Educação com mãos, coração e cabeça: Satish Kumar no TEDxWhitechapel [transcrição]

Denize Guedes
6 min readMay 30, 2016

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Comecei a Schumacher College por uma nova forma de educação.

Não faz muito tempo, fui convidado para falar na London School of Economics (LSE).

E fiquei honrado.

Essa prestigiosa universidade de Londres me convidando.

E, aí, quando cheguei, perguntei a professora de Londres que iria mediar meu encontro: “Onde fica o seu departamento para ecologia?”

Sabe qual foi a resposta?

“Nós não temos um.”

Eu disse: “Você quer dizer que estão ensinando economia sem ensinar ecologia? Você entende o significado das palavras economia e ecologia?”

Eu estava falando com uma professora altamente qualificada de LSE. E, para minha surpresa, ela ficou um pouco atordoada.

Eu disse: “As duas palavras, economia e ecologia, vêm da mesma raiz. ‘Oikos’, ‘logos’, ‘nomos’, três palavras. Três palavras gregas”.

Oikos significa casa, lar.

E, na sabedoria dos filósofos gregos, não apenas ‘casa’ é onde você está vivendo — seu banheiro, quarto, sala, cozinha, jardim — , mas o planeta inteiro é a sua casa.

Que visão mais bonita.

O planeta inteiro é a nossa casa.

Todas as espécies neste planeta são nossos parentes, nossas relações.

E o conhecimento deste planeta-casa é a ecologia.

‘Logos’. Significa conhecimento.

Então, precisamos saber como todas as espécies neste planeta-casa se relacionam uma com as outras.

Estamos todos relacionados

Estamos todos conectados.

Isso é ecologia.

E, aí, economia é ‘nomos’.

Significa administração.

Então, como administramos todas essas lindas relações entre todas as espécies neste planeta-casa.

Então, diga-me, professora: “Você está ensinando seus alunos a administrar algo que eles não conhecem? Como você vai administrar algo que você não conhece?”

“Você está mandando milhares e milhares de formados ao mundo, África, Índia, América, Europa, América do Sul, para todo o mundo.”

Porque LSE é uma grande universidade internacional.

Nenhum espanto que a economia mundial esteja uma bagunça!

Eles não sabem o que estão administrando.

Eles estão lá para administrar, mas não sabem como administrar.

Então, essa história que lhes conto é a história de todo o nosso sistema educacional.

De escolas e universidades em todo o país e, mais além, ao redor de todo o mundo.

Fui convidado, em uma outra ocasião, ao Butão.

É um país pequeno, onde um novo tipo de educação está tomando lugar.

E o mote deles não é o PIB ou o produto nacional bruto, PNB. Mas a FIB, felicidade interna bruta.

Aí está, um pequeno país nos Himalaias, Butão.

Nas franjas do mundo, por assim dizer.

Mas, na verdade, lá para mim é o centro do mundo.

Onde estão dizendo: “Não vamos ensinar aos nossos estudantes apenas sobre produtos e economia. Vamos ensinar a eles como viver. A como se saírem bem na face desta Terra. Deste planeta-casa. Como ser feliz”.

Poxa, esse é um tipo de educação que acho que LSE, Oxford, Cambridge, Edimburg, Bristol e todas as outras universidades do mundo precisam aprender.

Aí, conversei com os alunos.

E os alunos me perguntavam: “O que acha que deveríamos fazer depois de terminar nossas universidades?”

E eu disse a eles uma coisa, uma resposta muito simples: “Quando deixarem a universidade não procurem um emprego. Vão e criem um emprego”.

“Um trabalho, um emprego, é emprego. Quando você se torna um empregado, você suspende a sua criatividade, você suspende a sua imaginação, você suspende a sua ingenuidade. E você fica apenas cumprindo as ordens do seu chefe, da sua companhia, as regras, os regulamentos, e tem muito pouca chance de ser você, de ser seu ser criativo”.

“Mas quando você tem seu modo de vida, no sentido budista de modo de vida certo, o modo de vida vem do seu coração. Você é o criador, você é o mestre do seu destino. Você está encontrando um novo caminho. Criando, fazendo algo.”

Nas nossas universidades modernas, nos últimos 200 anos, se tem uma coisa que ensinam é que fazer qualquer coisa com as mãos, trabalho manual, é indigno.

Se você está trabalhando na terra, trabalhando na fazenda, se você é um trabalhador da fazenda, um colhedor de vegetais, um colhedor de morangos, algo assim, você é pago, se tiver sorte, 10 libras a hora.

Mas se você fica sentado na frente de um computador, lidando com números num banco, você é pago talvez 10.000 libras.

Por quê?

Prodizir comida é menos importante do que lidar com os números?

Eu gostaria de ver o trabalhador da fazenda ser pago 10.000 libras e o banqueiro ser pago 10 libras.

