Feminismo e estupro coletivo

Emilly Franco
3 min readMay 25, 2016

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“O mundo tá chato”, eles nos dizem. “Exageradas, escandalosas, problemáticas”, é como nos rotulam. “Isso é coisa da cabeça de vocês, eu não preciso do feminismo”, elas rebatem. Todavia, acontecimentos recentes provam justamente o contrário.

Nas últimas horas, um alarde ocorreu nas redes sociais: um vídeo circulando, no qual há uma mulher, desacordada e nua, sendo ridicularizada por alguns homens, que gargalham e zombam da moça, afirmando que ela foi estuprada por (pasmem) 30 homens. Como se não fosse o suficiente, os indivíduos filmam o estado físico da garota, que encontra-se muito ferida e sangrando. Ela que, segundo fontes, possui cerca de 17 anos de idade.

No meio de toda a confusão, existem muitas pessoas interessadas em denunciar, na esperança de que todos esses criminosos sejam punidos. Entretanto, uma grande quantidade de pessoas (senão a maioria) encontram-se mais preocupados com o link do vídeo do que com o estado físico e psicológico da vítima. É entristecedor.

Uma das pautas mais importantes do feminismo é justamente educar as futuras gerações e prevenir a vítima de sofrer com isso. Entretanto, há ainda uma grande discriminação da sociedade para com o movimento, assim como há um abismo de vícios culturais passados de pais para filhos, que tratam o assunto de forma internalizada.

Nosso país possui estatísticas exorbitantes de abuso sexual: há cada onze minutos, um novo estupro é registrado. Só na cidade de São Paulo, o número é de um em cada uma hora; isso sem contar aqueles que são omissos. A situação fica ainda pior quando percebemos que na nossa sociedade existe uma cultura do estupro, onde o assunto é tratado como piada ou com naturalidade.

Quando se espera apoio às vítimas, no lugar recebemos perguntas como “que roupa ela estava usando?”, “onde ela estava?” e até “será que em momento algum ela não consentiu?”. Isso sem considerar o grande número de mulheres estupradas por seus parceiros em relacionamentos conjugais, que são tratados com ainda mais indiferença; “é obrigação dela como mulher”, nos é dito.

Somos criadas com medo de um possível estupro em algum período de nossas vidas, alimentamos esse pavor e crescemos com ele. Por outro lado, vemos como o suporte das vítimas é falho e como a educação em relação ao assunto é deficiente. Ensinam as meninas como se portar, enquanto ensinam aos meninos como se provar. Dizem para nós que é nosso papel “dizer não”, enquanto alimentam a ideia de que os instintos dos homens são intensos e que por isso eles não são capazes de contê-los. Usam isso como justificativa, porque afinal, com aquele shortinho, só podia estar pedindo, não é mesmo?

As vítimas têm medo de denunciar, os monstros ganham ainda mais força para fazerem mais e mais mulheres de refém desse trauma. De crianças à mulheres idosas, ninguém está a salvo. Não devemos ensinar uma forma de fugir dos estupros, mas sim em como podemos evitar que eles aconteçam. Não devemos tratar com naturalidade estupros coletivos em festas, sexo não consentido em relacionamentos e não devemos ofender a vítima. De todos os envolvidos, eis a única isenta de culpa. Mas o principal é: em hipótese alguma faça piada.

Portanto, não compartilhem, não procurem pelo vídeo, não pesquisem a identidade da moça, não vamos expô-la ainda mais. Não vamos internalizar o pensamento de que em algum momento ela pode ter feito alguma coisa para merecer o que ocorreu. Precisamos falar sobre feminismo, precisamos falar sobre estupro. Precisamos lutar pelos nossos direitos. Ainda há uma chance de salvar nossas mulheres desse destino.

Empodere-se.

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Emilly Franco

22 anos, mestranda em Ciências Sociais (UEM). Apenas mais uma frustrada com a vida. Decidi refletir sobre algumas coisas e acabei me arruinando desde então.