Por que iniciei um tratamento contra compulsão alimentar (e como isso tem transformado minha vida)
Assumir o processo é doloroso. Executá-lo é difícil. Mas colher os resultados é indescritível.
Como muitos de vocês sabem, nas últimas 26 semanas tenho enfrentado um processo que vem transformando diariamente minha vida. É um tratamento para combater uma patologia que a maioria das pessoas têm imensa dificuldade em diagnosticar e, aqueles que a possuem, gigantesca resistência em assumir: a compulsão alimentar.
É exatamente o que você leu: 6 meses e meio atrás (ou exatamente 182 dias) assumi para mim mesmo que sou viciado em comer. Essa aceitação é bastante difícil e dolorosa, porém obrigatória para a mudança.
Como todo o adicto, você sempre encontra justificativas para a sua doença. No meu caso é um pouco pior, já que a compulsão alimentar é uma questão socialmente aceita. Diferente de outros vícios, eu consumo desenfreadamente algo que é indispensável para viver: a comida. Mesmo que a maioria das pessoas saibam que isso me faz mal, muitas vezes somos estimulados a comer mais. Quem nunca ouviu a frase: "só mais um pouquinho, eu sei que você gosta de comer."
Lembre que quando você estiver falando isso para alguém com compulsão alimentar, você não está sendo educado: você está contribuindo para o agravamento da doença.
Em um estudo recente publicado pela revista Preventing Chronic Disease, do renomado Centro de Controle e Prevenção de Doenças de Atlanta, nos Estados Unidos, aproximadamente 168 mil pessoas morrem no Brasil devido à doenças relacionadas ao excesso de peso e/ou obesidade.
Definitivamente, não quero entrar para essa estatística.
Foram vários os gatilhos que me motivaram a iniciar o tratamento. Talvez o principal deles tenha sido uma visita da minha família, que é de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Eles vieram aqui em São Paulo (onde vivo há 5 anos) em setembro de 2019. Ninguém mencionou nada diretamente, mas era latente a preocupação deles com a minha saúde e com meus hábitos alimentares.
Depois disso, comecei a reconhecer e identificar o quanto os comportamentos compulsivos impactavam na minha vida, seja em termos de saúde, na minha vida profissional e nas relações interpessoais que estabeleço. Percebi que não tinha o menor controle sobre o que comia e que era totalmente impotente para enfrentar essa condição sozinho.
Busquei ajuda. Indicado por colegas de trabalho, procurei o Espaço Terapêutico Paulo Buosi. O conceito primordial da instituição é realizar um tratamento contra a compulsão, e não uma dieta. Para perder peso, preciso entender e tratar o meu vício. É o princípio usado para qualquer outro tratamento em adictos, como alcoólatras ou dependentes químicos.
Em 4 de outubro de 2019 tive a minha primeira (e difícil) consulta. Naquela dia, subi na balança e ela apontou 136,9 quilos. Saí do consultório arrasado. Na eterna briga contra o peso, eu havia perdido. Tudo aquilo que já sofri por ser obeso voltou à tona com força e de uma vez só. Um dos episódios mais marcantes que lembrei naquele dia aconteceu em um evento que atendi junto com dois ex-colegas de trabalho, quando ainda morava em Porto Alegre.
Eu e um desses colegas éramos, à época, imensamente obesos. O outro, não. E este foi ao evento com sua então namorada. Em um dado momento, ele a apresenta para a gente. Sem o menor constrangimento, após um cumprimento tímido, ela vira para o lado e fala: "você não vai ficar desse jeito, né?".
Por mais que eu não tivesse muita intimidade com esse colega (e muito menos com sua namorada), aquele comentário bateu em cheio na minha auto-estima. Eu simplesmente murchei. Senti como se fosse um NADA. E desde que iniciei o tratamento, 182 dias atrás, essa frase ecoa na minha cabeça todos os dias. Ela me lembra diariamente o que é ser gordo e como boa parte das pessoas nos enxerga.
Hoje, 26 de abril de 2020, subi na balança e o resultado foi 93,7 quilos. São 43,3 kg a menos. São 43,3 passos em direção a uma vida mais saudável e com menos preconceito.
Ainda faltam 13 quilos até o objetivo. Tenho em mente que essa caminhada me acompanhará pelo resto da minha vida. Nunca terá um final. Ter passado por tantos momentos ruins em função da obesidade só me dá força para cada passo que preciso dar.
Foi triste ter ouvido aquela frase. Mas, no fundo, agradeço por ter me levado até aqui.
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