Lições de uma mudança de carreira

EDERSON ANDRE DE SOUZA
8 min readMay 30, 2021

Gostaria de compartilhar um pouco da minha jornada desde a saída do Banco do Brasil até meu reestabelecimento no mercado e as lições que aprendi nesse meio de tempo.

Peço que compartilhem esse texto para que sirva de auxílio para mais pessoas.

No início de 2019, com 35 para 36 anos de idade, após 11 anos de trabalho de Banco do Brasil e alguns anos na atividade de caixa, eu estava sentindo que lá não era mais o meu lugar.

Percebi que a vinda da modernização do sistema e a grande diminuição de clientes presenciais logo levaria ao corte de postos de trabalho. Além disso, outra coisa que me incomodava muito era a atividade extremamente repetitiva que não me preenchia.

Precisava mudar.

Minha esposa estava grávida nessa época. Seríamos pais de primeira viagem. Então, eu não podia ser nada precipitado, apesar de eu ter uma segunda renda.

Na época li alguma matéria ou vídeo sobre Data Science e Machine Learning e comecei a estudar na Udacity o Nanodegree de Machine Learning Engineer.

Foi paixão à primeira vista. Ter o poder de realizar previsões, classificações e ensinar o computador a diferenciar gatos de cachorros (clássico exercício hahaha) era algo muito legal.

Na época já havia um hype muito grande do cargo de Cientista de Dados e seus altos salários (que posteriormente o Data Hackers acabou desmistificando com uma pesquisa salarial), então resolvi perseguir esse lugar através de estudos para, em uma oportunidade, sair do banco.

Eis que em meados de julho do mesmo ano, o banco anunciou um plano de demissão voluntária que resultaria no equivalente a 2 anos de renda mensal.

Comecei a planejar. Fazia cálculos e mais cálculos, conversava com amigos e familiares sobre a possibilidade da saída e perda de uma pseudo estabilidade dada pelo concurso.

Para minha surpresa, a maioria das pessoas me encorajou, com ressalvas é claro.

Estava decidido. Era hora de sair.

Os desafios que eu sabia que iria enfrentar eram esses:

  • Nenhuma experiência na área.
  • Vagas concentradas em grandes centros e eu residindo no interior do Paraná. (Meu maior receio na época)
  • Paternidade chegando.

Assim, com uma renda que, teoricamente, poderia durar por 2 anos, eu conseguiria estudar no horário em que eu trabalhava no banco e me preparar para uma vaga com extrema demanda no mercado e alta remuneração inicial.

Seria uma transição fácil e pouca coisa poderia dar errado, não é?

Errado, muito errado!

Minha saída do banco ficou programada para início de setembro e o nascimento da minha filha para o início de agosto.

Uma das primeiras coisas que subestimei foi a reviravolta que um filho traz na vida do casal.

Noites em claro, cansaço físico e mental. Tudo isso drenava as forças e as energias necessárias para o estudo.

Minha filha sofreu muito com refluxo em seus primeiros meses. Chorava o dia todo, dormia pouco e não ia com mais ninguém a não ser eu e minha esposa. Esta última, muitas vezes levada à exaustão, solicitava minha ajuda constantemente.

Eu estudava nos poucos momentos que me restavam, pois precisava conciliar a atividade de perito para não zerar a entrada de renda.

Logo percebi que meu caminho não seria tão fácil assim, e por algumas vezes me sentia frustrado e nervoso por precisar me capacitar para ter alguma chance de sucesso nessa mudança e não conseguia ter o tempo e foco necessário.

No primeiro mês após minha saída, houve um evento de tecnologia e inovação em Toledo, chamado PigData. (Pig em referência ao fato de que Toledo é a capital nacional do Porco no Rolete)

Adicionei um rapaz chamado Juan Marinho no meu LinkedIn e acabamos montando uma equipe e ganhamos o Hackathon do evento (minha primeira vitória nessa jornada).

