How I met your mother

Elvis Nogueira
8 min readNov 14, 2016

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Então, depois de trocar mais de 700 mensagens de texto com aquela ruiva original, modelo 1992, 4 portas, rodas originais, com um probleminha no eixo (nada grave) e motor vê-oito eu resolvi aparecer de surpresa na casa dela só para ouvir sua voz. Não porque era uma voz bonita (não era), mas porque ela estava com a garganta doente, com voz de traveco e eu achava isso engraçado.

Chegando no portão o pai da garota resolveu inovar na piadinha com meu nome, então gritou bem alto quando viu a ruiva sair pela porta:

“QUEM TÁ AÍ FORA?”
_O elvis, pai.
“ELE NÃO MORREU?”
_não pai, não morreu… -respondeu virando os olhos de vergonha.
“ENTÃO AVISA ELE QUE SE CHEGAR PERTO DA MINHA FILHA ELE VAI MORRER”

E foi nesse exato momento que eu decidi que de jeito nenhum iria nem sequer TENTAR BEIJAR essa menina de pai estranho.

Depois de 4 meses se beijando, estava eu a pensar qual era o melhor lugar pra pedir a ruiva em namoro. Já havia considerado vários lugares, mas como sou muito ruim em romance eles consistiam em:
- num jantar romântico;
- numa montanha romântica alta e linda;
- numa praça romântica e florida ao som de músicas românticas;
- num barzinho romântico tranquilo com música ao vivo.

Analisando minhas opções decidi ir em um bar barulhento onde clubes de motos se reuniam para ficar bêbados em meio a sujeiras e vômitos, porque era meu lugar preferido e também não era muito caro.

A coragem surgiu quando tocava uma música que eu não gostava porque era muito barulhenta e além disso a banda era ruim:
_Ow, oq vc acha da gente namorar?
“QUÊÊÊ?”
_ O-QUE-VOCÊ-ACHA-DE-A-GENTE-NA-MO-RAR?
“Ah… [balançou os ombros] tudo bem.”

Eu não percebi, mas nesse momento a ruiva decidiu que tinha acabado, esse era o fim da picada e não tinha mais como avançar nem mais 1 segundo nessa relação. Ela estava decidida a nunca mais me ver na vida.

Então estava tudo decidido: Iríamos viver juntos na república onde eu morava pra gente se ver todos os dias.

Mas só até terminar de bolar o plano hiper secreto entitulado: “Como contar pros pais que a ruiva tá grávida sem o Elvis ser assassinado”. Como eu não tinha experiência em não ser assassinado, resolvi fazer o que qualquer um em meu lugar faria: ir pra praia com ela escondido dos pais.

Viajamos pra Ubatuba passar um fim de semana e, depois de quase ser assassinado pelo pai dela, conseguimos chegar em segurança.

Com a experiência recém adquirida em não ser assassinado (e em montar barracas de praia), faltava ganhar a experiência de contar que a namorada está grávida. Treinei com o elton e a reação foi:

“_Pow cara que dahora” -e tomou outro gole de cerveja

Estava tudo sob controle. Eu estava treinado e confidente, não tinha como dar errado e eu voltei pra Sorocaba contar o segredo que ninguém sabia.

Quando cheguei em casa todos já sabiam do segredo, a ruiva tinha sido praticamente expulsa de casa, deserdada e já era odiada por quase todos. Minha família estava de boa e eu não fui assassinado.

Ou seja, meu plano ocorreu sem incidentes, mas a ruiva jurou que a mãe dela não iria saber o sexo do bebê até o momento do nascimento.

Dois meses depois, quando a médica estava ligando o ultrassom, eu não consegui ver direito o sexo do bebê. Primeiro porque eu não consegui nem identificar se ultrassom estava ligado. Segundo porque eu estava no celular tentando dizer pra mãe da ruiva que eu não sei ler “ultrassonês”, terceiro porque o ultrassom não estava ligado ainda, quarto porque eu sou idiota.

Olhando aquele monte de pontos cinzas e pretos eu só conseguia me imaginar em um futuro feliz com um moleque ruivo ou moreno brincando feliz comigo enquanto eu dava bronca nele, ou com uma menininha morena ou ruiva brincando feliz comigo enquanto eu dava bronca nela, tanto faz, o importante era que a parte da bronca já estava planejada.

Eu não sou muito familiar com os jargões médicos e nem especializado em anatomia de bebês, mas aprendi naquele dia que o termo técnico “olha aqui pai idiota, tá vendo o hamburguinho?”, significa: “Senhores pais, é uma menina.” — e então eu estava super feliz.

Então eu estava super triste em casa depois de sentir aquela teoria na prática. Já estávamos no quinto mês de gravidez e a ruiva já tinha brigado comigo bem mais do que o habitual. Ela tinha os desejos mais estranhos de grávidas, dentre eles: comer gelo, chupar sorvete de limão, votar na Dilma, beber refrigerante sabor tutti-frutti, dormir de janela aberta.

O que mais me pegou desprevenido foi o desejo de comprar panelas às sextas-feiras de madrugada, mas esse desejo eu fiquei muito bravo e me recusei realizar.

Cinco horas de compras de panelas e 900 reais depois eu senti a teoria da prática e fiquei triste: a gravidez de um curupira fêmea consiste em nove meses ininterruptos de TPM, desejos estranhos, brigas com o Elvis e dinheiros gastos aleatoriamente, não necessariamente nessa ordem. Mas a sorte estava do meu lado: só restavam mais 4 meses.

Quando o nono mês chegou eu seriamente duvidei do médico, de tudo o que eu acreditava e de todas as coisas que existiam. O nono mês era mágico, o mais esperado de todos, o mês da liberdade: o mês em que eu não precisaria mais aguentar uma ruiva em tpm constante!

