Viés econômico é vital para cinema se consolidar como indústria sustentável

A reportagem ouviu Marcelo Antunez, diretor nota 10 em Desempenho Econômico no ranqueamento da Ancine

afm
4 min readOct 7, 2018

A recente publicação do Ranking da Ancine— Agência Nacional do Cinema, lançado em 16 de julho, gerou críticas de parte da classe por rotular o desempenho econômico de diretores, produtoras e distribuidoras. A atitude faz parte dos planos de Christian de Castro como diretor-presidente da agência desde janeiro deste ano.

A pontuação, calculada de forma automática, é base para o processo seletivo do FSA — Fundo Setorial do Audiovisual, partição que viabiliza o desenvolvimento de toda atividade audiovisual brasileira e tem por finalidade-destaque “atuar nos gargalos existentes no setor”. Alguns profissionais da área criticam o modelo por uma suposta hipervalorização dos dados objetivos, como o lucro, para ter acesso ao fundo. O sistema poderia ainda favorecer a padronização daqueles que mais produzem, mantendo os mesmo nomes e estilos — leia-se comédia popular, dificultando quem se insere com propostas diferentes.

O diretor multifacetado Marcelo Antunez

O estágio atual do cinema brasileiro é resultado de diversas fases desde Ganga Bruta, de Humberto Mauro, em 1933, no Rio de Janeiro. O diretor Marcelo Antunez, de Polícia Federal: A Lei É para Todos (2017)e Até que a Sorte nos Separe 3 (2015) e nota 10 no Desempenho Comercial, nos dá um panorama:

“Não considero que temos atualmente uma ‘indústria’ de cinema no Brasil. Temos um mercado nos estágios iniciais de desenvolvimento.”

O ESTADO E O MERCADO DO CINEMA

Depois do cinema clássico nos anos 50, cineastas brasileiros começaram a construir uma identidade para a sétima arte nacional, o chamado Cinema Novo. Para Marcelo, era o momento de soltar as amarras do classicismo, mas “Infelizmente esse movimento foi tragicamente interrompido pela ditadura, que cerceou […] as artes”.

No período, o cinema brasileiro encontrou sobrevida em vertentes populares, como a comédia jeca de Mazzaropi e principalmente a pornochanchada, junto à Embrafilme, órgão que estimulou o produção de 1969 até 1990 — ano que teve fim nas mãos do presidente Fernando Collor, o primeiro eleito democraticamente no pós ditadura. Veio, então, o Cinema de Retomada, nos anos 90, com qualidade tecnológica como forte característica.

CINEMATOGRAFIA HOJE

Marcelo Antunez contrapõe que, apesar do poder do cinema nacional nesta época, a invasão das super-produções hollywoodianas abocanhou o público. Para ele, observar esse retrospecto é necessário para entender que o cinema brasileiro se desenvolveu aos trancos e barrancos.

Neste ponto Marcelo nos encaminha para o problema orçamentário que é investir em gêneros de alto valor de produção para competir com os filmes estrangeiros. Ele completa, dada a condição econômica do Brasil, apertada ainda que com arrecadação de imposto altíssima, que a renúncia fiscal das empresas para direcionar para o audiovisual, como faz Lei Rouanet, é alternativa questionada:

“E espera-se retorno financeiro, até porque se não houver retorno, sempre dependeremos das leis de incentivo para que haja indústria.”

Segundo o diretor, para consolidar uma indústria o cinema precisa se “desprender das amarras das leis”. Ele determina o posicionamento voltado para o lucro como objetivo de uma indústria estabelecida que, deste modo, deve atrair investidores organicamente e não por mecanismos. Ele conclui:

“Desta maneira poderíamos deixar o fomento do governo para produções que não visam exclusivamente grandes públicos.”

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Sobre as críticas a uma possível oligarquia dos filmes populares, ele tem uma resposta estratégica com base em sua própria trajetória: “Fiz e faço comédias de grande público que geram grandes lucros para as distribuidoras e produtoras, ao mesmo tempo em que tento abrir novos gêneros, como o thriller (suspense). Aproveitei-me do tema de grande apelo popular (o caso Lava Jato) para levar as pessoas ao cinema para ver outro gênero que não a comédia.”

PRODUTORAS E DISTRIBUIDORAS

Nesta lógica, as distribuidoras conseguem recursos para lançar as pequenas produções, até mesmo de nicho, partindo do excedente dos sucessos comerciais. Marcelo sublinha que, contudo, é natural de se esperar que esses filmes menores tenham investimento compatível. “É assim no mundo inteiro”, ele afirma, para inteirar:

“Os critérios de pontuação na Ancine servem para fazer uma análise quantitativa dos projetos e assim definir o nível de investimento compatível.”

Marcelo conclui seu pensamento sobre a situação pré-industrial do cinema nacional lançando uma missão àqueles que fazem a sétima arte existir: “Cabe a nós, produtores e cineastas, nos alternarmos entre gêneros para fazer a indústria girar, mas ao mesmo tempo abrir novas possibilidades para nosso cinema. Se olharmos sob essa ótica, entendemos o critério da ANCINE nesse momento. É claro que, do lado artístico, temos que brigar por um outro cenário, mas se pensarmos friamente, é compreensível.”

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afm

Em Jornalismo por fluência e Cinema por paixão. No café pelas xícaras e em RJ por SP. Vinte e 3.