Finalizei meu curso de 6 meses na Udacity e comecei a enviar candidaturas para vagas júnior. Nenhuma resposta.

Três meses se passaram desde a saída do banco e consegui entrar no site de freelancers Codementor.io, no qual eu ajudo pessoas de todo o mundo com necessidades em VBA Excel e Data Science.

2020 começa, esperança renovada, minha filha começaria na escola, o planejamento voltaria a ser seguido e daria tudo certo.

Errado de novo.

Funcionou por 2 meses, até março, e vocês sabem o porquê. Pandemia.

Escolas fechadas, esposa volta a trabalhar e eu tinha que cuidar da minha filha na parte da tarde.

Eu acordava às 5 da manhã, estudava e trabalhava.

Nessa época cheguei a pedir para que um amigo meu (a quem agradeço muito) que deixasse eu usar as instalações de sua empresa, a qual estava com poucos funcionários no local, para conseguir trabalhar com mais tranquilidade na parte da manhã. (Obrigado Gustavo)

Não podia contratar babá para cuidar da minha filha, pois todos achávamos que seria algo rápido e a escola voltaria, então continuamos a pagar a mensalidade por um período.

A pandemia se agrava e infelizmente minha irmã perde o seu emprego na escola onde trabalhava. Conversei com ela e a contratei para cuidar da minha filha no período da tarde, desta forma pude me dedicar mais aos estudos e a criação de meu portfólio.

Continuava mandando currículos e fazendo networking no LinkedIn e Instagram.

Seguia e conversava com grandes nomes de Data Science no Brasil, campeões de competições no Kaggle, a quem também agradeço muito. Mario Filho foi alguém que sempre deixou as portas abertas para minhas dúvidas e pedidos de ajuda. (Muito, mas muito obrigado)

Começaram a surgir oportunidades. Alguns recrutadores entraram em contato, marcavam entrevista e cancelavam as conversas horas antes de ocorrer. Isso aconteceu várias vezes e vindo de uma determinada empresa. Não desejo isso a ninguém.

Consegui outros testes, mas não passei.

A cada teste que eu fazia uma coisa ficava mais evidente: O grande distanciamento entre o que era ensinado nos cursos e o que era necessidade nas empresas.

A maioria dos cursos que fiz não abordava como colocar seu modelo em produção, torná-lo escalável e monitorá-lo.

Fiz entrevistas para vagas de Cientista de Dados Júnior, para a qual cobravam conhecimento de Engenheiro de Dados, DevOps e Machine Learning Engineer junto.

Enfim, me sentia cada vez mais inseguro e mais longe de trabalhar na área.

Perto do final de 2020, minha irmã volta a trabalhar e novamente tive que cuidar da minha filha do meio-dia até às 20h, quando minha esposa voltava do trabalho.

Foi um período bem conturbado e o final do ano de 2020 se resumiu em crise familiar, frustração e dúvidas.

Com as reservas monetárias baixando e a pressão familiar aumentado, eu precisava de outro plano caso tudo desse (mais) errado.

Comecei a pensar em outras alternativas de renda e, com isso, perdi um pouco do foco no que seria principal.

Inúmeras vezes me peguei pensando se realmente eu havia feito a coisa certa.

Nessas horas difíceis, algumas coisas me fizeram continuar agarrado ao plano inicial e confirmavam minha decisão:

  • Uma frase que escrevi no meu caderno de estudos logo que comecei a jornada, a qual diz o seguinte: “When You Feel like Quitting, Think About Why You Started!”

Pode parecer um pouco com coisa de livro de autoajuda, porém eu me dava conta das pessoas que não teria conhecido, do conhecimento fantástico que teria perdido e das mesmas atividades que estaria fazendo e isso me animava.

  • A Regra dos 3 anos, a qual conheci em um vídeo de Matt D’Avella. Como dizem por aí, coisas boas não acontecem do dia pra noite, se algo não der certo no próximo mês, lhe dê a oportunidade de fazer acontecer, lhe dê três anos. (Pra mim não levou 3 anos, mas foram quase 2).