Esqueça tudo o que você aprendeu na escola: a gestação do ser humano dura 10 meses.

A ruiva estava constantemente brava comigo, talvez fosse porque ela estava a 9 meses com uma pessoa dentro dela, ganhou mais de 15 quilos de peso extra, marcas pelo corpo, hormônios desregulados, enjôo constante, autoestima afetada, dores musculares, problemas para dormir e dificuldade de respirar, ou talvez fosse outra coisa.

Como o homem da casa e o patriarca desse núcleo da família Nogueira, eu não poderia deixar a situação nesse estado. Eu estava prestes a tomar uma atitude drástica.

Tínhamos alguns problemas em casa. A ruiva sentia muito calor, então nós precisávamos de um ar condicionado. A ruiva sentia dores nas costas, então nós precisávamos de uma cama nova. A ruiva precisava de uma casa limpa e apesar de tentar eu sempre falhava miseravelmente, então precisávamos de uma empregada. Então concluí que eu precisava descobrir como juntar dinheiro para suprir todas essas necessidades.

Eu tinha lido livros o suficiente para saber exatamente do que eu precisava para juntar mais dinheiro: força de vontade, disciplina, controle de gastos, um xbox, uma reavaliação do nosso estilo de vida, uma planilha gerenciadora de custos e uma pesquisa de mercado sobre os preços dos produtos que mais usávamos.

Descobri que é muito difícil seguir todas as regras que solitários cientistas econômicos ensinam, então decidi começar devagar e seguir um conselho por vez. Sorteei qual conselho seguir por primeiro e então descobri que é muito difícil comprar o Messi jogando a primeira temporada do FIFA 15 e que jogos de videogame te tomam tempo demais e nunca sobra tempo para seguir outro conselho de nenhum cientista solitário.

O grande dia chegou!

A ruiva estava deitada aconchegantemente no sofá, com seu corpo confortável em cima de 32 travesseiros, bebendo refrescantemente o último copo de coca-cola disponível, seus pés suavemente apoiados parcialmente nos meus ombros.

Eu estava no controle da situação, calmo, seguro de si, só de cueca, sentado no chão gelado da sala, com o pescoço torto pela falta de travesseiros e com dois pés muito pesados apoiados sobre a minha cabeça: mas eu estava 100% pronto e preparado para qualquer emergência.

Estávamos assistindo um filme de comédia romântica do Adam Sandler e, entre um choro da ruiva e um ronco meu, ouvi:

- amor, acho que isso foi uma contração.

O mundo parou de girar. Eu corria de cueca com as duas mãos para cima pelos cômodos da casa. Não conseguia encontrar a mala pronta, em partes porque não tínhamos uma mala pronta, em partes porque as lágrimas de pânico que insistiam em sair dos meus olhos não me deixavam ver nada. A caminho do hospital todos os outros carros buzinavam para mim, eu furei 4 sinais vermelhos, ultrapassei o limite de velocidade 6 vezes, quase atropelei três inocentes velhinhos e esqueci de fechar a porta traseira do carro durante todo o trajeto.

Foi então que a ruiva pediu para parar na padaria comprar um sorvete de limão e me avisou que as contrações tinham parado. “Acho que foi só um peidinho” — justificou.

Algumas semanas e muitos peidinhos depois, eu estava na sala de espera e ouvia gritos desesperados de dor e sofrimento. Olhei aflito por entre as janelas transparentes procurando a ruiva e a encontrei, ela estava deitada tranquilamente em uma maca aguardando seu momento. Respirei aliviado.

Eu estava muito mais nervoso do que ela, pois minutos antes me lembrei que esqueci de carimbar o papelzinho do estacionamento. Me acalmei pois faziam mais de 4 horas desde a nossa chegada e a esse ponto era mais econômico comprar um carro novo para ir embora. Os gritos desesperados continuavam.

Já era tarde da noite e eu tentava dormir na sala de espera, porém de repente vejo enfermeiras e médicos correndo desesperados para dentro do lugar onde não era permitido a entrada de curiosos. Eu não aguentava mais ouvir gritos desesperados então resolvi entrar. Depois de ser barrado por um outro curioso que já estava lá dentro voltei e sentei na sala de espera, triste e ansioso. Foi nesse momento que a minha sogra passou por mim e entrou na sala proibida, com um chocolate na mão.

Os gritos silenciaram. Aprendi que os desejos de gravidez se agravam a medida que a hora do parto se aproxima. Consegui entrar na sala para dar um beijo na ruiva antes do grande momento e isso sujou minha boca de chocolate. Eu estava muito nervoso então o médico me perguntou se eu queria estar presente na hora do nascimento. Perguntei se existia algum boteco com litrão a 4 reais por perto e ele me respondeu que, se existisse tal coisa nesse mundo, não haveriam médicos para fazer o parto.

De um lado estava eu e a cabeça da ruivinha, do outro lado vários médicos e especialistas tentando tirar um ser humano de dentro de outro. Alguns minutos depois a médica líder disse: “Ei papai, tire a primeira foto da sua filha”, então num ato de coragem extrema eu me levantei e olhei a cena. Fechei os olhos imediatamente. Um choro agudo ecoava da sala misturando com as gargalhadas dos médicos. A médica e a ruiva insistiam na primeira foto, mas eu estava ocupado demais tentando não desmaiar.

Depois do meu enorme sucesso em não desmaiar e do enorme fracasso em tirar a primeira foto, eu estava orgulhoso e dando o primeiro banho naquela pessoinha que mudaria a minha vida para toda a eternidade, afinal como diz o ditado, elvis não morre.

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Elvis Nogueira

Um pouco engenheiro, um pouco filósofo, mundrungo, pai da Manu, escritor e zé graça nas horas vagas.