Então, dignidade do trabalho manual, de fazer coisas manualmente, não somos consumidores, somos fazedores, e a nossa educação, nossas universidades, nossas escolas têm de ensinar os jovens a fazer coisas. Com suas mãos.

Com estas duas mãos que nos foram dadas pela maravilhosa mãe Terra, Gaia, e o universo.

Elas são o instrumento de alquimia, podem transformar materiais de base em algo extraordinário.

Você pega um pedaço de argila, uma cerâmica, e transforma aquele pedaço de argila em um belo pote, desenhado, pintado., um belo pote.

Que alquimia maravilhosa.

Um trabalhador, um jardineiro, um fazendeiro… está colocando uma semente na terra.

Aquela pequena semente de maçã na terra.

E com cultivo aquela semente se transforma em uma linda árvore.

E aqueles galhos, as folhas, as flores e a fruta, doce, aromática, fragrante, deliciosa, nutritiva, que transformação.

Qual é a alquimia aí nessas duas mãos.

E o que estamos ensinando nossos jovens no nosso sistema educacional, nas nossas escolas e universidades, começando pela escola primária, com cada criança com celular e computador, até mesmo nas escolas?

Precisamos ensinar nossas crianças a usar suas mãos.

E, aí, precisamos ensinar nossas crianças a sentir, coração.

Sentir como nos relacionamos uns com os outros, como nos relacionamos com a árvore, olhar para a árvore com assombro, com deslumbramento, todos em deslumbramento, que milagre uma árvore é.

Saindo daquela semente em uma bela árvore, macieira, em que as maçãs estão amadurecendo, o sol está amadurecendo.

A observação da natureza quase saiu das nossas universidades, faculdades e escolas.

Eu gostaria de ver cada escola no Reino Unido com um jardim, cada escola e universidade no Reino Unido deveria ter uma cozinha. Não aquela comida que é servida nas cantinas das escolas e das universidades. Comida produzida em massa em algum lugar, empacotada, transportada, preparada e esquentada em micro-ondas e servida a crianças, tão sem gosto.

Por que as crianças não participam do cozinhas e da jardinagem?

Esse seria o meu ideal.

Então, comecei uma escola pequena, em Heartland.

O que disse às crianças: “Sua sala de aula é a sua cozinha”.

E antes de ensinar a vocês Darwin, Shakespeare, Newton, Galileu e qualquer outra coisa, aprenda como fazer pão.

Você não vai ser alimentado por Newton, Galileu, Darwin e Shakespeare.

Aprenda a fazer pão, aprenda como a semente de tomate, pequena na terra, atravessa o solo e, da noite para o dia, se torna verde, depois amarela e depois vermelha, doce e delicioso. O que é esse milagre da vida acontecendo?

Aprendam nas suas escolas, sistemas educacionais, o primeiro e mais importante princípio necessário a aprender, o milagre da vida. E, então, todos outros assuntos são introduzidos. Aí, vamos ensinar Darwin, Galileu, Newton, James Lovelook, Margolis, … Sheldrake, Vandana Shiva e todos os grandes mestres que temos.

A natureza é a maior professora.

Minha mãe costumava dizer que a natureza é uma professora ainda maior que Buda.

Vocês acreditam?

Eu disse a ela: “Mãe, isso não pode ser verdade, porque Buda foi o maior professor da Índia”.

Mas minha mãe disse: “Meu garoto, e onde Buda aprendeu e obteve sua iluminação? Sentado debaixo de uma árvore.”

Hoje em dia as pessoas não obtêm iluminação porque não sentamos debaixo de árvores, sentamos debaixo dessas luzes artificiais.

Então, quando Buda estava sentado debaixo da árvore, olhando, observando a natureza e as interconexões, como a chuva, o sol, o solo, a árvore estão todos em harmonia. Que linda harmonia desse universo é. E Buda experienciou o que é chamado de surgimento dependente, na linguagem técnica.

Aprender a usar suas mãos, aprender a desenvolver seu coração e sentir e relacionamentos, e aí aprender com o seu intelecto e cabeça.

Então, mãos, coração e cabeça.

Esses são os 3 Hs (hands, heart, head, em inglês) que gostaria de trazer para o sistema educacional.

Não o seu velho e cansado 3 Rs — reading, writing (mesmo que não saibam soletrar), aritmática.

Então, vamos dar espaço no nosso sistema educacional para esse novo e belo mundo que nossos jovens querem criar nesta sala. E a partir de hoje e amanhã, um novo mundo de educação, onde cabeça, coração e mãos são colocados no centro das nossas escolas e universidades.

MUITO OBRIGADO!

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Denize Guedes

Em crise existencial no capitalismo, escrevo “A melhor próxima coisa agora” como estratégia para atravessá-la. ❤ denizeguedes.com