era realizada nas oficinas, nas fábricas e em reuniões públicas, através de uma série de petições nacionais, enviadas à Câmara dos Comuns.
A influência do movimento cartista foi decisiva para o surgimento do comunismo operário, impulsionado por Karl Marx e Friedrich Engels, ambos alemães. Engels teve uma participação direta na revolução de 1848 (Primavera dos povos) na Alemanha, inclusive como líder militar.
Em 1833 os trabalhadores ingleses organizaram os primeiros sindicatos (trade unions) sob a forma de associações de base local, ou por ofício, para obter melhores condições de trabalho e de vida.

“Gradativamente, as associações conquistaram a proibição do trabalho infantil, a limitação do trabalho feminino, o direito de greve, a limitação da jornada de trabalho, o que teria efeitos decisivos para os trabalhadores: as horas de trabalho por semana para trabalhadores adultos nas indústrias têxteis eram, em 1780, em torno de 80 horas por semana; em 1820, 67 horas por semana; em 1860, 53 horas por semana. O processo de organização se acelerou e também tornou-se mais denso.” (COGGIOLA, 2010, p. 18)

As primeiras grandes vitórias da classe operária na luta em defesa da força de trabalho contra o capital (por exemplo, a conquista da jornada de 10 horas de trabalho) foram produto de movimentos de natureza e conotações claramente políticas.

Bibliografia
COGGIOLA, Osvaldo. Da revolução industrial ao movimento operário. As origens do mundo contemporâneo. Disponível em:< https://www. researchgate.net/publication/287205625_Revolucion_Industrial_e_Movimento_Operario_As_origens_do_mundo_contemporaneo> Acesso em 26/05/2024

COGGIOLA, Osvaldo. Movimento e pensamento operário antes de Marx. 1991.

COGGIOLA, OSVALDO. Os inícios das organizações dos trabalhadores. Revista Aurora, v. 3, n. 2, 2010.