Essa regra vale para qualquer coisa, até mesmo aprender a tocar um instrumento.

Então, eu continuei seguindo com minha preparação, candidaturas, trabalho extra, sendo o pai que acordava na madrugada e cuidava da filha à tarde.

2021 já estava em seu segundo mês, as aulas voltaram e, novamente, estava eu com esperanças. Caso não conseguisse algo fixo ao menos poderia fazer freelances durante o período da escola.

Foi então que o poder do networking entrou em ação e uma oportunidade surgiu.

Lembram do Juan que conheci logo que saí do banco? Pois é, vi que ele estava anunciando 2 vagas para Computer Vision na empresa em que ele trabalhava.

Eu conhecia as técnicas, havia estudado, e gostava muito dessa parte do machine learning, a de utilizar imagens e vídeos para extração de dados.

Conversei com ele e fui convidado para entrevista. Passei por todas as fases técnicas com elogios, o que me deixava cada vez mais esperançoso em conseguir minha colocação no mercado.

A última fase foi a conversa com o CEO da empresa.

Eu estava nervoso, mas ao mesmo tempo confiante. A conversa se desenrolou super bem, demonstrei que realmente estava disposto a agarrar essa oportunidade e assegurei que, apesar de não ter experiência, eu tinha conhecimento e vontade para os desafios.

O CEO então apresentou uma proposta, a qual era adequada ao porte da empresa, minha incógnita capacidade, mas bem abaixo da minha expectativa e necessidade. Aceitei na hora, sabia que entrar no mercado e mostrar meu potencial na prática era a chave para um passo maior.

E eu estava certo, finalmente!

A experiência foi sensacional! Em meio a inúmeros desafios, prazos apertados, requisitos novos e desafiantes, minha equipe e eu, como principal desenvolver de IA, validamos uma PoC com uma grande empresa de atuação mundial!

Nesse período que eu estava efetivado, diversas oportunidades surgiram. Recrutadores começaram a me procurar.

Entrevistas ocorreram e acabei recebendo uma oferta que se enquadrou nas minhas expectativas!

O que sinto neste momento, além do alívio e da sensação de ter feito a coisa certa, é a felicidade e o satisfação de conseguir criar ferramentas fantásticas e inovadoras e ver no rosto das pessoas que me incentivaram a expressão de: eu sabia que você era capaz, você merece! (A vocês eu sou muito grato!!)

A história finalmente chega ao seu final depois de centenas de linhas e alguns minutos do seu tempo, mas ela continua pra mim, pois há muita coisa por vir e meu caminho está só começando!

Então o que ficou de aprendizado de tudo isso?

  • Nunca ache que seu plano não tem como dar errado. No meu surgiu uma pandemia! Quem poderia sonhar com isso?
  • Não pense nem por um segundo que a paternidade é algo que não vai mudar sua vida. Ela muda muito, pra melhor, mas sossego e tempo para você, nunca mais! Hahahah
  • “Take the hits and keep moving forward” já dizia Rock Balboa para seu filho. Continue em frente, acredite em si e lhe dê ao menos três anos para chegar lá. Nada acontece do dia para noite!
  • Primeiro faça uma análise do que o mercado precisa e depois busque conhecimento. Assim evita-se o grande distanciamento entre o que se ensina nos cursos e o que é realmente importante no mercado.
  • Procure entrar no mercado, mesmo que a remuneração seja abaixo da ideal. As empresas dão poucas chances para quem não tem experiência.
  • Faça contatos. Com certeza alguém da sua rede irá te ajudar na jornada.

Espero que este relato ajude ao menos uma pessoa e torne o caminho dela mais fácil. E não duvide, a transição de carreira não é e não será nada fácil, mas acredite em si mesmo e continue em frente!

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