Daniellebarros
6 min readFeb 23, 2024

Qual o Caminho Para Ser Treinadora?

Desde que conheci Possibility Management e.u tive uma certeza dentro de mim, eu vou ser treinadora um dia. O impulso vinha de experenciar um contexto com tanta clareza, transformação, empoderamento e amor que eu queria que aquela fosse a minha vida.

Eu já tive impulsos anteriores como esse, carrego dentro de mim uma vontade de me entregar naquilo que se apresenta como extraordinário, quando estava apaixonada por corrida virei maratonista, quando decidi contar histórias fui para África para ficar imersa na tradição oral. Já viajei o mundo fazendo teatro. Olhando para trás eu vejo um padrão que eu tenho, quando descubro alguma coisa que me enche de vida eu digo sim de todo meu coração, e vou afundo nisso até me tornar muito boa, então é hora de recalcular a rota.

Nos meus primeiros pequenos passos em querer ser treinadora, o caminho se mostrou distante dos meus impulsos anteriores. Diferente de tudo que me aconteceu anteriormente, com Possibility Management me deparei com a pergunta: Do que estou querendo me salvar? De onde vem mesmo esse impulso de querer ser treinadora? Para quem estou tentando provar que eu consigo? A clareza do contexto, as perguntas perigosas, os feedbacks da minha equipe, as práticas com sentimentos me fizeram tocar na realidade. Não tinha como continuar querendo ser treinadora sem renunciar à minha fantasia.

O que tenho aprendido é que o impulso que eu tenho de querer me entregar as coisas que amo vem do meu Ser. Meu Ser anseia por se esbaldar de vida e radiância, e o que acontece em seguida é que meu impulso se mistura com minhas estratégias de sobrevivência, e o prazer vira pressão.

Descobri recentemente uma crença que eu tenho: a vida é para aquelas pessoas que estão evoluindo, quando a evolução acaba a morte chega. E evoluir para mim significa aprender ao máximo, me reinventar, ir para meu precipício e dar um passo no desconhecido. E eu tenho feito isso na minha vida, muitas vezes para me salvar da morte, para me salvar da falta de sentindo, me pressionando, me culpando e exigindo o máximo de mim.

Cresci numa família com muitas crianças e muitos problemas, eu não aprendi o que era ser vista, cresci sem saber qual era o meu valor, e decidi que ia provar aos meus pais que eu tinha valor. E é muitas vezes nesse ponto que meu prazer vira dever, e toda a radiância vai embora.

Nos últimos tempos, desde que falei que queria ser treinadora, foi inevitável mudar muitas coisas na minha vida, terminei meu casamento, deixei todos os meus outros trabalhos com terapeuta e atriz em segundo plano. Virei spaceholder do Pm Brasil, sem saber o que isso significava, organizei treinamentos, fui para treinamentos no outro lado do mundo, estou aprendendo falar inglês e vim morar na Bridge-House Mulheres da Terra. Isso não é uma coisa que aconteceu apenas comigo. Eu moro com mulheres que também mudaram suas vidas, a cada encontro na cozinha, na mesa de trabalho ou numa caminhada até a praia, admiro a coragem e entrega delas, e isso é muito inspirador para mim.

Mas eu sinto muito medo do porquê estou fazendo isso. Sinto medo de que o que me move é a parte de querer ser boa possibilitadora, a parte que ainda quer provar para meus pais que eu consigo, eu olho atenta a isso. Certa vez uma diretora de teatro me dirigindo me deu a seguinte instrução: “quando você estiver no palco, esteja interessada, não queira ser interessante, isso vai ser muito mais divertido para você.” Essa distinção me abriu muitas possibilidades naquela altura e ainda hoje. Agora me pergunto quando quero ser treinadora, qual parte minha eu vou deixar estar no comando? Meu ser interessado ou minha caixa querendo ser interessante?

Essa última semana na Bridge-House foi de longe a mais desafiadora e com mais aprendizado para mim. Com a chegada de mais mulheres à casa, e com a volta da Vera do Quênia, experimentei as mais diversas emoções sobre não ter valor. Como disse acima eu cresci sem saber qual era o meu valor, e gastei e ainda gasto muita da minha energia querendo provar isso.

Recebi um feedback que partiu meu coração, o feedback foi sobre como eu estava me relacionando com as pessoas, descobri que estou mais sintonizada com minha caixa do que com o meu ser, que dou muito valor para a minha caixa e que isso me fazia caminhar na direção contrária de ser treinadora. O feedback foi muito mais elaborado, preciso e precioso do que isso que escrevo, tenho a sensação no meu corpo energético da conversa extraordinária e franca que tive, mas não consigo me lembrar muito mais do que essas palavras. Isso aconteceu porque depois de ouvir aquelas palavras fui para o quarto escuro que tenho dentro de mim, no Possibility Management chamamos de pântano. Nesse lugar eu senti culpa, vergonha, injustiçada. Ao mesmo tempo que sentia tudo isso lutava para não sentir, meu ego infantil lutava para parecer adulto e o resultado foi me fechar, me defender, me isolar.

No mesmo dia que tive essa conversa eu viajei para São Paulo, tinha um ensaio marcado, fiz uma viagem de 12 horas, e me lembro de chorar quase que a viagem inteira. Também me sentia aliviada porque ia direto para o teatro, eu faço parte dessa companhia de teatro há mais de vinte anos, e meu alívio era sobre ir para um lugar onde as pessoas me conheciam. Mas quando cheguei lá eu me senti estranha, olhava as pessoas se relacionando, o espaço, era como se minha vida passasse na minha frente e eu já não me reconhecia nela. Definitivamente eu não era mais a mesma pessoa, e aquelas pessoas já não me conheciam mais.

Voltei no dia seguinte para a Bidge-House em estado líquido e ainda com meu ego de criança lutando para estar bem e parecer adulta. Havia uma proposta de nos reunirmos para escrevermos sobre como foi essa semana, eu pensava não vou escrever nada, estou na merda e não há nada para compartilhar daqui. Foi quando resolvi fazer alguma coisa para mudar e pedi que Jaqueline me desse um espaço de escuta, chorei por quase uma hora deitada no colo dela. E finalmente comecei aceitar onde eu estava. Depois telefonei a Isabel que também me ouviu, e noites atrás tive uma conversa com a Vera que me trouxe distinções sobre sentir tristeza como adulta e em conexão. E aceitar onde estou me permitiu sair do pântano e sentir amor por mim.

Estou novamente viajando dentro de um ônibus enquanto escrevo esse texto, mais uma vez indo ao teatro, recebi uma ligação da Sónia me fazendo perguntas perigosas sobre a nossa relação, eu senti medo e raiva na chamada, e muita alegria por me relacionar radicalmente com mulheres como a Sónia. Estou sentada ao lado de uma outra mulher no ônibus, que às vezes espia meu computador para ler o que estou escrevendo e que ouviu minha conversa com a Sónia. Ela está curiosa e cresce dentro de mim a vontade de falar com ela sobre o que estamos fazendo na Bridge-House. E por isso vou parar aqui esse texto, antes que a viagem termine.

Ah, antes que eu acabe me lembrei, comecei esse texto perguntando qual é o caminho para ser treinadora. Eu não sei, e a pergunta que fica comigo agora é: Qual o caminho para eu me amar com dignidade? Se vou ou não ser treinadora um dia eu não sei, enquanto eu tenho perguntas eu caminho, e enquanto eu caminho eu descubro o que eu sou.

Com amor,

Danielle