Rolihlahla Mandela: a voz da resistência que não foi silenciada

Daniel Lucas
7 min readJul 24, 2024

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O líder político que dedicou sua vida à luta por direitos humanos, se tornando inspiração e figura emblemática para movimentos sociais diversos.

Foto: Arquivo internet.

“Lutei contra a dominação branca e contra a dominação Negra, e idealizei uma sociedade democrática e livre em que todas as pessoas possam viver juntas em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal pelo qual vivo, mas se for preciso estou preparado para morrer por ele.”, esse foi seu último discurso público por quase 30 anos feito por Nelson Mandela.

Com determinação e paciência, Mandela mostrou que mesmo uma prisão perpétua — e todo o racismo e negligência com as pessoas privadas de liberdade, que se intensificava de acordo com a cor de pele — era possível manter seu espírito diante de toda repressão que tentava retirar a sua força de luta.

Todas essas e outras ações violentas do governo visavam destruir o ânimo de luta. E o governo colonizador acreditava que em cinco anos todos os líderes do movimento presos seriam esquecidos.

Contudo, a luta continuou, e em 1985 o governo tomou uma decisão dramática, oferecendo liberdade para que Mandela renunciasse à causa que estava para levar o país a uma guerra civil e se afastasse do movimento. Entretanto, Mandela recusou a oferta dizendo: “Não posso aceitar e não irei aceitar nenhuma oferta até que eu e vocês, o povo, sejamos livres”.

Diante de tamanho espírito e admiração pela resistência, Nelson Mandela, nascido em 18 de julho de 1918, ganhou uma homenagem anual no Dia Internacional Nelson Mandela. Instituída em 2009 pela Organização das Nações Unidas (ONU), essa data não apenas celebra o legado de Mandela, mas também encoraja as pessoas a dedicarem 67 minutos do seu tempo a atividades que beneficiem suas comunidades, simbolizando os 67 anos de serviço público de Mandela.

Em celebração à data, este artigo aborda sua jornada e os impactos de Nelson Mandela na sociedade local da África do Sul e nos movimentos de resistência pelo mundo. A luta pela desigualdade social ganha outros aspectos.

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Vida e Formação

Rolihlahla Mandela, mais tarde conhecido como Nelson, nasceu na aldeia de Mvezo, na região de Transkei, África do Sul. Filho de um chefe tribal, sua infância foi marcada pela vida simples e tradições africanas. Crescendo em uma sociedade totalmente negra, Mandela só teve contato com o mundo branco aos sete anos, quando seu professor renomeou-o como “Nelson” em seu primeiro dia de aula. Esta prática era comum na época, uma tentativa de tornar os nomes africanos mais aceitáveis para a sociedade branca colonizadora.

Mandela foi educado em uma escola metodista e depois na Universidade de Fort Hare, a primeira instituição de ensino superior a aceitar estudantes negros na África do Sul. Lá, ele começou a se envolver em atividades políticas e a desenvolver seu senso de justiça social. Seu envolvimento em greves estudantis o levou a ser expulso, mas ele continuou seus estudos de Direito por correspondência na Universidade da África do Sul (UNISA).

A Colonização Branca e Suas Consequências

A colonização branca na África do Sul trouxe consigo um sistema de segregação racial severo e institucionalizado, conhecido como apartheid, que subjugava a população negra e negava-lhes direitos básicos. Os negros eram forçados a viver em áreas separadas, com acesso limitado a educação, saúde e oportunidades de emprego. A discriminação era legalmente sancionada e permeava todos os aspectos da vida.

Os movimentos negros, como o Congresso Nacional Africano (CNA), surgiram em resposta a essa opressão. Fundado em 1912, o CNA foi uma das principais organizações a liderar a resistência contra o apartheid, utilizando inicialmente métodos não violentos como boicotes, greves e protestos pacíficos.

Um evento significativo foi o massacre de Sharpeville em 1960, onde a polícia sul-africana disparou mais de 700 vezes contra manifestantes, matando 69 pessoas e ferindo outras centenas. Este evento marcou um ponto de virada na luta contra o apartheid, levando o CNA a adotar uma abordagem mais militante.

Luta Contra a Colonização e o Apartheid

Mandela se juntou ao CNA em 1943, dedicando-se à luta contra o apartheid. Em 1944, co-fundou a Liga Jovem do CNA, que pressionava por ações mais radicais contra o regime. Em 1961, após a repressão violenta do governo, Mandela co-fundou o uMkhonto we Sizwe (A Lança da Nação), a ala militar do CNA, que conduziu sabotagens estratégicas contra alvos governamentais.

Em 1962, Mandela foi preso e, durante o julgamento de Rivonia em 1964, foi condenado à prisão perpétua. Passou 27 anos encarcerado, principalmente na Ilha Robben, onde se tornou um símbolo global da resistência contra a opressão racial.

Banimento e Perseguição

Antes de sua prisão, Mandela enfrentou severas restrições impostas pelo governo. Ele foi banido, o que significava que não podia participar de reuniões públicas, falar com mais de uma pessoa ao mesmo tempo ou até mesmo participar da festa de aniversário de seus filhos. Essa restrição visava silenciá-lo, mas Mandela continuou a lutar clandestinamente, organizando e inspirando resistência. Com o CNA banido, Mandela passou a agir clandestinamente, criando uma imagem romântica e heroica, especialmente entre os jovens negros sul-africanos.

Ação Não Violenta e Desobediência Civil

Mandela e seus companheiros do CNA conduziram campanhas e movimentos civis, como a Campanha de Desobediência Civil de 1952, onde milhares de sul-africanos negros desobedeceram leis raciais injustas, arriscando suas vidas e liberdade para protestar contra o apartheid.

Esses atos de resistência não violenta mostraram ao mundo a brutalidade do regime sul-africano e galvanizaram apoio internacional para a causa.

Ascensão Profissional e Redes de Contato

Profissionalmente, com seu amigo Oliver Tambo, Mandela abriu o primeiro escritório de advocacia negro na África do Sul. Este escritório se tornou um ponto de referência para todos os negros que enfrentavam problemas legais.

Mandela se destacou como um advogado brilhante, interpelando testemunhas e desafiando juízes brancos com sua inteligência e determinação, o que frequentemente irritava o sistema judicial racista.

Contribuições como Presidente

Como presidente, Mandela trouxe inúmeros benefícios para a população sul-africana. Ele promoveu políticas de inclusão social e justiça, expandindo o acesso à educação, saúde, água e eletricidade para comunidades anteriormente negligenciadas.

Seu governo também focou na construção de uma nação unificada, implementando a Comissão de Verdade e Reconciliação para lidar com os crimes do apartheid e promover a cura nacional.

Liderança e Transformação

Mandela defendia que paixão gera perseverança. Sua firme convicção em sua causa alimentou sua determinação em lutar contra o apartheid, mesmo após décadas de prisão. Ele abraçou a mudança, reconhecendo que a transformação traz desafios, mas enfatizou a importância de manter o foco na visão e enfrentar os obstáculos com coragem.

Mandela acreditava que a liderança pelo exemplo era fundamental, exemplificando os valores que defendia, como tolerância, inclusão e esperança.

Reconciliação e Perdão

Mandela enfatizou a importância do perdão para a cura e reconciliação. Ele transcendeu a raiva e o ressentimento, demonstrando a libertação que o perdão pode trazer. Priorizava o diálogo respeitoso e a cooperação para resolver conflitos de forma duradoura, em vez de buscar a vitória a qualquer custo.

Direitos Humanos e Dignidade

Mandela acreditava firmemente que todos os seres humanos merecem ser tratados com respeito e dignidade, independentemente de suas circunstâncias. Ele defendeu o acesso à educação como uma ferramenta poderosa para transformar o mundo e melhorar as oportunidades para os jovens. Mandela enfatizou que devemos julgar as pessoas não por seus sucessos, mas por quantas vezes elas se levantaram depois de cair.

Contribuições e Atividades Pós-Presidência

Mesmo após deixar a presidência em 1999, Mandela continuou a ser uma voz ativa na luta contra a AIDS e em iniciativas educacionais. Fundou a Nelson Mandela Foundation, que promove o diálogo e a justiça social, e o Nelson Mandela Children’s Fund, focado no bem-estar infantil.

Em 2015, a ONU adotou as Regras de Nelson Mandela para o tratamento de prisioneiros, refletindo seu compromisso com a dignidade humana. Essas regras estabelecem padrões mínimos para o tratamento de detentos, assegurando que sejam tratados com respeito e que seus direitos sejam protegidos.

Legado Duradouro

Nelson Mandela faleceu em 5 de dezembro de 2013, mas seu legado persiste como um símbolo de resistência, paz e reconciliação. Ele demonstrou que a luta pela justiça pode ser travada com dignidade e que o perdão e a reconciliação são essenciais para a construção de um futuro melhor. Suas contribuições para a política, os direitos humanos e a justiça social continuam a inspirar e guiar movimentos por um mundo mais justo e igualitário.

Mandela nos deixou um poderoso legado de coragem, determinação e compaixão. Ele mostrou que, mesmo nas circunstâncias mais adversas, é possível manter a esperança e trabalhar para um mundo onde todas as pessoas sejam tratadas com igualdade e respeito. Ele nunca desistiu da esperança, mesmo nos momentos mais sombrios, e sempre manteve sua determinação de lutar pela liberdade até o fim.

Acreditava que a violência não era a resposta, pois mudanças duradouras vêm através de meios pacíficos e democráticos. Mandela inspirou as pessoas a sonharem com uma África do Sul e um mundo mais justo, iguais e pacíficos.

O legado de Nelson Mandela continua a inspirar pessoas em todo o mundo a lutar pela justiça, promover a reconciliação e trabalhar pela construção de uma sociedade mais igualitária e compassiva. Seus ensinamentos sobre liderança, dignidade humana e transformação pacífica permanecem relevantes e impactantes até hoje.

Escrito por Daniel Silva, Bacharel em Comunicação Social — Jornalismo pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), e mestre em Comunicação e Sociedade pelo programa de pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora.

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Daniel Lucas

Comunicólogo formado pela UFV e mestre em Comunicação na UFJF.